Capítulo 42: Quem é você?

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Não havia nada pior do que um treino ruim. Ver meus colegas de time errando e se estressando no meio do jogo era muito frustrante. Parecia que todos tinham tirado aquele dia para ser o pior de todos. Ninguém conseguia se concentrar e fazer um passe direito. Perdi as contas de quantas vezes gritei com alguns deles, até que eu mesmo estivesse sem paciência.

—Ah, já chega, galera! —Exclamei, pegando a bola quando ela veio parar nos meus pés, sentindo vontade de fura-la tamanha a frustração. —Não sei o que está havendo com todo mundo hoje, mas é melhor pararmos o treino por aqui. Coloquem a cabeça no lugar até o próximo dia, por favor.

Todo mundo começou a se afastar para pegar suas coisas. Bernardo correu até onde Manu estava, sentada na grama ao lado do campo. Ver que ela estava ali assistindo o treino por conta dele me fez sentir um pouco de inveja, porque mandei mensagem para Júlia e ela me disse que estava ocupada. Queria ter a sorte de Bernardo, porque tudo entre ele e Manu parecia perfeito.

Peguei minha mochila e segui para o vestiário, me sentindo tão cansado, que só queria voltar pra casa e esquecer do mundo. Queria parar de pensar em Júlia só por algumas horas, mas ela havia entrado dentro da minha cabeça e nada parecia tirá-la de lá. Júlia era uma força da natureza, muito difícil de não ser notada, além de deixar uma marca forte por onde passa. Ela marcou meu coração e agora estou com medo que o parta por conta disso.

Lavei o rosto no vestiário, checando as mensagens para ter certeza de que ela não tinha mandado mensagem. Mas não havia absolutamente nada. Suspirei frustado, erguendo as mãos para esfregar meu rosto, murmurando um tchau para meus colegas de time quando eles foram saindo do vestiário. Sabia que Bernardo e Manu deveriam estar me esperando, então não me demorei a jogar a mochila nas costas e sair do vestiário também.

—Desculpa. —Murmurei quando esbarrei em alguém na saída, quase derrubando minhas mochila no chão. A pessoa riu, me fazendo olhar pra trás, percebendo que o cara tinha parado na entrada do vestiário e estava olhando pra mim. —Tudo bem? Eu conheço você?

—Ah, não, não. Você não me conhece. —O sorriso dele era grande demais, para soar esquisito. Fiz uma careta, me preparando para sair dali, porque a última coisa que eu queria era arrumar confusão com um estranho. Me virei para a saída do corredor, ajeitando a mochila no ombro. —Você é o novo namorado da Júlia, não é? Vi vocês dois juntos no bar, na sexta.

Parei de andar, ficando um pouco rígido, porque olhei para trás e o encontrei ainda sorrindo, como se nós dois fôssemos melhores amigos. Não me lembrava de já tê-lo visto alguma vez pela universidade.

—Não estamos namorando ainda. —Afirmei, soando um tanto incomodado com a presença dele, por que foi difícil evitar, ele não emitia uma sensação muito boa.

—Ainda. —Ele repetiu, umedecendo os lábios com a língua, soltando uma risadinha que soava como se eu estivesse contando uma piada. —Júlia é um pouco difícil, né? Mas com o tempo você consegue ir amansando ela.

—Perdão, quem é você? —Questionei, não gostando da forma que ele estava falando sobre ela. O cara riu, erguendo a mão para arrumar os cabelos, como se não quisesse deixar um único fio fora do lugar.

—Thiago, é um prazer. —Ele acenou com a cabeça pra mim, como se fosse muito educado. Mas havia um alerta na minha cabeça pela forma que ele agia. Casual e tranquilo demais, enquanto as palavras soavam tão premeditadas e sarcásticas. —Ex namorado da Júlia.

Meu estômago afundou em puro gelo, trazendo um gosto ácido pra minha língua. A sensação era de estar misturando dois elementos químicos dentro de mim, transformando-os em uma bomba atômica. Sabia que ela tinha namorado antes, mas não sabia que ele estudava aqui também. E, principalmente, não esperava o encontrar.

—Você parece surpreso. —Thiago comentou, enquanto eu me lembrava das coisas que Júlia disse sobre ele. Foram muito, muito poucas, mas eram o suficiente para não vê-lo com bons olhos. —Ela falou de mim pra você?

—Na verdade, não. —Menti, vendo um pouco daquela máscara quase desmoronar. Mas foi rápido, porque logo ele estava sorrindo ainda mais, como se não acreditasse no que eu estava dizendo. Como se fosse impossível Júlia não falar sobre ele. —Não costumamos falar sobre ex namorados, quando estamos tentando ter alguma coisa nova. Acho que entende isso.

—E Júlia quer ter algo novo? —Ele ergueu uma das sobrancelhas com um tom cético, me olhando de cima a baixo, antes de torcer o nariz como se eu não fosse bom o suficiente pra ela.

—O que você quer? —Indaguei, perdendo um pouco da calma que estava tentando manter, porque se ele estava tentando me irritar, estava conseguindo. Meu sangue estava fervendo por saber quem ele era e principalmente por ele me olhar daquela forma.

—Nada, cara. Por que eu iria querer alguma coisa? —Ele soltou uma risada, erguendo as mãos pra cima como se fosse o inocente ali, com a expressão iluminada como uma árvore de natal.

Dei um passo para trás, me perguntando se toda minha frustração do dia estava afetando minha forma de ver as coisas. Se eu estava transformando aquela conversa sem sentindo em algo maior do que era. Mas o sorriso no rosto dele era como se ele estivesse me testado, e eu não gostava nem um pouco disso.

Não falei mais nada, apenas virei as costas e sai dali, repassando aquela conversa na minha cabeça para entender o que quer que fosse. Comecei a pensar na forma que Júlia estava agindo, me perguntando se Thiago era o motivo dela estar estranha. Ele estava ali por coincidência ou propositalmente?

Parei no meio do campo, soltando um grunhido de irritação quando percebi que Bernardo e Manu tinham ido embora sem mim. Parecia que o mundo tinha se virado contra mim, jogando várias merdas sobre a minha cabeça em um único dia. Fui andando para casa no final das contas, porque precisava esfriar a cabeça, ou ia acabar fazendo merda.



Continua...

Todas as verdades não ditas / Vol. 2Where stories live. Discover now