Capítulo 35: Foi uma situação de merda.

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Soltei uma respiração pesada, apertando a mão de Felipe de volta, querendo que ele entendesse que não havia feito nada de errado. Ele não era culpado por nada do que estava acontecendo, além dos próprios policiais e essa mania ridícula e preconceituosa de deixar a cor de alguém falar mais alto do que seu caráter.

—Olha, ele não está me incomodando. Não sei que denuncia é essa que fizeram, mas estávamos no bar juntos nos divertindo. —Afirmei, me virando para o policial de novo, enquanto me aproximava de Felipe até minhas costas tocarem seu peito, trazendo sua mão até minha cintura. —Estávamos indo pra casa agora, porque moramos no mesmo prédio. Está tudo bem aqui. Nenhum de nós dois está bêbado ou fazendo qualquer coisa errada.

—Você tem certeza? —O outro policial insistiu, me fazendo morder a língua com força a ponto de sair sangue, porque a vontade de soltar um palavrão e xinga-los era tão grande. Mas Felipe estava apertando a minha cintura, ainda completamente rígido atrás de mim.

—Sim, eu tenho certeza disso. A gente se conhece a um tempão. Está tudo bem aqui. —Falei, abrindo um sorriso forçado para os dois. —Podemos ir? Já está ficando um pouco tarde.

—Querem uma carona pra casa? —Questionou, me fazendo soltar uma respiração pesada quando finalmente devolveu a identidade de Felipe, que ele pegou com um movimento firme, antes de enfia-la no bolso.

—A gente mora a duas quadras daqui. Não precisa, mas obrigada. —Falei, me afastando de Felipe e segurando sua mão, antes de o puxar para sairmos dali. —Tenham uma ótima noite.

Felipe não abriu a boca para dizer mais nada quando começamos a caminhar de volta, na direção do nosso prédio. Eu sentia a tensão exalando dele, enquanto os policiais entravam no carro e ficavam parados lá, provavelmente seguindo nós dois com os olhos. Aquilo me deixava com tanta raiva, principalmente pelo fato de que Felipe sequer tentou se defender, como se realmente já estivesse acostumado com isso.

Quando já estávamos longe o suficiente, passei meu braço ao redor da sua cintura e encostei minha cabeça no seu ombro. Felipe soltou um suspiro pesado e cansado, antes de passar o braço ao redor do meu ombro. Aquilo me deixou um pouco mais feliz, apesar de eu sentir que ele não estava nenhum pouco animado, perto de como parecia quando saímos do bar, antes daqueles policiais estragarem
tudo.

[...]

Puxei a chave do meu apartamento, vendo Felipe parar e olhar pra porta do apartamento dele, como se não soubesse bem o que fazer. Tínhamos vindo o caminho todo em silêncio, o que em deixou um pouco inquieta, porque Felipe não era do tipo que ficava quieto. Ele era do tipo que fazia muito barulho e eu já estava acostumada com isso.

—Acho melhor ir pro meu apartamento. —Felipe murmurou, assim que abri a porta, me observando um pouco sem jeito. —Preciso de um banho e de roupas limpas.

—Pega suas coisas e vem pra cá então. —Me aproximei dele, o abraçando pelos ombros, enquanto abria um sorriso enorme. —Pode usar o meu banheiro. O convite de dormir aqui ainda está de pé.

—Tem certeza? —Questionou, soando um pouco em dúvida e hesitante, como se sentisse que estava me incomodando naquele momento.

—Tenho certeza absoluta. Pega suas coisas e volta pra cá. Vou ficar te esperando. —Afirmei, me inclinando para dar um selinho nele, antes de me afastar e entrar no apartamento.

Felipe ficou parado no corredor por um momento, como se não soubesse o que fazer, antes de assentir e ir na direção do próprio apartamento. Me escorei na porta aberta, erguendo a mão para esfregar meu  rosto, sem acreditar no que havia acontecido quando saímos do bar. Parecia uma coisa irreal demais, só que aconteceu e tenho certeza que Felipe está agindo assim por se sentir constrangido, por eu ter presenciado isso.

Felipe voltou uns minutos depois, trazendo uma mochila sobre o ombro. Abri um sorriso pra ele, vendo-o sorrir de volta, mas um sorriso que não chegava até os olhos. Tranquei a porta e o puxei até meu quarto, vendo que o apartamento estava silencioso e a luz do quarto de Manu estava apagada, então talvez ela e Bernardo ja estavam dormindo, já que sairiam cedo pra ir pra casa dos pais dele.

—Fique a vontade. —Falei para Felipe quando ele entrou no meu quarto. Ainda haviam vasos de flores por todo lado, de quando ele fez a surpresa pra mim. Estava tentando cuidar delas da melhor forma possível, apesar de esquecer algumas vezes de molha-las.

Felipe observou meu quarto, parecendo curioso com algumas coisas. Ele já havia estado ali, mas não tinha certeza se havia aproveitado o dia da surpresa para xeretar nas minhas coisas também. Vi quando ele parou na frente da minha grade de fotos na parede, encarando fixamente a que eu estava com meus pais e meu irmão.

—Seus cabelos eram pretos também, antes de você descolorir? —Indagou, se virando para olhar pra mim. Me joguei na cama, balançando a cabeça que sim. —Não consigo imaginar isso. Soa estranho. Seu cabelo de agora combina muito com você.

—Eu concordo 100% com você. —Afirmei, arrancando o primeiro sorriso verdadeiro de Felipe desde o infeliz incidente. Ele me observou na cama, enquanto apertava a alça da mochila no seu ombro, um pouco sem jeito.

—Posso usar o banheiro? —Indagou, mas eu tinha a leve sensação de que não era aquilo que ele verdadeiramente queria me falar.

Assenti com a cabeça, o observando sair do quarto e entrar no banheiro. Fiquei encarando o teto, com uma sensação desconfortável na boca do meu estômago. Não era bem daquele jeito que eu esperava que aquela noite terminasse. E não era daquele jeito que eu queria ficar com Felipe. Não o queria desconfortável perto de mim, por algo que nem era culpa dele.

Me levantei da cama e sai do quarto, batendo na porta do banheiro. Não demorou um segundo para Felipe a abrir. Ele me encarou confuso, antes de eu o empurrar para trás e entrar no banheiro, fechando a porta atrás de mim e a trancando. O chuveiro estava ligado, o que me dava certeza de que Felipe iria tomar banho, mesmo que ainda estivesse vestido.

—Júlia? —Felipe ergueu as sobrancelhas, me observando com uma expressão confusa.

—Não quero que fique se sentindo mal por algo que não é culpa sua, Felipe. Não quero que fique desconfortável perto de mim. Eu sinto muito pelo que aconteceu. —Afirmei, me aproximando e envolvendo as bochechas dele com as minhas mãos, vendo-o soltar o ar com força. —Você não fez nada de errado. Quem estava errado naquela situação eram os policiais.

—Foi uma situação de merda, Júlia. Não queria que você precisasse passar por isso, só por estar comigo. —Rebateu, erguendo as mãos para tocar as minhas, que permaneciam no seu rosto.

—Quem não deveria passar por isso é você, Felipe. Não deveria estar preocupado comigo. —Passei o polegar na bochecha dele, observando-o fechar os olhos e apenas apreciar meu toque. —Eu fiquei irritada e se pudesse daria um soco na cara daqueles dois policiais. —Felipe soltou uma risada, antes de me puxar, afundando o rosto na curva do meu pescoço ao me abraçar. —Eu não tenho problema nenhum em estar com você, Felipe.

Me afastei dele, antes de juntar nossos lábios e o beijar, querendo que ele entendesse que estava tudo bem. Querendo que ele voltasse a ser o Felipe de sempre comigo. Felipe me beijou de volta, abraçando minha cintura e me apertando como se quisesse fundir nossos corpos.

—Você é absurdamente lindo, sabia? —Falei, entre beijos, vendo-o negar com a cabeça e sorrir.

Sai de perto de Felipe, observando seus olhos me seguirem quando passei por ele e comecei a tirar as roupas, antes de entrar embaixo da água do chuveiro. Felipe parecia nem mesmo estar respirando ao me ver fazer isso, quando o olhei por cima do ombro, abrindo um sorrisinho inocente.

—Você pretende ficar parado aí ou vai entrar aqui comigo? —Questionei, soltando uma risada quando Felipe se apressou em tirar as roupas, tropeçando ao entrar no chuveiro junto comigo.


Continua...

Todas as verdades não ditas / Vol. 2Där berättelser lever. Upptäck nu