DEZESSETE

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• Olívia Shelby •

O ar voltou aos meus pulmões, nem percebi que tinha prendido a respiração, afinal... Eu vou me casar.

Me aconcheguei na cadeira e assenti para o meu pai que logo se levantou, deixando meu irmão e eu na mesa de jantar, ambos desesperados demais para sequer falar alguma coisa.

Nunca pensei em me casar, nunca perguntei a mim mesma se acreditava em amor ou se queria isso para minha vida, mas de qualquer forma, esse tipo de questionamento não seria de muita utilidade.

Estou me casando por interesse político e econômico e não por amor.

— Eu sinto muito. — Charles disse finalmente, buscando minha atenção com um apelo silencioso para que o olhasse nos olhos.

— Não sinta, isso faz toda a situação parecer mais patética. — Respondi, não estava com paciência para pena.

Ele respirou fundo e permaneceu ali comigo, em silêncio, respeitando o luto pela minha vida recém decidida. Sinto que vou cair, sinto que a cadeira na qual estou sentada desapareceu e que estou em uma queda livre infinita.

Casamento... Que grande ironia do destino.

Não sei exatamente quanto tempo ficamos ali, lamentando, mas decidi que já estava na hora de reagir.

— Tenho que fazer uma ligação. — Comentei enquanto levantava, ele abriu a boca para falar algo mas então fechou e não disse nada.

O deixei sozinho e segui para o telefone mais próximo.

Disquei o número comum e esperei.

— Para onde deseja telefonar? — A voz de alguém perguntou, com um timbre eletrônico.

— Londres, Cassino Smith na Mayfair, Mount Street. — Respondi.

Escutei dois bipes e minhas mãos voltaram a tremer um pouco.

— Alô? — Uma voz feminina disse.

— Procuro falar com o senhor Smith. — Aleguei.

— Sinto muito, senhora, ele viajou para resolver algumas questões. — Ela falava enquanto digitava, era possível escutar as teclas da máquina de escrever. — Quer que eu passe algum recado?

— Sim. — Respirei fundo. — Diga que Olívia Shelby precisa falar com ele, urgentemente.

— Senhorita Shelby?! — Ela perguntou espantada.

— Sim. — Respondi com o cenho franzido.

Ela ficou uns segundos em silêncio, talvez processando a informação.

— Vou passar o recado a ele o quanto antes, ele com certeza vai retornar a ligação daqui a algumas horas. — Ela comentou. — Talvez em alguns minutos. — Sussurrou, mas eu escutei.

— Certo, obrigado.

Coloquei o telefone de volta e andei até o meu quarto.

O fantasma Shelby voltou, mas logo se tornaria fantasma Smith.

Olívia Smith... Soa terrivelmente incerto, eu odiei. Odeio tudo que envolva ele, aquele sorriso presunçoso e cabelo bagunçado.

Farei de tudo para arrancar aquele sorriso da cara dele, se eu pudesse pelo menos cortar fora sua língua com uma navalha, como faziam os peaky blinders antes de todos virarem frouxos demais. Seria satisfatório não poder ouvir qualquer coisa que ele queira falar, talvez eu deva adicionar isso ao contrato de casamento: sem contato visual e troca de palavras.

Perambulei pelos corredores e passei em frente a sala de jantar, onde Charles ainda estava parado, só que agora tinha uma garrafa de whisky para fazer-lhe companhia. Não fiquei ali, ele estava um caco tanto quanto eu e não preciso de uma dose dupla de desgraça.

Abri a porta do meu quarto e me perguntei por quanto tempo ainda poderia chamá-lo de meu. Olhei em volta e estava um caos, garrafas vazias por toda parte, roupas jogadas no chão e muitos, muitos cigarros apagados.

Respirei fundo e comecei a recolher as roupas, uma por uma às jogando em um cesto que estava perto da porta. Nesse processo, encontrei duas sacolas brancas, provavelmente as mesma que trouxeram as garrafas até aqui, então resolvo usá-las para tirar.

Sim, eu limpo para desestressar.

Joguei todas as bitucas velhas de cigarro pela janela e lamentei silenciosamente pela natureza que se encontrava ali. Não é muito aconselhável.

O chão estava parcialmente limpo, manchas de vinho tinto aqui e ali, mas nada que uma boa lavagem não resolva. Arrumei a cama e então olhei para o quarto limpo.

Não me sinto melhor, nem um pouco, mas agora posso andar sem pisar em vidro ou tropeçar em roupas.

Ouvi batidas na porta e murmurei um "entre".

— Senhorita Shelby, tem uma ligação para você. — Uma das moças que trabalham na cama disse. — Parecia ser um homem no outro lado da linha.

Assenti com a cabeça e caminhei lentamente, mas de cabeça erguida, para a minha sentença.

Assim que cheguei ao telefone, respirei fundo e o levei até a orelha.

— Você sabe onde eu moro? — Perguntei sem emoção alguma.

Não é muito difícil, é perguntar por Thomas Shelby. — Disse ele, eu consegui imaginar o sorrisinho. — O que fez a senhorita me ligar tão tarde da noite?

— Eu faço. — Estou caindo de novo.

Faz o que, exatamente? — A voz grave ronronou. — Vamos, Olívia, eu preciso ouvir.

— Eu daria tantos tiros em você. — Trinquei os dentes e ele gargalhou do outro lado. — Eu me associarei com a família Smith, em particular com você, até que esteja entendido pelas duas família que houve um acerto de contas, ou até a morte, se necessário. — Sinto minhas pernas falharem. — Por meio do compromisso matrimonial.

Enrolou demais. — Alegou. — Poderia simplesmente ter dito que aceita casar comigo.

— Me recuso. — Respondi. — Até porque de certa forma não é verdade.

Você não sai por baixo, não é? —Zombou.

— Com meu inimigo? Nunca.
 
Isso é bom. — Parabenizou. — Me encontre amanhã para discutirmos o contrato de casamento, pode ser naquele pub que sua família tanto vai, o Garrison.

— Parece que fez o dever de casa.

Sou muito elogiado pelos professores.

— Caso contrário, vão acabar endividados até morte, ouvi dizer que os Smith são especialistas nisso. —Rebati.

Talvez eu me case com todos, mas não se preocupe, você ainda seria a favorita. — Debochou e quase vomitei.

— Eu definitivamente daria tiros em você. — Assumi.

Eu adoraria ver isso. — Ronronou. — Lembre-se, Garrison amanhã. Te vejo lá, querida.

Desliguei o telefone com força, eu conseguia imaginar perfeitamente o sorriso que deu ao dizer "querida".

Me casar com ele vai ser fácil, difícil  vai ser controlar a tentação diária de matá-lo

Boa sorte, Olívia Shelby, ou melhor... Smith.

Gêmeos Shelby | Peaky BlindersWhere stories live. Discover now