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Promessas, elas quebram antes de serem feitas— The Strokes, Someday

Victor

Quando volto à mesa, Julia já não se encontra mais. Apenas meu pai e minha mãe. Agora resolveram aparecer? Bem conveniente.

— Victor, você me envergonhou muito hoje! Como pôde deixar a menina sozinha? — Denise reclama em um tom acusatório.

Era só o que me faltava!

— Mãe, com todo o respeito, a senhora quem a convidou. Seria mais interessante que a acompanhasse e livrasse toda a solidão que proporcionei à pobre menina, não acha? — puxo uma cadeira e me sento.

— Você é uma peste! Nunca mais vou convidar nenhuma menina!

Quase ergo minhas mãos aos céus em agradecimento, mas é sempre assim. Tenho certeza de que na próxima semana outra candidata aparecerá.

— Seria um favor, na realidade. Mãe, escuta, eu não quero um relacionamento agora. Você será a primeira a saber quando eu mudar de ideia. Além disso, posso conseguir uma mulher sozinho — os empregados servem a sobremesa e eu agradeço.

Olho de relance para o meu pai, que só escuta a conversa. Sua cara plácida não revela nada. Como sempre.

— Denise, nosso filho deve se concentrar no trabalho para não cometer nenhum erro. Seria muito ruim pra nossa reputação, ele se envolver em algum escândalo — claro, ele está preocupado com a empresa. E com a minha incompetência.

Minha mãe franze as sobrancelhas e tem um olhar mortal.

— Josué, eu não criei um filho incapaz, muito pelo contrário, meu filhinho é a pessoa mais capacitada que conheço! Se formou com honra fora do país e sempre esteve em primeiro lugar. Além disso, os lucros da empresa foram extraordinários desde que assumiu à presidência! — com toda elegância que Denise Agostini tem, coloca o guardanapo em cima da mesa e cruza os braços.

Meu pai abre a boca para falar mais alguma de suas reclamações, entretanto, minha mãe ergue a mão em sua direção.

— Não ouse dizer sequer uma palavra! Tô cansada dessas alfinetadas suas! Mostre respeito por mim respeitando o meu filho — por fim, se levanta e sai da sala de jantar. Os sons de seus saltos parecem ser ampliados por conta do silêncio.

Não tenho o que dizer e nem quero falar nada. Meu pai pensa que sou uma criança de 10 anos, não um homem de 35 anos. Eu posso ter assumido à presidência, mas nunca tive privilégio por ser filho do dono.

Comecei como um simples estagiário e fui subindo de cargo com muito esforço. O meu jeito de conquistar aos funcionários foi mostrando serviço. Ouvir o que meu pai pensa sobre mim já se tornou cansativo.

Finjo receber uma mensagem e me coloco de pé.

— Preciso ir, pai. Tenha uma ótima tarde.

Ele não me responde, somente acena em reconhecimento.

Vou em direção à saída, passando pelo jardim com a grama recém cortada. Avisto minha mãe sentada sobre uma das espreguiçadeiras. Me aproximo e vejo que ainda está de mau humor, pois seus olhos estão perdidos no horizonte.

— Mãe, eu já vou — beijo sua testa.

Ela segura minha mão acariciando-a com o polegar.

— Victor, me prometa que não será um velho ranzinza como o seu pai — seu foco está em minha mão.

— Sou bonito demais pra ser ranzinza — brinco tentando mudar seu humor.

Funciona, pois ela abre um sorriso.

DeclínioWhere stories live. Discover now