O sumiço

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-- 18 horas e 02 minutos.

Batidas à porta.

Não eram simples batidas, eram desesperadas e violentas. Inês já estava com telefone em punho para pedir socorro quando uma voz frágil sangrou pelo ar: "Trago notícias do Doutor. É urgente" -, dizia uma voz quase sem vida.

A voz não era estranha: "Quem é?" -, indagou Inês com desconfiança.

"Maria José, a mãe da moça que visitaram no hospital" -, Inês abriu a porta rapidamente e encontrou a mulher descabelada, assustada e em prantos.

"O que disse o doutor?" -, indagou Inês sem dar atenção ao estado da mulher.

Maria José deixou o choro cair e Inês a abraçou. Pois também era uma mãe tão vítima quanto aquela senhora. Ficaram abraçadas por alguns minutos. Inês segurou a sua ansiedade e curiosidade pelo recado em compaixão à Maria José que, após o abraço conseguiu acalmar seu coração.

"Desculpa o desabafo" -, se recompôs Maria José em sua polidez crente. "O doutor me revelou que seu filho sumiu após a explosão e eu não sei o que me deu. Não sou de perder o controle, mas estou desesperada! Levaram a minha filha para a ala psiquiátrica assim que o Doutor saiu de lá. Ele saiu depressa e pediu para que eu guardasse qualquer segredo para qualquer pessoa e que a senhora era a pessoa mais indicada em me ajudar, mas pediu primeiro que a senhora o encontrasse na estrada da ponte que liga o distrito às fazendas do oeste".

Inês pensou por alguns segundos e emitiu o seu parecer: "A senhora fez bem em me procurar. Como ele disse guarde o segredo para qualquer um. Voltaremos a nos falar em breve sobre uma série de coisas que talvez a senhora nem possa acreditar, mas primeiro preciso encontra-lo. Estamos todos correndo risco de vida e não podemos confiar em ninguém. Mas, por enquanto é bom que nos afastemos".

"Posso ir com a senhora se quiser" -, ofereceu-se Maria.

Inês retirou o roupão e colocou uma blusa de lã e seu jeans que estava no sofá na frente da crente sem se preocupar com as formalidades. Não era assim, mas agora havia pressa e queria muito acabar com tudo aquilo. "Acho melhor a senhora se afastar de mim por algum tempo. Eu nem sei ao certo em que estamos envolvidas com essa explosão. Na hora certa eu lhe procuro, Dona Maria. Do meu lado a senhora pode correr riscos também".

Maria José a olhou com medo. Aos poucos foi se afastando e saiu batendo a porta.

"Pobre mulher" -, pensou Inês. "Deve estar tão confusa quanto ou mais que eu. Uma mulher tão crente em Deus pode pirar ao descobrir que existem extraterrestres. Vai ser um choque daqueles". Inês pegou a chave e saiu em disparada.


*****

O sol já tinha abaixado e os canaviais estavam ficando escuros. Os barulhos das folhas de cana se mexendo deixavam Inês arrepiada conforme o carro passava em alta velocidade. Tinha a sensação que aquele monstro pudesse voar por sobre ela a qualquer momento saindo do meio daquelas folhas. Já estava rodando há quinze minutos em silêncio. Resolveu ligar o rádio na programação local e a música romântica a deixou menos tensa um pouco.

"Essa ponte não chega nunca!" -, esbravejou Inês.

"Caros ouvintes, conforme havíamos prometido, a edição do jornal de hoje será especial. Vamos falar sobre a explosão da mina ocorrida ontem no Distrito Vila de São Sebastião. Já em nossos estúdios, a presença de Dr. Zentchen, responsável técnico do Exército Brasileiro, que concederá uma entrevista exclusiva falando dos riscos de contaminação e as medidas adotadas pelo governo para proteger o distrito e as cidades nos arredores. Tudo isso em alguns segundos. Está no ar, o jornal da tarde ZYK 963 Mhz" -, mal a vinheta musical entrou no ar e Inês sentiu as pontadas nas costas pela tensão que o assunto lhe causava. Decidiu diminuir a velocidade. Estava disposta a ouvir o que o Chinês tinha a dizer.

Contratos VeladosWhere stories live. Discover now