11 - Admirando O Fracasso

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Queria dizer que arrumar alguém que me ensinasse a tocar violão foi tão fácil quanto o surgimento da ideia do memorial, mas não foi

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Queria dizer que arrumar alguém que me ensinasse a tocar violão foi tão fácil quanto o surgimento da ideia do memorial, mas não foi. Aquelas almas caridosas que eu acreditava existir, não existiam. Ninguém queria dar aulas de graça.

Os projetos de incentivo à cultura da prefeitura, que ofereciam aulas gratuitas de violão, já estavam com as turmas fechadas e não aceitariam novos participantes até o ano que vem. E eu não podia esperar até o próximo ano. Já havia marcado a data da "apresentação" para o dia 28 de novembro desse ano; o dia do meu aniversário e também o dia em que minha mãe morreu. Até essa data, segundo minhas contas, eu tinha exatamente 281 dias para recuperar o sorriso do meu pai e já tinha desperdiçado alguns com a busca (sem sucesso) de um professor de violão.

Perguntei a Gabriel sobre seus colegas do Grupo (aquele da escola em que ele tocava violino), mas nenhum deles queria dar aulas de graça.

– Muitos já dão aulas para ajudar a pagar o colégio. Nenhum deles vai querer dar aulas de graça. Eles realmente precisam do dinheiro.

– Gabriel, você deve saber tocar alguma coisa de violão...

– Violino não tem nada a ver com violão, Amanda – ele disse pela milésima vez.

Mas para mim todo instrumento de corda era a mesma coisa.

Pedro sabia tocar bateria e era de um dos grupos populares, então, por um momento eu joguei todas as minhas esperanças nos contatos dele.

– Eles estão na mesma situação dos colegas do Gabriel, Dinha – ele disse certo dia. – Ninguém quer fazer de graça. O máximo que eu consegui foi um desconto.

E o desconto não era lá grande coisa. As aulas continuavam caras e eu não tinha dinheiro nem para comprar uma palheta, quanto mais pagar, semanalmente, um professor de violão.

– Você vai ter de pagar – Pedro concluiu num suspiro lamentoso.

Meu pai poderia pagar as aulas, eu sabia, mas eu não queria. Primeiro, porque ele não ficaria surpreso em me ver com um violão na mão em novembro, no dia da apresentação; segundo, porque eu queria que o memorial nascesse totalmente do meu esforço e não do dele. Era um presente para meu pai e eu não queria que ele pagasse nem um centavo por isso.

Sem alternativa, comecei a procurar por trabalho.

Eu nunca trabalhei ou fiz algum curso extracurricular realmente proveitoso para alguma profissão, então o meu currículo ficou mais vazio do que o estômago do Gabriel antes da ceia de natal. Chegava a ser ridículo, mas era tudo o que eu tinha.

Todo dia eu pegava a página de empregos do jornal que meu pai comprava, e levava para o colégio para procurar com calma algum emprego, mas quase nunca eu encontrava algo que se enquadrasse com a minha idade ou conhecimentos.

NOVEMBROWhere stories live. Discover now