Era Marina! A filha do melhor amigo que o meu pai já teve. A criancinha que Liv ficou louca achando que era uma boneca e que poderia brincar. A criança que eu prometi a Fernando que iria cuidar e proteger como faria com Liv.

Como se não bastasse, no mesmo dia ela quase caiu da escada na biblioteca (e eu juro por Deus, que foi um dos momentos mais desesperadores que já passei), eu me senti completamente vulnerável. Eu estava aproveitando o intervalo para conversar com a Eva sobre alguns livros novos que tinham acabado de ser catalogados. Dona Eva me pediu para colocá-los na seção correta. Fui em direção a ela e me surpreendi quando percebi que Marina estava lá montando uma escada para alcançar alguns livros. Coloquei os livros na seção que Eva pediu, sem que ela notasse. Quando acabo, estava prestes a oferecer ajuda, mas percebo que ela já está subindo os degraus. Percebo o exato momento em que a escada balança instável e me preocupo. Os próximos momentos parecem acontecer em câmera lenta.

Corro até ela e a seguro quando ela se desequilibra. Ela não atingiu o chão, mas percebo seu corpo ficar mole. Senti sua pulsação fraca e logo a movimentei nos meus braços para verificar seu rosto. Seus olhos se fecharam encarando os meus distorcidamente. Seguro ela nos meus braços e ando depressa até a saída da biblioteca, arrancando um suspiro assustado de dona Eva, passo por ela e peço para avisar à enfermaria que estava chegando com uma aluna. Eu estava realmente preocupado com essa menina e nem sabia o porquê, mas sentia como se precisasse protegê-la.

A enfermeira aferiu sua pressão, assim como verificou as taxas de glicose e frequência cardíaca. Quando ela me disse que Marina provavelmente não havia se alimentado nas últimas horas eu quase tive um surto. Ela estava mais magra, mas nunca imaginaria que seria por esse motivo. Será que ela tinha algum transtorno alimentar? Ouço a voz da enfermeira falando em desidratação, anemia e exames, mas como só foram possibilidades levantadas por ela que podem acontecer caso Marina não se alimente regularmente, deixo minha mente vagar.

Volto para a sala de aula, recuperando-me do choque, após confirmar que ela ficaria bem e de pedir que Eva ficasse de olho nela enquanto eu dava aula. Assim que o sinal tocou, fui novamente onde ela estava para vê-la, mas percebi que ainda dormia.

Esperei até que acordasse fora da enfermaria. Célia, a enfermeira responsável havia acabado de sair para o almoço quando vejo um movimento sutil onde Marina estava. Vou para perto dela e no exato momento que a vejo, parece que tudo ao meu redor some. Ela estava bem e era isso o que importava. Eu havia comprado uma sopa para que ela se alimentasse assim que acordasse. Eu sabia que não era necessário, mas queria ver com meus próprios olhos que ela comeria algo. Sua mãe estava no meio de uma reunião com o meu pai, ele havia me dito que teria muito a fazer hoje. Liguei algumas vezes para sua mãe, mas quando não consegui falar com ela, desisti.

Depois de me certificar que ela havia se alimentado, me diverti ao ver sua expressão quando soube que morávamos no mesmo prédio. Droga de destino! E não consegui tirar sua imagem da minha cabeça desde então. Ela havia chamado minha atenção no primeiro dia em que estive em sua escola no início do ano, mas tê-la nos meus braços tão frágil despertou uma estranha vontade de protegê-la, como se fosse um dever meu fazer isso. Saber quem ela realmente era só intensificava o sentimento, embora eu soubesse que esse não era o único motivo.

Pra piorar as coisas, na sexta-feira, após uma semana infernal, me preparei para o jantar que meu pai havia organizado.  Minha irmã havia chegado de viagem e iria vê-la naquela noite. Eu iria encontrar com Marina e sua mãe, provavelmente. Saber disso com antecedência me deixou mais preparado para lidar.

Cheguei antes do horário, por isso não havia muitas pessoas ainda por ali. Meus pais vieram falar comigo. Conversamos um pouco e logo depois fui falar com a minha irmã. Sempre nos demos bem, é claro que implicávamos um com o outro, mas nada sério.

Ensina-me, professorWhere stories live. Discover now