0.4 - Você quer flores?

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— O Joshua é um fofo.

   Enquanto eu me concentrava para pegar um chá no café Itália, duas meninas pararam ao meu lado. Joshua não estudava ali, na mesma faculdade que a minha, mas passava e ficava umas meia hora conversando com amigos que ele criou sozinho por ser "popular".

— Mariana! — uma delas diz sorrindo, um sorriso um tanto estranho. Tento lembrar-me do seu rosto ou a onde já tinha lhe visto, porém nada vem. Não sabia como elas me conheciam ou sabia o meu nome, mesmo eu sendo um pouco conhecida, não tinha conhecimento de todos daquela faculdade.

— Oi.

— Você é a namorada do Joshua né?

  Queria responder que não e talvez evitar algo ruim no futuro, mas eu não poderia deixar ela livre para se jogar em cima do Joshua ou achar-me idiota.

— Sou sim, algum problema?

— Nada, eu conheci ele esses dias. — diz e pausa para me observar por mais alguns segundos. — Ele disse pra mim ligar pra ele, e também que o relacionamento de vocês não é sério. Eu queria saber se é verdade.

— Não, não é verdade. — digo engolindo em seco logo em seguida. Joshua vive dizendo que o relacionamento era aberto para Deus e o mundo, por que eu tinha tanta vergonha de admitir? Me sentia tão humilhada quando isso era pronunciado por mim?

— Ah sim, estranho...

  Tamborilo os dedos no balcão já impaciente pela demora e finalmente o garçom chega com o meu chá.
 
  Viro meus calcanhares para a saída depois de dar um breve sorriso amigável.
    Ele estava em pé, a frente do seu carro do jeito que fazia para mostrar que era o cara. Controlei meus olhos para eles não se revirarem.

— Oi amor.

  Recebo um beijo de cumprimento de Joshua, um pouco demorado. Sorrio não muito animada quando separamos nossos lábios.

— Aconteceu alguma coisa? — pergunta colocando uma das minhas mexas de cabelo teimosa do rosto atrás da orelha.

— Não, por quê?

— Você parece não estar bem.

  Sorrio e balanço a cabeça negando seu ponto de vista. Assim que ele se vira para entrar no carro, eu encaro as duas meninas dentro da lanchonete nos olhando, observando e tentando ver se o que eu tinha dito era verdade.

— Você vem?

  Olho em volta. Meu carro estava do outro lado da rua, e ir com ele parecia desnecessário pra mim.

— Estou com o meu carro. — digo apontando para o carro preto do outro lado da rua.

— Ah. — diz olhando. — Então até mais tarde?

— Até mais tarde! — Sorrio pra ele.

  Você deve estar com aquela indagação

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  Você deve estar com aquela indagação. Como isso aconteceu? Como eu deixei acontecer?

  Festa de 15 anos.

   Quatro anos levando esse relacionamento. Joshua era um amigo, seu pai era amigo dos meus pais. O convidei para a festa e acabei o ajudando a enganar uma garota, Isabella.
  Ainda estudamos na mesma faculdade e pelo seu jeito, ainda não esqueceu o que houve.
  Joshua e eu acabamos tendo um momento romântico na piscina, meu primeiro beijo aos quinze anos. O que pra mim hoje é visto como algo ridículo e idiota da minha parte, mas no dia eu estava radiante com a ideia de ter beijado um garoto.
  Logo começamos esse relacionamento, que desde do início ele diz não ser sério. Eu queria, acabar com isso tudo, mas ele é a unica pessoa que eu tenho no momento.

  Jogo as chaves do carro na escrivaninha e retiro o casaco. As marcas, estavam ali, presentes e me perseguindo.

  Retiro os pensamentos sobre isso da minha mente e lembro-me que tinha que comprar flores para colocar na sala, fazia isso uma vez por semana em diferentes floriculturas da cidade.
  Pego uma certa quantia de dinheiro. Minha mãe gostava das rosas vermelhas, o que ajudava para dar uma cor a mais na sala.

  Tranco a porta pelo horário que não havia ninguém em casa. A rua não estava tão movimentada e eu preferi ir a pé até a floricultura que tinha inaugurado a pouco tempo.

  Assim que entro na floricultura, um sino faz questão de avisar minha entrada. Não gostava muito de sinos, eles faziam questão de me lembrar da minha avó Amélia. Na qual faz anos que não a visitamos.

  Um homem e uma mulher. Os dois não eram velhos, porém, nem tão jovens. Seus cabelos tinham alguns fios brancos que eu podia perceber pela boa visão.

— Boa tarde senhorita, você quer flores? — pergunta-me o homem.

Era uma pergunta um tanto tentadora. Queria flores em minha vida, colorir esse monte de preto e cinza.

— Sim, rosas vermelhas por favor. — sorrio e logo ele vai pegar a quantidade que eu falei.
  Ando pela loja passando a mão em algumas flores e logo volto para o balcão a espera do homem voltar.
  A mulher estava escrevendo algo em um caderno, o que eu ignorei. Mas depois de alguns segundos ela começou a me encarar.

— Boa tarde. — sorrio e logo percebo que seu olhar não está mais em meu rosto, mas sim em meu braço. O retiro de cima do balcão e ponho rente ao corpo.

— Você é muito bonita e jovem para fazer esse tipo de coisa. — diz tentando voltar a anotar algo no caderno, mas logo deixa a caneta de lado novamente. —  Por que se machucar? Eu me faço essa pergunta na maioria das vezes. Tivemos Jesus que morreu pela gente, que morreu, que foi machucado por nós e ambos nos machucando por ignorância a Ele. Jesus nos deu uma vida, por que desperdiçá-la deste jeito?

  Boquiaberta, eu pisco. Não sabia se era ignorante de sua parte se intrometer em minha vida ou apenas uma preocupação de adulto ou mãe. Suas palavras foram verdadeiras e duras que me atingiram como um soco no estômago.

— Pare de fazer isso meu bem, Jesus quer você bem, Ele quer ver você ao lado d'Ele.

  Aperto minhas mãos para não chorar ali na frente daquela mulher desconhecida. Por favor Mariana, seja forte uma vez na vida e não chore na frente desta mulher.

— Aqui estão as rosas, deu vinte e oito reais. — o homem me entrega as rosas enroladas em um papel e eu as seguro delicadamente, como se fossem de vidro e iriam quebrar a qualquer momento.
  Entrego o dinheiro e recebo dois reais de troco. Olho uma última vez para a mulher com o olhar meigo e vou em direção a porta.

— Ei. — ela me chama. — Não faça mais isso.

  Pisco algumas vezes para voltar ao mundo real e saio daquela floricultura sem ao menos assentir e agradecer pelas flores.
 

 

Entorpecida - Vol 1Onde histórias criam vida. Descubra agora