10 - Que tal um beijo?

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Seus olhos me fitavam tão intensamente que não fui capaz de desviar o olhar.

— Não, não acreditaria.

Sorri e o encarei, ele sorria também, mas por alguma razão, não era um sorriso irônico como o meu... era um sorriso malicioso, o que me fez fechar a cara na mesma hora, pois em minha mente eu e ele nos beijávamos.

— O que foi?

— Por que faz isso? — Eu praticamente gritei.

— O que você pensa que eu estou fazendo? Por que não diz? Não acha que tudo ficaria mais fácil?

Eu tentava afastar as imagens da minha mente, mas era... real demais.

Intenso demais.

E era como se ele realmente lesse meus pensamentos, pois eu sentia que já o conhecia de algum lugar, mas não conseguia me lembrar de onde. Saí de perto dele e deixei a cozinha, fui até a sala e peguei Scarlett, sentei no sofá e permaneci brincando com ela, como se nada tivesse acontecido. Luca logo apareceu na divisa entre a cozinha e a sala, e olhou para mim.

— O que foi? — Indaguei, acariciando o cachorrinho.

— O almoço ficará pronto em alguns minutos.

— Tudo bem...

E ele continuou ali, observando-me, querendo me dizer outra coisa, mas não sabia como, pelo menos foi o que me pareceu.

— O que vai fazer amanhã à noite?

Será que ele vai me convidar pra sair? Deus, faça-o tomar uma atitude logo...

— Provavelmente ficarei debaixo da coberta lendo e comendo chocolate... muitos chocolate.

— É que... se você não tivesse algo tão importante para fazer como isso, eu a convidaria para jantar.

Acabei sorrindo.

— Eu dispenso os chocolates, posso ficar com eles um outro dia.

— Ótimo. — Assentiu. — Trarei alguns amigos para conhecê-la.

Encarei-o, sem acreditar.

— Por que seus amigos devem me conhecer?

— Porque você é uma adolescente que fica comendo chocolate durante uma sexta-feira ao invés de sair e se divertir?

Olhei-o com descrença.

— Não sou uma garota chata e antissocial, é só que...

— Eu não disse isso. — Interrompeu-me.

Observei Scarlett mordiscar minha mão.

— Sim, você disse, só que usou um eufemismo.

Luca me encarou e, revirando os olhos, retornou à cozinha. Fiquei na sala com Scarlett durante algum tempo, até que ele me chamou para almoçar. Sentamos nas cadeiras lado a lado, então, estendi o prato para que ele pudesse colocar a cheirosa macarronada em meu prato, mas ele disse para eu mesma fazer isso.

Que cavalheiro.

Enquanto comíamos, notei que Luca não degustava da comida com muita vontade, o que é estranho para um homem.

— O que foi? — Perguntou-me ao reparar que eu o observava.

— Nada, só estou com vergonha...

— Por quê?

— Porque estou terminando o meu almoço antes de você, e provavelmente vou repetir, enquanto você mal tocou na comida...

Luca riu, encarando-me.

— Você sempre foi assim...

De repente, ele parou de sorrir.

— Como?

— Foi uma pergunta...

Mentiroso...

— Sim, sempre. — Respondi, fingindo não ter notado a mentira em sua voz.

Ficamos algum tempo sem silêncio, e enquanto eu colocava um pouco mais de macarrão em meu prato, ele me questionou:

— Não quero ser indelicado, mas... por que estava chorando ontem?

Pus o garfo sobre o prato e cruzei as mãos sobre o colo.

— Meu pai quer ir embora daqui... eu não quero isso, mas ele não entende.

— Embora?

— Sim, para o Rio. Eu sei que São Gabriel não é lá uma grande cidade, com muitos empregos disponíveis ou coisas para diversão... mas eu amo esse lugar. E Juliana está aqui, ela é a única pessoa que eu tenho, não posso ir. Simplesmente não posso perder outra pessoa. Tudo bem que nós poderíamos nos visitar, mas não importa, é aqui que eu quero ficar.

— Entendo...

— Já teve de sair de seu lugar? Daquele lugar que... é como se fosse sua própria casa? — Indaguei.

Encarei-o, esperando por uma resposta. Ele fitou o nada por um tempo que me pareceu muito longo, como se estivesse perdido em seus pensamentos.

— Já. — Respondeu-me, somente, ainda fitando o vazio.

Depois do almoço, lavei os pratos e talheres para Luca enquanto ele arrumava seu quarto -pelo menos foi o que ele me disse que faria. Eu já estava na sala quando Luca desceu a escada calmamente, observando-me. Em seguida, quando sentou-se ao meu lado, senti seu perfume e fechei os olhos por alguns segundos.

— Como são seus amigos? — Perguntei, apenas para iniciar um assunto.

— São legais... Um dele é meu irmão.

— Sério? Mais velho?

Luca sorriu e balançou a cabeça negativamente.

— Mais novo... bem mais novo.

— Quantos anos você tem?

— Digamos que... — ele se virou em minha direção — o suficiente para fazer com que você nunca queira...

Estávamos sentados lado a lado, nossas pernas roçavam uma na outra, e um calor acolhedor e familiar emanava dele.

— Com que eu nunca queira...? — Indaguei, aproximando meu rosto do dele.

Luca encurtou ainda mais o espaço entre nossos rostos, fazendo com que as pontas de nossos narizes se tocassem. Ele estava de olhos fechados. Nossas respirações estavam entrecortadas e eu estava nervosa, tão nervosa que seria capaz de beijá-lo logo para acabar com aquela tortura. Seus lábios eram um convite tentador, mas ele nada fazia além de sentir minha aproximação. Não que fosse uma sensação ruim, era maravilhosa, mas eu já não estava mais conseguindo suportar aquilo...

Segurei seu rosto com uma das mãos, e ele segurou minha nuca. Seus dedos frios causaram arrepios em mim. Nossos lábios estavam muito próximos. Eu estava prestes a ordenar que ele me beijasse quando, de repente, alguém abriu a porta de entrada da sala com força, causando um estrondo no cômodo.

Abra os olhos, Anjo (livro 2)Where stories live. Discover now