Capítulo 5: Scaramouche, quer dançar fandango?

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Ignorei o elfo histérico bem a minha frente para cravar os meus olhos em uma das mais belas criaturas que já conheci. Ela tem irís amarelas como citrino, pele negra como o ébano, é coberta por tatuagens brancas dos pés a cabeça, possui longos cabelos trançados e, assim como Vênus e todos os outros, as suas orelhas são pontiagudas, tão afiadas quanto lâminas.

— Uma humana em meu palácio. Parece que a história tende sempre a se repetir. — Ela toma a palavra. Mesmo se não me falasse, eu saberia que à feérica aqui tudo pertence, já que está escrito em sua face o poder que possui. Ela não precisa de uma coroa para exibir toda a sua imponência, o seu simples olhar já basta. Estou na presença da própria Rainha. — Qual é a sua graça, minha querida? — ela estendeu a sua mão para mim e me pôs de pé facilmente, como se eu não pesasse nada — o que não é tão surpreendente, já que qualquer um consegue contar os ossos de minha costela sem qualquer dificuldade .

— Eu me chamo Aurora Jenkins, majestade. — Faço uma reverência que aprendi com Maya, a criada de minha antiga casa, porém tenho receio de que possa ter soado ridículo.

— O que é isso, menina? Não precisa de tamanha formalidade. Aqui todos nós somos iguais, somos filhos do mesmo sol. — Senti os meus cabelos serem afagados pelos seus dedos compridos e esguios. Vendo-a de perto, posso notar que ela é bem maior do que eu.

— Que coisa, eu esqueci de me apresentar a você! Eu sou Lilith Pendragon, rainha de Auryn, como você já deve ter percebido. E você é justamente quem eu queria encontrar: Aurora, a humana que curiosamente carrega o selo de Hécate. A filha de Eva, que possui a marca da própria deusa do limbo. — Para ser honesta, eu não entendi bulhufas do que ela disse sobre selo, Hécate, limbo. Então pus a minha melhor cara de paisagem, porque fiquei com temor de questioná-la.

— Não deve estar compreendendo, eu imagino. Deixe-me explicar melhor: há um pequeno selo em seu antebraço esquerdo, no entanto ele é invisível aos seus olhos, por conta de sua mortalidade, ela a limita. Esse selo na verdade pertence a Hécate, a deusa da morte e ocultismo. E é estranho o fato de ele ter sido adquirido por uma humana, já que vocês não deveriam nascer com os selos. — encarei Foster, na busca de alguém que pudesse me explicar melhor o que se passava, mas não adiantou de muito, ele estava bastante distraído com o vestido dourado que reluzia feito a armadura de um guerreiro da rainha.

— Eu quero que me conte tudo, do começo ao fim. — Lilith torna a falar, uma mão sob o queixo.

Eu acho que ela está sugerindo que eu exponha como consegui a coisa que, conforme ela diz, está marcada em minha pele.

Mas, como eu poderei contar se nada sei sobre isso? Devo inventar uma história para não correr o risco de a minha cabeça sair rolando por aí? Para ser modesta, eu sou até razoavelmente boa em inventar histórias, se for levar em consideração o sonho no qual eu mesma me meti.

— Bem, — limpei a garganta antes de contar sobre a minha pequena desaventura — me atirei da sacada de meu quarto e, ao invés de eu acabar parando no paraíso ou no próprio inferno, como todos supõem, eu vim parar aqui. No começo, pensei que tudo isso não passasse de uma mera ilusão, mas agora estou realmente começando a cogitar que não se trata disso. — acabei por decidir ser honesta.

Um silêncio nada acolhedor logo pairou no ar e eu tive a sensação de que estava falando a coisa errada. Todos os olhares estavam voltados para mim, eles nem sequer pareciam piscar. Era como ter exposto os meus segredos mais constrangedores em voz alta para estranhos.

— Hahahaha os humanos mentem como quem respira. Quem irá acreditar nessa menina? Virou defunto e então acabou surgindo aqui misteriosamente? Conte outra. — Vênus se intrometeu. Parece que ele sente a urgência em ser inconveniente. Ele é uma verdadeira mistura de mal com atraso e pitadas de psicopatia. Não sei o que aconteceu em seu passado, o que fez com que ele odiasse tanto assim a raça humana, mas não é justo odiar todas as rosas só porque uma o espetou.

No amanhã de alguémWhere stories live. Discover now