CAPÍTULO 49

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XXX

Mia

Minha vontade era de sumir da face da Terra.

Para mim não existia mais sentido em estar aqui. Por um bom tempo, está parecendo que finalmente fui notada. E acho que isso é uma coisa boa. Depois do Massacre de Recanto Feliz ganhar os holofotes, muitas pessoas, a maioria de quem nunca conheci na vida, vieram se solidarizar comigo. E isso foi bom. Muito bom.

Até mesmo as pessoas que estão do meu lado parecem se importar comigo agora, vindo à tona na hora que mais precisava de um ombro amigo. Se sentir acolhida deixou meu coração mais leve de certa forma, deixando os estragos deixados pelo passado mais brandos.

Antes, eu precisava ir ver meu reflexo no espelho do banheiro para poder deixar toda a tristeza de se sentir um lixo sair através dos meus olhos. Agora, estou me observando e vendo uma nova garota na minha frente que até recentemente não tinha visto ela antes.

A garota que está se refletindo sempre esteve ali comigo, mas eu estava afogada nas minhas próprias angústias para poder conseguir ver ela dentro de mim. Ela continua sendo a mesma Mia de cinco meses atrás, aquela jovem magrela de cabelos azulados que estampou as notícias ao redor de todo o país, mas com a diferença de ter uma bagagem emocional um pouco mais madura no final das contas.

Meu nariz está inteiro desta vez, deixando minhas sardinhas e espinhas entrarem em uma eterna guerra de espaço em minhas bochechas. Meu cabelo está mais comprido agora e deixei a tinta azulada de lado, deixando minhas mechas escuras deslizarem preguiçosamente até os ombros.

E por falar em ombros, o meu até que está bom. Não consigo mais erguer coisas pesadas e não ter a mesma flexibilidade de antes, mas já é um avanço poder usá-lo sem sentir nenhum tipo de dor. Digo o mesmo para os meus outros machucados que agora se resumem a cicatrizes discretas sobre minha pele.

— Então é isso. – resmunguei.

Os olhos castanhos no espelho me fitavam de volta, esperando o choro vir como todas as outras vezes que vieram nos últimos tempos. O reflexo aguardava as lágrimas serem derramadas, mas devo admitir que ele deve ter ficado desapontado quando elas não vieram.

Fiz um leve e demorado carinho no colar que estava pendendo em meu pescoço. Era uma fênix dourada, dada pelo Velho John assim que ele me visitou no hospital após toda a loucura ter terminado. Confesso que nunca fui uma fã de simbolismos e essas coisas relacionadas a superação, mas esse colar se mantém em meu pescoço desde do dia que ele me entregou.

Já faz cinco meses. Cinco meses desde o Massacre de Recanto Feliz.

Respirei fundo, dando as costas a Mia do espelho. Peguei minha mochila apoiada em um canto do meu quarto vazio. Toda a mobília já está indo ao novo endereço do meu novo lar e isso é bom de se pensar.

Meus dedos rasparam pelo papel de parede descascado e velho que me viu crescer nesses últimos 17 anos. Tantas histórias se passaram aqui, tantas risadas, choros e alegrias. Irei sentir saudades do meu cantinho.

— Mia!

Era o Velho John anunciando que a hora da partida estava na hora com a sua voz potente chegando em mim mesmo ele estando do lado de fora da casa. Fiquei um pouco contente em ele perceber que eu estava demorando até que demais para pegar o carregador do meu celular aqui em cima.

— Já vai.

Comecei a sair daquele quarto. Tudo que eu olhava tinha lembranças, era quase que inevitável não ser puxada para o passado, para aquela noite no acampamento e descobrir tantas atrocidades sendo cometidas. James querendo me matar, Grace mostrando seu lado mesquinho, Leslie mostrando sua coragem, Carly tentando se manter sã e Carter... ah, o Carter... mostrando que gostava de mim.

Anoitecer SangrentoOnde histórias criam vida. Descubra agora