A glass of wine

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   O restaurante ficava no alto, com um lindo terraço em forma de meio círculo. De lá era possível acompanhar o jogo de polo e ter uma vista panorâmica da propriedade. Enquanto os três degustavam uma lagosta, Edson parecia eufórico com os hóspedes que chegavam. Entre eles o governador de São Paulo, empresários e banqueiros que Fernanda já tinha ouvido contar ou visto nas revistas de fofoca.

Levantava a cada minuto para recebê-los e Fernanda notou que ele era um homem cobiçado, as mulheres não paravam de olhar para ela, a medindo de forma curiosa, para saber se eram mais do que amigos...

Assim que ele se levantou para cumprimentar o dono do banco Fortuna, Fernanda comentou com Alex:

– Edson é casado?

Alex abriu um sorriso, malicioso:

– Não, mas sabe como é... Solteiro, mas nunca sozinho...

Fernanda riu e deu um gole em seu espumante. Na verdade, talvez ela estivesse equivocada, assim como muitas mulheres ao redor. Ele era de fato um homem muito bonito, educado, mas alguma coisa estranha pairava pelo ar, algo que ela não ainda tinha conseguido compreender.

O celular de Fernanda começou a tocar, e a foto de James surgiu na tela.

– Com licença, Alex.

Fernanda caminhou até o hall de entrada, onde haviam alguns sofás confortáveis. Se sentou para falar com o marido, que já aparecia na tela.

– Oi Fernanda, tudo bem por aí? A gente não se falou mais.

– Oi James, desculpa. As coisas estão corridas por aqui.

– Posso te ver? Por que não liga a câmera?

– Não dá, estou almoçando num Hotel aqui perto da fazenda. Prefiro falar por voz, se não se incomoda.

–Hotel?

–Estou no hotel do cara que quer comprar a minha fazenda. Ele me convidou para passar esse final de semana, para que eu conheça seu empreendimento. Sei lá, acho que quer me passar confiança, essas coisas.

– Entendo. Você sabe quanto tempo ainda fica no Brasil?

Fernanda bufou e afastou o telefone de perto, sem responder.

– Bom, você deve estar ocupada aí.

– Desculpa, o sinal não está muito bom. Não sei quando volto, como te falei James, muitas coisas estão surgindo por aqui.

– Mas você ainda tem o seu trabalho aqui, não? E um marido?

– Ah, por favor, James. Não vamos começar esse papo, como se fossemos um casal que se ama. Antes de eu vir ao Brasil, você não parecia se importar...

– Bom, Fernanda. Se estamos separados, preciso saber. Ok?

Ela se sentiu mal ao ver a cara dele. Estava bonito, com um chapéu panamenho e uma camisa polo, cor de rosa.

– Desculpa, James. Estou do outro lado do mundo e quase não consigo pensar em como vai ser a minha vida, muito menos a nossa.

– Estou sentindo a sua falta.

Ela se calou. Infelizmente a recíproca não era verdadeira. Tudo que ela não estava sentindo era saudades, talvez a palavra certa fosse, alivio.

– James, se você quer dar um nome para o que está acontecendo com a gente, talvez seja "um tempo". Sinta-se à vontade para namorar quem quiser...

– Ah, você já está me jogando fora?

– Você realmente quer ter um d.r comigo, agora?

– Não, Fernanda. Eu gostaria mesmo, de ir ao Brasil te encontrar.

– Me desculpa, James, mas eu preciso ficar sozinha agora.

– Ok. Se é o que você quer, não te procuro mais.

Ele deu um gole de seu vinho, e ela sentiu vontade de abraçá-lo, beijá-lo, dizer que queria tentar, mas algo dentro dela a impedia. Era como se soubesse que ele precisava de um choque, talvez para começar a dar valor à relação... sair desse mundo egoísta em que os homens, principalmente os dessa geração, viviam.

– Faça como quiser, James. Não quero me aborrecer agora, mas estou por aqui se quiser conversar, ok?

– Tem certeza disso? Ao menos deixe-me vê-la?

Fernanda olhou ao redor e Edson conversava com o governador. Resolveu ligar o vídeo para James:

– Oi.

James sorriu ao vê-la.

– Uau! Os ares do Brasil estão te fazendo muito bem, está linda e queimada!

– Para você ver... Estava precisando mesmo de férias, estou me sentindo bem mais saudável.

– Conseguiu me dar inveja. O tempo aqui está terrivelmente frio, mas fico contente que você esteja aproveitando. Você sabe o quanto insistia em tirarmos férias, não sabe?

Fernanda concordou e até sentiu culpa.

– Eu sei...

– Você está usando o brinco de pérolas que eu te dei?

– Estou.

James deu outro gole no vinho, e ficou olhando para a câmera, como se estivesse a despindo:

– Queria que você soubesse que te amo.

Fernanda se desconcentrou. Já não sabia há quanto tempo não o ouvia se declarar assim, já ia ceder e responder que também sentia amor, quando Edson veio caminhando com o governador em sua direção.

– James, me desculpa, mas agora preciso ir.

– Está bem. Manda notícias?

– Fique bem. E por favor, cuide-se.

Ele deu outro gole no vinho e ela imaginou que não seria a única garrafa, logo depois desligou, antes mesmo de ele notar.

Edson esperou que ela desligasse o telefone para lhe apresentar o governador. Ele fez vários elogios à Raquel e sua família, e honestamente, Fernanda não se sentia no pique de ficar ouvindo toda aquela ladainha de políticos. Queria voltar para a mesa e terminar sua sobremesa. Falou mais algumas coisas com o governador e pediu licença. As únicas imagens que tinha em sua mente, eram de James a olhando com saudades e desejo. Seria possível que a relação ainda pudesse sobreviver? Pensava consigo mesma, como a vida podia ser tão inconstante e surpreendente. Sentia saudades de coisas estranhas, como de Panda e de seu diário, e decidiu que iria voltar para a fazenda naquela mesma noite.

...

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