24 - Pesquisas e decisões

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Até o dia em que algo diferente aconteceu. Preparou-se uma vez mais para deixar o corpo, a alma envolvida na magia dos treze Corações, conforme ensinado pelo Tempo. Passou por vários planos já conhecidos, decidindo ir além, o máximo que pudesse. Ambicionou, com toda a força, terras distantes e desconhecidas. A velocidade de seu corpo etéreo foi aumentando exponencialmente, borrões se formando em frente aos olhos. Até que chegou a um lugar. Uma espécie de sala. Cinza, neutra. Não havia absolutamente nada naquele espaço. Parecia uma sala esterilizada, totalmente comum. Encontrava-se em um extremo, e foi andando até a outra ponta.

Lá, surgido de lugar nenhum, um brilho despontou. Elias foi ofuscado, tendo que desviar o rosto daquela direção. Não conseguiu identificar quantos eram, mas percebeu que se tratava de seres conscientes apenas quando lhe dirigiram a palavra, falando a língua mãe de Novea, em um tom perfeito.

- Sentimos muito, mago, mas você não pode passar daqui. Este lugar só pode ser adentrado por aqueles que desencarnaram.

Elias ficou estarrecido com a voz e a informação.

- Por isso vamos mandá-lo de volta. E pedimos que não retorne para cá.

Então eram pelo menos dois. A voz que falara primeiro era mais grossa, masculina. A segunda, melodiosa e feminina.

Quase ao mesmo tempo em que percebeu isso, sentiu-se empurrado, como se algo tivesse se chocado contra ele. Foi lançado de volta ainda mais rapidamente do que chegara ali. Quando despertou em seu próprio corpo, foi como se tivesse caído de uma grande altura e batido as costas numa parede de água. Completamente dolorido, levantou-se da mesa acolchoada que mantinha em seu laboratório de pesquisas. Capengou até a escrivaninha e anotou depressa os últimos acontecimentos. É claro que ele não tinha a menor intenção de seguir os conselhos daqueles seres brilhantes.

"Este lugar só pode ser adentrado por aqueles que desencarnaram." Seria então Mag Mell? A terra dos mortos? Hana e Hélen estariam lá? Elias estava disposto a tentar mais uma vez.

Muitas outras vezes ele refez aquele caminho. Em algumas, sequer conseguiu encontrar a sala cinza. E nas que conseguiu, era sempre enviado de volta.

Ao final de cinco longos anos de tentativas infrutíferas, Elias começou a levar a sério o que os guardiões de luz diziam. Mag Mell só era adentrada pelos mortos. Aquela aceitação fez com que mudasse totalmente de perspectiva.

Ele tinha alguma coisa a perder? Havia algo que o prendia àquele mundo?

Pensou em Irene. Talvez, se abandonasse a Guilda e a seguisse, eventualmente aquela obsessão deixasse o seu âmago.

Mas aquilo traria apenas dor de cabeça para ambos. A Guilda nunca permitiria que um membro como Elias se retirasse, e o caçaria até eliminá-lo. Além do mais, Irene há muito tempo já tinha uma vida própria, com assuntos próprios, e quem sabe, até mesmo novas paixões. Seria patético barganhar seu amor naquele momento.

Poderia tentar tocar a vida normalmente dentro da Guilda. Imediatamente riu-se de sua ingenuidade. Depois que seu interesse era cativado, era virtualmente impossível que conseguisse deixá-lo de lado. Por que ele iria tentar viver na ignorância, quando havia um mundo inteiro para ser explorado lá fora?

Levou dias ponderando e analisando tudo aquilo de que abriria mão, se resolvesse entrar naquela viagem sem volta. Por fim, questionou-se, tendo ele mais de dois mil anos de vida, o que mais pretendia realizar naquela terra, que já conhecia como a palma da mão. Com esse último pensamento, decidiu-se. Deixaria Novea para sempre.

Com essa resolução, começou os preparativos. Várias pesquisas, e sobretudo as anotações sobre outros mundos, foram despachadas para fora da Guilda, longe dos olhos dos membros do conselho. Eles não sabiam de nada daquilo, e nem deveriam saber. A ganância e ânsia por poder poderiam se tornar perigosas demais. E o que ele menos queria eram aqueles velhos obtendo glória às custas de seu trabalho. Alguns registros e tratados ele optou por destruir. Anos de pesquisa perdidos para sempre. Não pôde deixar de sentir um aperto no peito.

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