Capítulo 57: Uma verdade não dita.

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Felipe voltou a se sentar ao meu lado, enquanto Eduardo e Bernardo pararam atrás da cadeira dele. Fiquei um pouco tensa quando Léo ficou atrás de mim, tocando meus ombros com um carinho de partir o coração. Agora sem a presença de Thiago ele parecia finalmente mais calmo.

—Eu já tomei a minha decisão em relação a vocês. —Ele lançou um olhar demorado ao meu irmão, já que aquilo não se aplicava a ele. —Mas antes de qualquer coisa, quero dizer que estou absolutamente decepcionado com as últimas atitudes que tiveram, mesmo por mais nobres que fossem. Não vou expulsa-los, mas terão que prestar alguns serviços a universidade pelos próximos meses.

Soltei um suspiro de alívio, porque aquilo era melhor do que qualquer coisa que eu esperava. Os rapazes nem retrucaram, como se já estivessem esperando por isso também. Mas ainda sim, a culpa estava corroendo dentro de mim. Eu não sabia como lidar com tantos sentimentos de uma vez só. Era tudo demais pra mim.

Fiquei quieta enquanto o reitor terminava de falar com eles, antes de finalmente sermos liberados para irmos embora. Me levantei, ignorando a voz de Léo me chamando. Fui até onde Manu esperava no corredor, a puxando para irmos pra casa. Sabia que quando chegássemos lá, seria a nossa vez de ter uma conversa. Léo tentou me chamar de novo, mas eu o ignorei, sentindo que iria vomitar se ficasse naquele lugar por mais algum minuto.

[...]

—Desculpa ter contado, Júlia. —Manu me entregou um copo de água, enquanto eu me sentava no sofá e escondia o rosto entre as mãos. Sua voz era cautelosa, como se ela estivesse com medo que eu tivesse muito irritada. —Mas eu não podia ficar em silêncio, vendo ele fazer aquilo com você. Eu só estava tentando te proteger.

—Eu sei. —Foi a única coisa que consegui responder, sentindo um gosto amargo na minha boca, antes de beber um pouco de água. Minhas mãos estavam tremendo ao redor do copo, como se eu tivesse perdido o controle do meu corpo.

Apertei os dedos ao redor dele e o soltei na mesa de centro quando ouvi a porta se abrindo. Nem precisava olhar pra entrada pra saber que era meu irmão e provavelmente Felipe e os outros. Cada terminação nervosa do meu corpo reagiu a isso, como se eu fosse explodir a qualquer segundo. Mas não era de raiva, era só cansaço e frustração.

Ninguém disse absolutamente nada, o que me deixou tensa. Quando finalmente tive coragem de olhar, era apenas Felipe que estava ali. Nenhum dos outros a vista. Nem mesmo meu irmão. Um nó se formou na minha garganta quando nossos olhos se encontraram e Manu se afastou, parecendo sentir o clima esquisito no ar.

—Eu vou ver como os outros estão. —Manu caminhou até a porta, passando por Felipe e tocando o ombro dele com cuidado, antes de olhar pra mim por cima do ombro. —Desculpa, Juju. Eu realmente só estava tentando fazer a coisa certa.

Eu não havia a culpado por nada, mas conhecia Manu o suficiente para saber que ela ficaria o restante dos dias se desculpando por isso. Mas eu não a julgo, porque teria feito a mesma coisa se estivesse no lugar dela. Eu também a teria ajudado, mesmo que isso fosse fazer ela ficar chateada comigo.

Ela saiu, fechando a porta e deixando eu e Felipe sozinhos. Meu coração se apertou e eu desviei os olhos, soltando o ar com força. As lágrimas ameaçando voltar. Mas eu estava cansada até mesmo de ficar chorando. Thiago não mereceria qualquer lágrima minha. Ele nunca tinha merecido.

—Você ia terminar comigo? —Felipe questionou, caminhando até o meio da sala, sem fazer menção de se aproximar de mim.

Pelo visto iríamos ter aquela conversa. Aquela onde as cartas eram colocadas na mesa e ambos tentávamos ser os mais sinceros possível. Aquelas conversas assustadoras onde você ficava com medo de abrir seu coração e sair machucada.

—Pra falar a verdade, eu não sei. Acho que não. —Balancei a cabeça negativamente, passando as mãos nos meus cabelos, enquanto engolia em seco. —Nunca passou pela minha cabeça terminar tudo com você. Eu acho que ia tentar resolver a situação de outro jeito, assim que tivesse certeza que nada iria respingar em você.

—Tudo ia respingar em mim, Júlia. Independente se ele fizesse algo contra mim ou não, isso ia respingar em mim. Eu e você estávamos juntos. Tudo que te envolve, chega até mim também. —Felipe retrucou, erguendo a mão como se estivesse tentando explicar algo óbvio. —Sabia que tinha alguma coisa errada. Primeiro pensei que fosse por minha causa. Depois percebi que não era e então estava disposto a te dar espaço e deixar você me contar quanto estivesse segura. Mas você ia, em algum momento, me contar sobre Thiago?

—Não, eu não ia. Porque eu não queria envolver você nisso. Eu não queria enfiar uma coisa que me machucou no meio de nós dois. —Afirmei, ficando de pé, odiando aquele buraco que estava se abrindo entre nós dois. —Teve muitas verdades que eu não disse a você, Felipe. Thiago é apenas uma delas. E eu sinto muito por sua vida ter sido afetada por causa disso. Por ter se envolvido comigo.

—Você é tão inteligente, Júlia, mas as vezes é tão boba. —Soltou, me pegando de surpresa com suas palavras, o que me fez exibir uma careta pra ele. —Se tem uma coisa que não vou me arrepender nisso tudo, é de ter me envolvido com você. Me arrependo de não ter batido mais no seu ex namorado. Ele merecia uma surra pior do que levou.

Soltei uma risada nervosa, escondendo o rosto entre as mãos, odiando o fato de que meus sentimentos estavam tão revirados naquele momento, me deixando exposta. Felipe se aproximou de mim, passando os braços ao redor da minha cintura, antes de me aninhar contra o seu peito e me abraçar.

—Você quase foi expulso por minha causa. —Falei, passando os braços ao redor dele, enquanto sentia o calor do seu corpo me envolver de forma protetora. Felipe apenas balançou a cabeça, como se isso não tivesse importância. —Foi por causa dele que a casa dos seus pais foi invadida, Felipe. Você não está entendendo o quão grave isso é.

—Bem, eu estou. —Felipe suspirou, erguendo a mão para apertar os olhos, como se a última informação envolvendo os seus pais o tivesse desestabilizado por um momento. —Estou entendendo o quão grave isso é. Entendi no momento que percebi tudo que Thiago já tinha feito a você e porque Léo estava tão irritado. —Felipe segurou meu rosto, acariciando minhas bochechas, enquanto olhava no fundo dos meus olhos. —É por isso que dessa vez você vai até a polícia dar queixa contra ele. Contra tudo que ele já te fez. Nada de continuar a ter medo do que ele vai fazer. Ter medo não vai evitar que ele volte, Júlia. Ter medo só deixa ele mais confiante a continuar fazendo essas merdas. Então vamos até lá. Você vai falar tudo que tiver pra falar e vou estar do seu lado.

—Você não está chateado comigo? —Indaguei, com minha voz saindo mais baixa do que eu pretendia. A dor no meu peito me deixando quase sem ar quando ele se afastou para encarar meu rosto, deixando um beijo na minha testa.

—Como eu poderia ficar chateado com você, jujuba? Você é a maior vítima disso tudo. Consigo ver o quanto você está se segurando pra não desabar. Mas pode fazer se quiser. Você está no seu direito de se sentir assim. —Felipe encostou a testa na minha, antes de beijar a ponta do meu nariz, fazendo meu coração acelerar. —Quero minha Júlia confiante e esquentada de volta. Então vamos parar de segredos, o que acha? Vamos ser sinceros um com o outro. Precisamos disso se quisermos dar certo.

—Você tem razão. Temos que ser sinceros. —Falei, sentindo uma eletricidade varrer meu corpo quando toquei o rosto dele, sentindo meu coração prestes a explodir. —Uma verdade não dita, Felipe. Estou apaixonada por você e estava com medo de sentir isso. Mas quando percebi, já era tarde demais. É impossível não se apaixonar por você.


Continua...

Todas as verdades não ditas / Vol. 2Onde as histórias ganham vida. Descobre agora