05 - Desespero e calmaria

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- Síndrome do herói de novo, Toni? Você tem que enfiar nessa sua cabeça que você não é nenhum merda de herói! Não está aqui pra ficar se preocupando com o problema dos outros, está aqui para não morrer!

- Pra não morrer?

- É, Irene, pra não morrer. Ele tem uma doença degenerativa, vai morrer em pouco tempo. E francamente, você não está ajudando!

Ficou espantada com o conhecimento. Toni, se sentindo péssimo, voltou-se para ela.

- Estou perdendo o movimento dos membros pouco a pouco. Não é algo que me agrada. Acho que é por isso que eu acabo fazendo coisas sem pensar. Prefiro morrer de uma vez a ficar definhando.

O sonoro ruído de um tapa se fez presente na noite silenciosa.

- Ren...

- Eu detesto quando você começa com essa conversinha... Se começar com isso, vai tomar outro tabefe! Ainda há esperança!

- Olha, eu acho que vocês estão muito nervosos... Qual tal irem descansar um pouco?

Toni concordou com a mulher e enfim notou que a perna mágica não estava onde deveria. Concentrou sua energia. Nada. Não conseguia conjurá-la.

- R-Ren... Não estou conseguindo manifestar a perna. Pode me ajudar? Estou sentindo meus braços dormentes também.

Sem uma palavra, Ren passou o braço do irmão pelo pescoço, servindo de apoio para ele. Mancando, o escoltou até o quarto, deitando-o na cama. Ele apagou imediatamente. Ela o cobriu com uma manta leve, desligando o lampião em seguida. Fechou a porta e voltou à proa do navio. Irene ainda esperava lá.

- Precisamos conversar, Dragoa das Águas.

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O povo de Rio Contrário era pacato e hospitaleiro, apesar de isolado. Ficava a sudoeste de Kailotron, num local aprazível. A região era acidentada, com muitos vales e depressões, mas Rio Contrário encontrava-se numa planície relativamente grande. Era cortada por três rios paralelos dos quais dois fluíam para o leste. O terceiro rio, o do meio, corria para oeste. Daí vinha o nome da pequena vila. A população era heterogênea, uma mistura de raças. As pessoas que não encontravam ou não se ajustavam aos padrões de seus respectivos povos, geralmente eram muito bem recebidas em Rio Contrário, que prezava pela diversidade. Eram da opinião de que a mistura de raças só tinha a enriquecer e fortalecer os povos originais.

Apesar do dia ensolarado e sem nuvens, flocos de neve caíam suavemente por toda a vila. Pequenos e finamente elaborados, derretiam imediatamente ao tocar o solo morno. Os moradores se regozijaram diante do estranho fenômeno. Correram às ruas, gritando, saudando, abrindo os braços freneticamente para receber a benção dos flocos. Porque aquilo significava apenas uma coisa: que a Dragoa, sua patrona, havia finalmente retornado.

Uma estranha nau voadora se aproximava da cidade, e todos souberam que lá estava sua líder.

- Precisa mesmo dessa demonstração inútil do seu poder?

- Eu gosto de saudar o meu povo, Ira dos Sons. E, nesse caso específico, também é necessário pra que eles não botem o navio de vocês abaixo pensando tratar-se de um ataque.

- Eles seriam capazes disso? - Perguntou uma Ren um tanto desconcertada.

- Bem, sim. Embarcações que voam não são muito comuns, não é?

Ren limitou-se a responder com silêncio. Estava seguindo a sugestão de Irene muito a contragosto. Durante a noite a discussão de ambas havia sido longa.

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