Capítulo 25: Algum problema por aqui?

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Minha tarde no mercado foi a coisa mais entediante possível. Hoje parecia que todo mundo havia acordado com o pé esquerdo, porque a maioria das pessoas que eu atendia no caixa, me olhavam de cara feia quando eu dava boa tarde e perguntava alguma coisa. Não que eu estivesse trabalhando explodindo fogos de artifício, mas eu tentava ser pelo menos simpática com as pessoas, mesmo nos meus dias ruins.

—Que dia de merda. —Resmunguei, abrindo um sorriso logo em seguida, quando uma senhora entrou no meu caixa com o carrinho cheio. Ela me lançou um olhar demorado, me fazendo encolher os olhos e me concentrar no trabalho.

Manu passava algumas vezes por ali, deslizando com os patins enquanto ajudava algumas pessoas e em outros momentos quando estava empurrando o carrinho para colocar mais mantimentos nas prateleiras. Pelo menos ela trabalhava andando de patins, que era algo que ela gostava pra caramba. Por isso quero me formar e trabalhar em algo que me deixe ainda mais mergulhada na história.

—Tenha um ótimo dia. —Falei, para a senhora quando ela passou o cartão e terminou de pagar, sentindo uma frustração imensa quando a mulher não me mandou sequer ir a merda quando virou as costas e foi embora. Me virei para o próximo cliente, voltando a sorrir, porque as vezes um pouco de simpatia poderia mudar o dia de alguém. —Boa tarde!

Meu sorriso morreu, enquanto Thiago tombava a cabeça de lado e seu rosto se iluminava como uma árvore de Natal ao me ver. Tinha certeza de que ele havia me visto ali antes e escolheu meu caixa de propósito, já que haviam outros caixas livres atrás de mim. Era como se eu estivesse entrando em um pesadelo, quanto mais eu tentava acordar, mais eu afundava nessa parte ruim da minha vida.

—Então você trabalha aqui. —Murmurou, como se esse fosse um fato bastante interessante. Comecei a passar as compras dele rapidamente. A maioria era cerveja, mas ele ainda estava comprando outras coisas saldáveis, o que me deixou curiosa pra saber se ele morava sozinho ou dividia o apartamento com alguém. —Estava mesmo me perguntando quando nós dois íamos nos encontrar de novo. Você saiu correndo aquele dia, por causa da sua amiga.

Eu o ignorei, enfiando a simpatia que dava aos outros no buraco, porque Thiago não merecia um pingo de nada vindo de mim. Tentei passar as compras dele o mais rápido que conseguia, enfiando na sacola, me dando conta que minhas mãos estavam tremendo, enquanto meu coração estava entalado na minha garganta. Não era uma sensação boa. Na verdade, era a pior de todas.

—Qual é, Julinha, não faz assim. —Thiago insistiu, tentando alcançar minha mão por cima do caixa, mas eu a afastei na mesma hora, clicando agressivamente nos botões do teclado, enquanto encarava a tela.

—Deu 67,36. Qual a forma de pagamento? —Indaguei, olhando pro rosto de Thiago quando ele respirou fundo e puxou o dinheiro, parecendo se controlar internamente. Se havia algo que eu sabia muito bem sobre Thiago, é que ele odiava ser ignorado acima de qualquer outra coisa.

—Eu sinto sua falta. —Afirmou, enquanto eu pegava o dinheiro da mão dele e cravava meus dentes na minha língua até sair sangue, pegando o troco apressadamente. —De verdade, sinto mesmo.

—Sente falta do que, exatamente, Thiago? —Olhei pra ele com meu corpo inteiro rígido. Minhas mãos tão geladas que parecia que eu estava sendo congelada de dentro pra fora. —De gritar comigo toda vez que ficava com ciúmes? De me bater toda vez que alguma merda acontecia na sua vida?

—Eu sei que eu fiz merda. Mas eu sinto muito. —Afirmou, me arrancando uma risada debochada quando puxei o troco e estendi pra ele. —Eu não sou mais assim, Júlia.

—Pelo bem da sua futura namorada, eu realmente espero que não seja mesmo. —Balancei o troco na frente dele, porque Thiago ficou me olhando, sem fazer menção de pega-lo. —Porque ninguém merece passar pelo tipo de coisa que você me fez passar e eu não estou interessada em tirar a prova, pra saber se você mudou ou não.

Ele finalmente pegou o dinheiro e eu suspirei aliviada, pensando que ele iria finalmente sair da minha frente. Mas Thiago segurou meu braço antes que eu o puxasse, fazendo meu coração afundar e meu estômago se revirar quando senti o calor dos seus dedos ao redor do meu pulso. A lembrança desagradável me deixando ofegante e trêmula.

—Já faz tanto tempo, Júlia. A gente podia tentar de novo. Estou falando sério quando digo que sinto sua falta. —Insistiu, enquanto eu sentia um nó se formar na minha garganta, olhando pra qualquer lugar menos pra ele.

—Me solte! —Sibilei, tentando puxar meu braço, sentindo-o firmar o aperto cada vez mais, quando não respondi do jeito que ele queria. —Eu estou trabalhando e você está me atrapalhando. Por favor, me solte e vá embora!

—Então venha se encontrar comigo pra gente conversar. —Pediu, enquanto eu sentia que as pessoas pelo mercado estavam começando a notar a situação ali. —Podemos nos resolver, Júlia.

—Eu não tenho nada pra conversar com você. —Retruquei, agarrando a mão dele e tentando tirá-la do meu pulso. —Agora me solte, Thiago!

—Júlia...

—Algum problema por aqui? —Diogo apareceu atrás de mim, lançando um olhar duro para Thiago quando o viu segurando meu braço.

—A gente só estava conversando. —Thiago abriu um sorriso, finalmente me soltando. Escondi meus braços embaixo do caixa, esfregando meu pulso onde ele havia segurado. —Não é, Júlia?

—Se já terminou a sua compra, eu gostaria de pedir que se retirasse. —Diogo indicou a saída do mercado atrás de Thiago, fazendo-o contrair a mandíbula em frustração, como se não soubesse se ia ou se resolvia insistir.

Observei ele se dar por derrotado, pegando as sacolas de compras e saindo dali. Soltei um suspiro pesado, escorando minha cabeça no peito de Diogo quando Thiago já estava fora de vista. Senti o braço dele passando ao redor dos meus ombros, enquanto as pessoas voltavam a circular pelo mercado.

—Tudo bem? Ele te machucou? —Diogo indagou, soando tão preocupado que meu coração até se apertou dentro do peito, porque ele não fazia ideia de quem era o Thiago.

—Não, eu estou bem. —Afirmei, dando uma batidinha na mão dele que estava no meu ombro, antes de me ajeitar na cadeira. —Era só um cliente chato. Sabe como é.

Diogo balançou a cabeça negativamente, se afastando enquanto me olhava pensativo. Voltei ao trabalho, sentindo que precisava muito falar com Léo assim que chegasse me casa.


Continua...

Todas as verdades não ditas / Vol. 2Where stories live. Discover now