Capítulo 24

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No astral, Doniya assistia a tudo com o coração oprimido. Não fosse Harry a seu lado, não teria conseguido manter-se em equilíbrio. Mas o espírito amigo ia encorajando-a e fazendo-a lembrar-se, a todo momento, de que nada na vida acontece em vão.

- Mas isso era necessário? - questionava ela, ainda tentando encontrar um meio de aliviar o sofrimento do irmão.

- Bem... sim e não. Nada que acontece no mundo é desnecessário. Por outro lado, Zayn poderia ter optado por outros caminhos. Mas nada melhor do que a experiência para nos fazer conhecer e compreender os efeitos de nossos atos.

- Tem razão. Mas ele está sofrendo tanto!

- Sofre o que escolheu para si mesmo. Foi a opção dele, não para que sofresse, mas para que compreendesse. Só que nós, quando encarnados, estamos presos ao sentir da carne e medimos nosso sofrimento pelo que a atinge, seja física, seja emocional, seja mentalmente.

- Como assim?

- Fisicamente, reagimos à dor. Pancadas, escoriações, mutilações. Emocionalmente, sentimos tristeza, saudade, culpa, rejeição. Mentalmente, retemos lembranças difíceis, criamos ilusões e máscaras de comportamento para levarmos avante a personalidade que nos foi dada nessa vida. Tudo isso, embora se processe em níveis distintos de nossa consciência, acaba por refletir-se em nosso corpo físico. Tanto que adoecemos.

- É verdade...

- E isso porque não conseguimos enxergar além do mundo material. Quando conseguimos ver com os olhos da alma, vamos entendendo nossos processos. Para Zayn, nesse momento, ele é vítima de uma trama e de uma injustiça. Para sua alma, ele apenas está acionando a roda da vida, fazendo com que se cumpra mais uma etapa em sua jornada de luta pela evolução. E, creia-me, Doniya, nada acontece que não tenha sido escolhido ou aceito por ele. Porque ele quis, porque desejou, porque acreditou ser essa a melhor forma de aprender. Nada lhe foi imposto nem exigido. Ninguém quis castigá-lo nem o incentivou à autopunição. Foram suas culpas, seus medos, seus ódios que o fizeram escolher essa experiência. E seu desejo de mudar.

- Pobre Zayn...

- Não diga isso. Ninguém é pobre quando está ganhando valiosos ensinamentos morais. Tudo que acontece é para nosso bem, se não nesta, em outra vida. Porque ninguém consegue escapar da vida espiritual. E é lá, quando deparamos com o que somos e com quem somos, que temos de acertar contas com nossa consciência. É ela que vai determinar o que já vencemos e o que ainda não.

- Sei que tudo na vida tem um porquê. Sei também que ninguém sofre por acaso. Sei de nossas escolhas e de tudo o mais. Mas Zayn é meu irmão. Sinto pena dele.

- Pois não devia. Por que sentir pena de quem está crescendo? Agora pode não parecer, mas depois você verá os resultados. Quando ele se libertar das culpas que traz, do antigo vício da pedofilia, da total ausência de respeito por seus semelhantes, você me dirá se valeu ou não a pena. Nada como ser livre, Doniya. E só seremos inteiramente livres quando nosso coração não se confranger mais diante das lembranças. No dia em que pararmos e olharmos para dentro de nós mesmos, evocando recordações de tempos idos, e isso não nos incomodar, aí, sim, já teremos nos libertado e estaremos prontos para viver novas experiências em outros mundos.

Fez uma pausa e mudou o tom de voz:

- Mas ainda há outros espíritos sofrendo verdadeiramente, porque atirados num lamaçal de dor por sua ignorância e relutância em crescer.

- Quem? Alguém que eu conheça?

- Sim. Alguém que você conheceu de perto. Quer ver quem é?

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