– Me acompanhe.

Tentei dizer alguma coisa, mas não consegui. Havia algo preso em minha garganta e essa mesma coisa, pelo visto, também prendia minhas pernas – já que demorei a me levantar do gramado e começar a seguir o treinador em direção ao "escritório".

Depois de caminharmos, passando pelos vestiários da quadra, chegamos à sala minúscula com uma mesa, duas cadeiras de madeira e um armário de vidro em que ficavam os troféus conquistados pelo treinador (já que os conquistados pelo nosso time do colégio ficavam no museu da universidade, ao lado da escola).

Ele se sentou em uma cadeira e me apontou a outra que estava a sua frente.

– Sente-se, Horstmann.

Obedeci, passando mentalmente meu discurso contra Matheus. Afinal, se ele fosse falar mal do meu desempenho naquele treino, eu estaria pronta para me defender já que eu não tinha culpa alguma. Foi Matheus quem não me passou a bola naquele dia e foi ele também quem não me passou a bola nos últimos jogos, fazendo com que perdêssemos várias chances de pontuar.

O treinador apoiou os braços na mesa quando eu finalmente me sentei, e me encarou com um daqueles seus olhares intimidadores. Parei na mesma hora de elaborar mentalmente o meu discurso. Fiquei tão nervosa que só consegui encarar o logotipo da sua camisa: o brasão da FHS (colégio Francisco Henrique Sampaio), onde eu estudava.

– Você está fora – proferiu de repente.

Passaram-se algumas semanas enquanto eu encarava com uma cara de paisagem aqueles olhos cor de mel.

Fora?

– Sim.

Ele continuou com aquele seu mesmo olhar. Em seus lábios havia um traço da sua diversão interna.

– Fora do quê? Do campeonato?

Ele revirou os olhos em estado de impaciência, abandonando sua postura formal.

– Fora do time – ele evidenciou a palavra "time" como se fosse lindos fogos de artifício de fim de ano em Copacabana.

O mundo inteiro ficou em silêncio ao nosso redor.

Como assim "fora do time"?

– Olha, professor Amargo, não que eu esteja me gabando nem nada, mas imagino que o senhor c-confundiu... Está confundindo as coisas... – gaguejei. – Eu sou a melhor atacante que este time já teve desde Teobalto Sanches em 1992 – pois é, eu andei pesquisando. – Você não pode me expulsar do time assim sem mais nem menos.

– Está enganada – sobre Teobalto? – Tanto posso como já expulsei – ele se recostou em sua cadeira e por um momento pensei que iria pôr os pés na mesa, tamanha tranquilidade. – Eu tenho esse poder. O que eu não posso é continuar com você na equipe. Os outros colégios não querem criar um time misto para jogar no campeonato, e é contra o regulamento só uma escola apresentar um time misto.

O quê?

– Isso não está no regulamento.

– Agora está – ele me lançou um sorriso debochado. – Eu abri o pedido e foi aprovado ontem.

– Por quê?! – perguntei confusa.

– É ridículo para nós sermos o único time misto do campeonato – ele disse. – Ainda por cima só com uma única garota.

– É só arranjar outras garotas!

– Eu não quero outras garotas no time. Eu não quero mais você no time... Está dando para entender? – falou tudo entredentes, se segurando para não começar a gritar, eu tenho certeza.

NOVEMBROWhere stories live. Discover now