Capítulo Dez

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            Algum tempo depois todos já estávamos acostumados com a casa, Jim às vezes não aparecia, pois entendeu que eu sei me locomover sozinha, papai conseguiu um emprego em um escritório e eu e Nick nos tornamos mais amigo. Mas então o dia chegou. Quando acordei senti que o dia estava mais frio, levanto da minha cama e vou até o armário.

            — Minha mãe morreu hoje. — Falo olhando para o vestido preto dentro do armário. Puxo-o e começo a passa-lo por minha cabeça. — Mamãe, eu sei que a senhora não está aqui, mas acho que pode me ouvir, eu passei a noite inteira sonhado com o jardim, passei a noite escutando a voz de Ester falando que eu estava errada e Jane resmungando como estava gorda para seus vestidos impecáveis. — Paro de falar e lembro que ela não está aqui. — Preciso de você aqui mamãe. Sinto sua falta, sinto falta de como você me falava para ter cuidado com os meus sonhos, sinto falta de como dizia que eles se realizavam. Eu queria que você estivesse aqui para conhecer meu amigo Nicolas e para ver o novo emprego do papai. Sinto tanto a sua falta mamãe. — Seco o rosto, pois sei que as lagrimas estão escorrendo. Faço um coque no cabelo, pego meus livros e desço. Jim não está lá, então continuo o caminho sozinha. Papai está com uma roupa escura e com a cara enfiada no jornal, Lize e Luna já estão sentadas, ambas com vestidos pretos, e Charlie está sentado na ponta da mesa com o livro na mão, também usando uma roupa escura. Os empregados parecem assustados com a tristeza que está predominando a casa e apenas colocam a comida na mesa e saem. Comemos sem falar nada. Seguimos para a carruagem que já está esperando do lado de fora. Nick está esperando na entrada da Chácara e entra na carruagem com um sorriso no rosto.

            — Bom dia. — Ele falou, e todos sussurram a mesma saudação em retorno, Nick olha para mim e pergunta: — Porque vocês estão assim?

            — Nossa mãe morreu nesse dia. — Explico e olho para janela, as lágrimas invadem meus olhos. Não posso mais chorar!

            — Me desculpe, eu sou um tolo por não perceber. — Ele diz, e parece realmente envergonhado. — Eu ia te chamar para ir a um lugar comigo, mas acho que a gente devia marcar para outro dia. — Viro-me para ele e penso a respeito, minha mãe iria adorar que eu não ficasse guardada dentro de casa, embora seja o dia da morte dela.

            — Eu adoraria! — Falo finalmente, tentando abrir um sorriso. Ele parece se alegrar com a resposta, pois um sorriso surge e ele começa a falar rapidamente.

            — Que ótimo! Podemos ir quando chegarmos da escola? — Assinto com a cabeça e ele continua sorrindo. Meus irmãos parecem não ouvir nada, pois continuam imóveis em seus assentos. Continuo olhando pela janela, enquanto percorremos o caminho até a escola da cidade. Descemos da carruagem e seguimos para sala. Minha tristeza ainda continua, afinal hoje foi o dia em que minha mãe faleceu, mas eu não consigo deixar a curiosidade de lado, e mal posso esperar para que as aulas acabem.

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            — Espero que goste, esse lugar me deixa muito feliz. — ele explicou enquanto descemos da carruagem. Eu sorrio. Começamos a andar e subitamente Nick começa a correr. Tento acompanhar seu ritmo, mas o vestido me impede. Entramos na floresta de pinheiros.

            — Calma... Vai mais devagar... — Arfo. Ele reduz a velocidade enquanto ri da minha incapacidade. Andamos e paramos em frente a uma árvore com longas cortinas de folhas a cobrindo.

            — Esse é meu lugar favorito em todo o mundo. — Falou.

            — Mas é só uma árvore. — Ele ignora e atravessa à cortina, eu o sigo e nos sentamos em uma toalha quadriculada estendida no chão. O tempo parece não passar ali no meio daquelas plantas, e chego a me assustar quando Nicolas fala:

            — Eu preciso te contar uma coisa, que acho que você não vai gostar de ouvir, mas preciso contar mesmo assim.

            — O que você está falando? — Pergunto.

            — É sobre o sótão da sua casa.

            — Você falou que não iriamos falar sobre isso. Deixa-me adivinhar, você quer pôr-me em um manicômio? — Pergunto me arrependendo de ter vindo até aqui. Deveria ter ficado em casa.

            — Não é isso, eu só acho que você deveria ter obedecido à droga do bilhete.

            — Como você sabe do bilhete?

            — Isso é o de menos, eu só quero te pedir para não voltar aquele lugar, você está me entendendo? — Ele perguntou como se fosse um pedido crucial.

            — Como você sabe sobre o bilhete? Porque não posso voltar ao Jardim? Eu sou a princesa daquele lugar, não posso abandonar todo mundo!

            — Meu Deus Lia, pensei que fosse mais esperta. Você não pode ser a princesa de lá. — Ele grita, mas depois começa a sussurrar. — Ela não pode fazer isso de novo, não com ela. Ela não!

            — Pelo jeito você é que precisa ir para um manicômio. Não existe lugar melhor que o Jardim. Eu não poderia querer coisa melhor, não vejo motivo algum para não voltar para lá.

            — Lia esse lugar não é tão maravilhoso quanto você pensa, eles... — Eu o interrompo:

            — Como você sabe? Por acaso já esteve lá? — Pergunto, e olho para ele, sinto que venci, ele parece não saber o que responder, mas então ele, inesperadamente, me beija.

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            Não sei quanto tempo o beijo durou, mas sei que não foi muito, pois ele acaba quando Nick me afasta e fala:

             — O que deu em mim? Meu Deus, eu não deveria ter feito isso, As regras desse lugar são claras, Nicolas! Me perdoe Lia, imagino que não vai mais querer olhar para mim, ou talvez queira que eu me ajoelhe para pedi-la em casamento... Mas eu só vou pedir para não voltar aquele Jardim. Por favor. — Ele falou e passa por entre a cortina de plantas. Eu não movo músculo algum. O que foi que acabou de acontecer? Então quer dizer que esse foi o meu primeiro beijo? Mas eu só tenho 12 anos! E eu não posso contar para ninguém, pois a única pessoa que eu tenho para contar estava lá! Sento na toalha estirada no chão. Nicolas me beijou. Mas eu só o conheço há meses! Ele me beijou e foi embora. Deixou-me aqui. O que as pessoas vão pensar de mim? Como ele sabia aquelas coisas sobre o Jardim? Eu não contei nada daquilo para ele. Porque ele não gosta de lá? E mais importante, porque não quer que eu volte? São muitas perguntas vagando em minha cabeça, mas não existe resposta alguma.

            Eu só tenho duas opções agora, perguntar para Nicolas, que já provou que não vai responder nada, ou perguntar para Colin, que se não me responder, pode pelo menos me dar um livro.

            Mas ele está no Jardim, e Nick disse para eu não ir. Mas eu preciso de respostas. Duas pessoas dentro de minha cabeça pareciam discutir. E aquilo estava me incomodando. Em poucos minutos o meu melhor amigo me beijou e me abandonou no meio de uma floresta sem resposta alguma. Como ele não vai me responder não tenho outra escolha, começo a sair debaixo da árvore para chegar até minha casa, vou voltar ao Jardim com o consentimento de Nick ou não.

capítulo revisado/reescrita dia 11/08/2017, se eu encontrar algum erro, por favor comente.

A princesa das borboletasWhere stories live. Discover now