Garota e cavalo

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Estava escuro, escuro demais, mas a pelagem do animal brilhava espalhando luz branca ao redor e a menina, ela era visível.
- Merda!
Ryan sussurrou e tirou o braço de mim, ele deu um passo na direção da menina, aquela visão horrenda, mas ele parou nesse mesmo passo, o vi apertar onde estava ferido. Ele se virou para mim, o rosto contraído em dor e ódio.
- Tirya, eu preciso que você...
- O que é isso?
Eu falei alto demais e o animal virou a cabeça em nossa direção. Os olhos de um preto profundo e um chifre, um cifre brilhante coberto de um vermelho vivo, não... era mesmo algo escorrendo ali, era sangue. Sangue da garota. Ela estava encostada na árvore, o rosto sem vida. Uma capa vermelha que se confundia com o sangue que escorria pelo vestido amarelo, não era uma menina, apenas parecia, ela já tinha mais de vinte anos, mas era pequena. Nuvens de ar se formaram quando o animal bufou.
- Tirya, você sabe o que isso significa?
Eu tinha lido sobre eles. Aqueles cavalos com chifres que eu tinha achado bonitinhos durante minha infância. Aqueles cavalos bonitinhos que minha mãe chamava de monstros. Os unicórnios realmente não tinham nada de encantados. Não com aquele sangue pingando de sua boca e chifre, não com aqueles dentes pontudos expostos ou com aquele vrilho surreal no meio da escuridão. Ele não me viu, ele viu Ryan, em pé na minha frente.
- Ryan...
- Shh! - ele estendeu uma mão para trás.  - Me dê a sua espada.
Tremendo coloquei o punho em sua mão.
- Você tinha tirado da bainha?
Ela estava nua, a lâmina brilhando com o menor sinal de luz e o metal estava intacto, com uma mancha de sangue na ponta, o sangue da bruxa.
- Sim.
- Ótimo.
Ele estendeu a espada para a frente a apontando para a fera. Dei um passo para frente. Ryan estava fraco, mas pretendia matar a besta?
- Idiota. Fique atrás.
Ele sussurrava. Ergui a espada dele, ela era branca como a neve, não combinava com o senhor das trevas, mas agora eu pensava que ele a empunhando devia ser uma verdadeira demonstração de habilidade.
O unicórnio me viu. Eu senti o olhar dele. Eu vi os olhos mudarem, o negro diminuiu e se tornou uma pupila envolta por vermelho. As presas se esconderam e ele quase pareceu um cavalo comum, quase. O sangue escorrendo pelo chifre não me permitia esquecer. Ryan deu um passo para o lado, me expondo mais.
- Você é virgem!
Ele falou com um grande sorriso, eu olhava dele para a besta rapidamente.
- O que tem isso?
Ele gargalhou e deu um passo para trás de mim.
- O que tem? Você não estuda direito? Unicórnios amam virgens, mulheres, é claro. Vamos matar essa coisa!
Como se entendesse a besta voltou a olhar para Ryan e se tornou assustador como antes, exibindo ainda mais os dentes.
- Como... como o matamos?
Com o som de minha voz ele olhou para mim e se tornou dócil novamente. Ele era assustador. Vi que a espada estendida tremia comigo.
- Você terá que enfiar a espada logo abaixo do pescoço dele, no... peito. Inclinada levemente para cima, o ângulo tem que ser perfeito.
- Eu não consigo.
Ele era louco se achava que eu conseguia matar, ainda mais apavorada e ainda mais se achava que eu acertaria.
Ele se aproximou de mim por trás e estendeu Tyrfing na minha frente, passou a outra mão por cima de meu ombro e pegou a espada dele.
- Com isso você consegue. Não vai errar.
- Ryan, eu não posso. Eu não posso matar.
O pavor da culpa era grande demais.
- Ele é uma criatura das sombras. Veja a garota. Vai deixar que ele mate mais?
Tudo que eu podia ver era a garota. Os olhos sem vida e o sangue escorrendo por seu lindo vestido. Então eu me aproximei. E eu fiz.

Cidade de Magia - Contos de EspinhosWhere stories live. Discover now