Imortal

By FlviaRolim

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[Vencedor do prêmio Wattys 2015 na cateogoria "Os Mais Populares"🎖️] ESTÁ SENDO REESCRITA E REVISADA. A his... More

Prólogo
Conhecendo o Desconhecido
Visita Noturna
Saltos no Vazio
Compromissos
Nada Mal Para Um Imortal
Rompendo Relações
Knockout
Fugindo das Lendas e Caindo na Realidade - Parte Um
Lago, Floresta e Culpa: Combinação Perfeita - Parte Um
Lago, Floresta e Culpa: Combinação Perfeita - Parte Dois
Xeque-Mate
Eu Escolho a Eternidade - Parte Um
Eu Escolho a Eternidade - Parte Dois
O Baile de Máscaras - Parte Um
O Baile de Máscaras - Parte Dois
O Baile de Máscaras - Parte Três
Fragmentos
Perdoe-me Por Dizer Adeus
Causa Mortis - Parte Um
Causa Mortis - Bônus
Causa Mortis - Parte Dois
O Outro Lado da Moeda
Emboscada - Parte Um
Emboscada - Parte Dois
Angustia Existencial
Dave Miller
Finalmente Pronta
Alguma Coisa no Caminho
Outro Amanhecer - Final
Epílogo
Amores Imortais
Prévia - Eterno
Eterno está no ar
Bônus - Christine
1 anooooooo!!!!!
Arthur e Victor (Bônus - Um ano de Wattpad)
Revelação da Capa
VERSÃO ANTIGA (RASCUNHO) X VERSÃO ATUAL (PRIMEIRA EDIÇÃO)

Fugindo das Lendas e Caindo na Realidade - Parte Dois

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By FlviaRolim

Acordei e estava deitada em um quarto do hospital. Em um dos meus dedos estava ligado um monitor cardíaco que apitava tranquilamente. Respirei fundo e olhei o quarto em volta, enquanto minhas vistas focalizavam o ambiente aos poucos. Quando finalmente consegui enxergar, dei de cara com Sean, sentado em uma das poltronas próximas da porta.

— Olá, minha senhora — cumprimentou ainda sério. Ele pouco sorria. — Como se sente?

— Um pouco cansada, mas estou bem — engoli com dificuldade. — O que houve?

— A senhora teve duas paradas cardíacas e por isso não recebeu oxigenação em seu cérebro. Os médicos fizeram os primeiros exames e decretaram morte encefálica — ele levantou-se e aproximou-se de mim. — Isso antes de lhe dar o meu sangue para beber.

— Minha família deve ter ficado louca — respondi sentando na cama. Senti uma tontura leve, mas estava bem.

— Eles não sabem que está aqui. Ninguém sabia quem era a senhora e por isso, não teve a quem avisar.

— Como não sabia? A minha ficha foi feita, na recepção.

— Não havia nenhum documento a seu respeito. Tive que preenchê-los quando cheguei.

— Onde está o William? — perguntei.

— O rapaz que a trouxe para cá? — Assenti. — Segundo a recepcionista, ele nem chegou a preencher nada, apenas te trouxe e desapareceu depois disso.

— Estranho! Ele levou todos os meus documentos, cartões do plano e tudo que me identificasse — respondi mais para mim do que para o vampiro ao meu lado. — Como você fez para pagar a internação?

— Não se preocupe com dinheiro, isso é o de menos — respondeu Sean sorrindo.

— Está bem — concordei me lembrando da quantidade de dinheiro que Victor entregou para o dono da pista de patinação. Como Sean disse, dinheiro para eles era o de menos. — Mas e você? Pensei que havia viajado com Victor?

— Não. Ele preferiu ir sozinho — respondeu Sean.

— E como você me achou?

— Victor me ligou, do avião. Solicitou que eu fosse até a casa do lago. Teve mau pressentimento. Ao chegar, percebi que você não estava e rastreei seu cheiro até aqui.

— Mas não precisa decorá-lo antes? — perguntei inocente.

— Uma vez em contato com o humano, o cheiro dele permanece guardado.

— Mas Victor teve que...

Ops! Acho que falei demais — Sean sorriu e corei violentamente. Não precisava Victor ter feito aquilo, ter se aproximado de meu pescoço daquela maneira. Ele fez de propósito. — Será nosso segredo.

— Pode deixar — respondi completamente sem graça. Encostei na cama outra vez e suspirei. — Então você me deu do seu sangue? Como conseguiu se aproximar para fazer isso?

— Um vampiro consegue ser bastante persuasivo quando quer — Sean me encarava com os olhos em um tom de azul tão vivo, que chegava a hipnotizar. — E também é meu dever cuidá-la.

— Então é isso! Mais vinte quatro horas sem morrer?

— A não ser que queria ser uma subespécie. Não são nada bonitos, pode ter certeza disso — ele aproximou-se da cadeira, em que estava sentado, e pegou o sobretudo preto. Vestindo-o em seguida. — Preciso ir agora. Enquanto Victor está fora, sou responsável pela mansão.

— Nada mais justo. Você foi o segundo a ser criado — ele sorriu e abaixou a cabeça.

— Provavelmente receberá alta médica em algumas horas. Se fosse a senhora, aproveitaria esse tempo para dormir um pouco. Victor me disse que chegará em mais quatro horas. O voo atrasou, por causa do mal tempo, precisou esperar. Disse que virá vê-la assim que chegar.

— Como ele vai conseguir desembarcar? Serão oito da manhã.

— Nós temos os nossos truques. Terei o prazer de falar a respeito em outro momento. Agora realmente preciso ir, o Sol já vai nascer — ele aproximou-se e depositou um beijo em minha mão — A vejo em outra oportunidade, senhora. Descanse — assenti. Antes mesmo que conseguisse piscar, ele havia desaparecido.

Me acomodei na cama e minha mente divagou. Comecei a pensar nas coisas que Christine me disse, sobre Frederico e sobre o filho deles. Os dois eram modificados. Victor falou que um filho de um humano e um vampiro pode nascer ou de uma espécie ou de outra. Azar da criança ter nascido um deles.

Os meus olhos começaram a pesar e antes que eu percebesse, adormeci. E como Christine prometeu, não sonhei nada relacionado a ela ou a Victor.

Quando acordei, o Sol já estava alto no céu e havia uma enfermeira ao meu lado, com um crachá escrito "Rochelly Phillips". Ela analisava a minha prancheta e alguns exames que fizeram depois que eu "voltei".

— Ainda é muito ruim? — perguntei e ela.

— Muito pelo contrário — respondeu parecendo completamente abismada. — Não há nada que nos diga a razão de seu coração ter parado e nenhuma sequela permaneceu em seu cérebro. É um milagre.

— Não acredito em milagres — pensei em voz alta. Seus olhos castanhos claros me encararam como se eu tivesse dito algo inadmissível. Decidi não tentar me explicar. — Que horas são? — mudei de assunto.

— São nove e vinte e dois da manhã — respondeu de olho no relógio. Agradeci e ela aproximou-se de uma mesinha, ao lado da minha cama, que dispunha uma bandeja de metal. Nela estavam uma seringa e um garrote, a borracha amarela que o enfermeiro amarra no braço do paciente, para conseguir pegar uma veia. — Vou precisar tirar uma última amostra de sangue, porque tivemos problemas com a amostra anterior.

— Que tipo de problema? Coagulou?

— Não — ela me encarou.

— Eu sou médica. Pode dizer.

— Na verdade, detectamos algo estranho. Pareciam células desconhecidas. Eram maiores e escuras. E o mais interessante, pareciam ter a mesma ação dos fibroblastos.

— Células responsáveis pela cicatrização — afirmei.

— Exatamente — respondeu ao mesmo tempo em que apanhou a seringa e o garrote. Aproximou-se de mim e eu gelei. Provavelmente, era a ação do sangue de Sean em mim. A enfermeira segurou em meu braço e então ficou imóvel, como se estivesse em uma espécie de torpor. Logo em seguida, afastou-se de modo brusco e derrubou a bandeja no chão. Caindo em seguida.

— Você está bem? — respondi levantando da cama, com alguma dificuldade, e me abaixando para ajudá-la a levantar.

— Sinto muito! Sinto muito mesmo.

— Não se preocupe, você não me machucou — respondi tentando levantá-la. Mas ela se soltava da minha mão toda vez que eu tentava apanhá-la.

— Sinto muito por você que está envolvida nisso — os olhos arregalados não desviavam de mim. Levantou-se, por fim, e se afastou o quanto antes. — Um demônio te cerca e isso irá tirar a sua vida. Fuja o mais rápido que você conseguir e não deixe que ninguém saiba. Deus é o único que pode te proteger. Ele tenha piedade de sua alma — disse correndo pela porta. Não sabia o que fazer. Sentei na cama, outra vez, e lá fiquei. Dez minutos depois, um enfermeiro entrou em meu quarto. Trazia em suas mãos, uma bandeja igual àquela que permanecia no chão.

— Desculpe por tudo isso — solicitou enquanto manipulava a seringa e o garrote. Aproximou-se de mim e segurou meu braço. Amarrou a borracha e me encarou. Tirou um tubo de dentro do bolso do jaleco, já cheio de sangue, e guardou o vazio que segurava nas mãos. O encarei finalmente entendendo do que se tratava.

— Vampiros como enfermeiros? — perguntei sussurrando e ele sorriu.

— É uma profissão honrada e podemos esconder algumas coisas que, aos olhos da ciência, parece ser impossível — o homem tirou o garrote de meu braço e mandou que segurasse o algodão, como se ele tivesse realmente tirado meu sangue. Quando estava pronta para perguntar o porquê daquela encenação, reparei no médico olhando pela janela. Ele colocou o frasco com o sangue na bandeja e etiquetou com meu nome. Tirou um adesivo redondo de uma cartela e voltou a aproximar-se de mim.

— Você ouviu o que aquela mulher disse, não ouviu? — perguntei e ele novamente me encarou.

— Não ligue para o que ela falou — observei a sua unha crescer e tornar-se pontuda, antes que ele pudesse espetá-la contra a minha pele e fazer um pequeno furo e melar o algodão nele. Autenticidade. Depois colocou o adesivo em cima. — Alguns humanos são sensíveis ao sobrenatural e se julgam no direito de tirar suas próprias conclusões disso.

— Qual o seu nome?

— Andrei — respondeu e seus olhos tornaram-se completamente negros. A minha respiração ficou ofegante, queria gritar, mas não conseguia. — Não se preocupe, não lhe farei mal algum. Seria no mínimo estranho.

— Andrei... Você é o filho de Christine? — perguntei como se estivesse sonhando. O pânico não me deixava raciocinar muito bem.

— Sim, sou — me respondeu de modo sério. — Não sou como os outros, Alice. Estou ao seu lado. É o mínimo que posso fazer — completou com um suspiro profundo. — Prometi para minha mãe que a protegeria e falhei. Não vou cometer o mesmo erro duas vezes.

— Você era uma criança, não poderia protegê-la — respondi me acalmando e ele sorriu sem vontade.

— Isso não é uma desculpa — os olhos negros tornaram-se azuis e me esquadrinhavam de uma forma quase robótica. — Tinha uma obrigação com ela e agora é com você. Nem que precise ir contra o meu próprio clã, para te manter segura. Pode contar comigo.

— Obrigada — respondi e sorri. Ele assentiu com a cabeça.

— Agora se deite e descanse mais um pouco. O resultado do exame sai em duas horas. Acho que darão alta depois disso — me olhou uma última vez. — Você é tão linda quanto ela.

— Sou ela — respondi enquanto me deitava novamente.

— Eu sei — ele assentiu. — Foi um prazer conhecê-la, Alice — Andrei deu as costas para mim, pegou a bandeja e saiu da sala.

Me encolhi na cama outra vez, remoendo as palavras da mulher. Sempre acreditei que existiam pessoas com dons especiais. Alguns mais fortes que outros. Por isso sabia que aquela enfermeira era mesmo uma vidente, mas sobre quem falava? Existiam tantas possibilidades. Arthur e todo o clã de modificados poderia encabeçar a lista. Os comuns, que eram contra a proteção de Victor para mim, também poderiam ser. E até mesmo o próprio Victor, afinal ela não o conhecia. Ele era um vampiro e aquilo bastava. Mas tinha certeza que ele não me faria mal algum.

Fechei meus olhos e pude ver a imagem dele na minha frente. Há poucas horas que não o via, mas já sentia tanta falta dele. Aquilo não era normal. Como conseguiu me marcar daquela forma em tão pouco tempo?

Ainda tinha o fato de agora conhecer o filho de Christine. Ele pareceu sincero e triste, enquanto falava. Ao mesmo tempo, me sentia tentada a confiar em Andrei. As palavras de Christine surgiam em minha cabeça. "Saiba escolher seus aliados". Ele era um modificado, mas ao mesmo tempo era filho dela. Iria me machucar sabendo que Christine e eu somos a mesma pessoa?

Com esse pensamento me deixei levar pelo sono e assim, adormeci.

Conforme Andrei informou, duas horas depois recebi alta médica, pois meu exame de sangue havia dado normal. Deixei o meu quarto e segui pelos corredores brancos do hospital. Apressei os passos e cheguei à recepção. A moça do turno da noite já havia saído e não sabia mais a quem recorrer para saber notícia de William.

— Com licença. Posso usar o seu telefone? — apontei para o aparelho em cima da enorme bancada de mármore.

— Claro que sim — respondeu ela e disquei o seu número. Caiu direto para a caixa de mensagem. — Que droga, Will! — resmunguei alto.

— Desculpa, mas a senhorita é a Alice Baker? — perguntou a recepcionista e eu assenti. — A enfermeira do turno da noite me pediu para entregar isso para a senhorita — e passou a chave do meu carro. — Disse que o rapaz que a trouxe deixou em cima do balcão, quando saiu — peguei o objeto e fiquei imóvel. — Você está bem? — perguntou e eu assenti.

— Eu... só estava imaginando o porquê que ele saiu assim às pressas. E nem me disse nada? — respirei me dando por vencida. — Quer saber, já deveria estar acostumada com as mudanças do William. Obrigada. — Dei as costas para sair, mas lembrei da enfermeira. Precisava obter mais informações sobre ela. — Desculpa — respirei fundo quando a mulher me encarou outra vez. — Tem uma enfermeira aqui, cujo nome é Rochelly... Rochelly Philips — ela assentiu. — Quais os turnos dela?

— Não tenho autorização para dar essa informação. Sinto muito.

— Por favor, preciso muito falar com ela.

— Olha, se é sobre aquele negócio de vidência, esqueça. Ela é a maior charlatã que você já conheceu — ela sorriu enquanto abria uma pasta. — Todos aqui sabem disso.

— Você acha?

— Sem sombra de dúvidas — respondeu a morena e eu assenti.

— Obrigada outra vez — agradeci e segui em direção ao estacionamento, tentando lembrar onde William estacionou meu carro. Minha cabeça dava voltas com tudo o que acontecia e não conseguia parar de criar situações e conspirações em minha mente. Não conseguia parar de pensar nos últimos acontecimentos. Ultimamente, era o que mais fazia: queimar meus miolos com pensamentos. Já tinha virado um costume.

Entrei no carro e dirigi até em casa. Não a casa do lago, mas a minha residência em Baltimore. Sabia que naquela hora minha família estaria no lago, a casa seria perfeita para colocar minha cabeça em ordem.

Cheguei por volta de meio dia e, como previ estava vazia. Busquei o telefone fixo e disquei o número do meu pai, enquanto seguia para o quarto. Tinha que dizer o motivo de não estar lá no lago esperando por eles. Respirei fundo, e imaginei como eles não estariam. Deixei a casa abandonada e nenhum recado. Ele atendeu no primeiro toque.

— Pai?

— Alice? Graças a Deus, onde você está? — A voz dele transparecia preocupação. — Tentamos ligar várias vezes, mas o celular caía na caixa de mensagem.

— Estou em casa pai e o celular descarregou — respondi tentando parecer que tudo estava dentro da normalidade. — Não me senti bem, durante a noite, e William me levou ao hospital, mas agora está tudo bem.

— O que houve?

— Agora não importa mais, pai.

— Voltaremos agora para casa. Só o tempo de chamar sua mãe e suas irmãs — ele parecia estar aflito.

— Não precisa, é sério. Só estou estafada, nada demais. Os plantões têm acabado comigo. O que preciso é descansar e dormir um pouco — tentei parecer convincente e acalmar a situação. — Depois que tive alta dirigi até em casa.

— Você tem certeza, Alice?

— Sim, tenho! — respirei fundo. — Onde está a mamãe? Não estou a escutando gritar desesperada.

— Não está na casa, foi com as meninas até a casa de Ryan, saber se ele tinha notícias suas — respondeu meu pai. — Mas você está realmente bem, Alice?

— Sim senhor. Já disse para não se preocuparem. Vou dormir um pouco aqui e depois, no finalzinho da tarde, volto para o lago.

— Está bem, querida. Caso necessite de algo, me ligue imediatamente — informou. — Vou ligar agora para o celular da sua mãe, para acalmá-la.

— Certo pai, fica tranquilo que está tudo bem. Amo você.

— Também te amo — respondeu ele e desligou a ligação.

Me joguei na cama, logo depois de pegar o celular. Ele e minha bolsa, com todos os documentos, encontravam-se dentro do carro. Coloquei o aparelho no carregador e vi as quinze chamadas de meu pai. Imaginei o que passou pela cabeça. Tamanho da angústia e do sofrimento. A causa disso tudo era essa minha vida de montanha russa. Com tantos altos e baixos que chegava a dar enjoos só de pensar.

— "Victor chegou bem?" — perguntei em mensagem para Sean. Não demorou muito para que recebesse uma resposta, de um número diferente.

— "Eu cheguei sim. Fiquei sabendo sobre você. Se sente melhor?" — sorri ao perceber que era o telefone dele.

— "Graças a você. Está virando rotina você me salvar, não é?".

— "As donzelas geralmente precisam de proteção" — sorri ao ler aquilo. Antes que pudesse responder, recebi outra mensagem. — "Onde você está agora?".

— "Em casa. Queria ficar sozinha por um tempo, antes de encarar o interrogatório da dona Linda Baker" — Victor respondeu com uma risada.

— "Assim que o Sol se for, eu vou até ai" — respondeu e sorri. Queria muito vê-lo. — "Até lá, descanse um pouco".

— "Sim, senhor" — respondi com uma imagem de um soldado, prestando continência. — "Te vejo mais tarde" — respondi e coloquei o telefone em cima da bancada. Levantei, tomei um banho e desci para comer alguma coisa. Assisti um pouco de televisão pelo resto da tarde e só percebi que já estava escuro quando a campainha tocou.

— Desculpa — foi a primeira coisa que William disse quando abri a porta. — Tive um problema urgente para resolver e não pude ficar.

— Sério? Poderia ao menos ter esperado para saber notícias minhas, não acha? — É sempre assim, William. Não sou sua prioridade. Nunca fui. — Me virei para entrar, mas ele segurou em meu punho.

— Desculpa, de verdade. Foi idiotice, eu sei — fiz uma cara de poucos amigos. — Não fica chateada por causa disso.

— Sou tão transparente assim? Serio que você já sabe que estou chateada?

— Me deixa entrar para conversarmos. Estava indo tudo bem...

— Não — respondi friamente.

— Era bom demais para ser verdade — ele me soltou. — Você só é gentil quando precisa de ajuda, sempre foi assim — retrucou e se voltou para a rua.

— Você também não cansa de dar mancada — falei segurando no braço dele e virando-o para mim. Por mais que ele tenha sumido sem me avisar, estava lá quando precisei. Não mediu esforços para chegar até mim e me levar a um hospital. Não podia ser ingrata. Eu o acordei na madrugada e ele se mostrou prestativo.

— Acho que deve ser uma maldição que me persegue — respondeu forçando um sorriso. Não consegui segurar uma gargalhada.

— Obrigada, de verdade.

— Estou sempre aqui para você, Alice — ele engoliu secamente. — Como eu disse: depois da maior burrada da minha vida, quero me redimir. Preciso de você.

— Will, por favor, eu já te disse que...

— Eu sei — ele me interrompeu. — Você está com outro. Entendo, mas não aceito. Você foi a primeira mulher que eu realmente amei, Alice. Amei e amo. Não tire isso de mim — ele aproximou-se, tocando em meu rosto. Senti que amoleci ao seu toque. Era estranho. Como se ele exercesse um poder sobre mim. Na verdade, sempre conseguiu o queria de mim. Ele era especialista em persuasão. — Necessito de você ou vou enlouquecer.

— Will, não diga isso. — Antes que pudesse reagir, os lábios dele estavam grudados aos meus. Os braços apertaram minha cintura, me fazendo sentir o seu corpo no meu. A princípio gostei do seu beijo. Sentir o gosto dos lábios de William nos meus, outra vez, era uma forma de me sentir inocente. Antes de tudo o que me tinha acontecido. Antes de Laura, antes de Victor e toda essa loucura que se transformou a minha vida, mas foi aí que tudo mudou.

Toquei a pele da nuca de William e vi uma cena que me despertou. O vi transando com Merci, na noite em que liguei pedindo socorro. Por isso ela estava ali, mas aquilo não foi nada comparado ao que vi depois disso. Os olhos da mulher estavam negros, completamente. Will estava envolvido com um modificado. Finalmente entendi o porquê de querer se aproximar de mim. Era um plano. Me senti imunda em ter correspondido aquele beijo e por isso o forcei para que me soltasse. Quando finalmente o fez, meu coração gelou.

Atrás de Will, no outro lado da rua, estava Victor. Ele me olhava seriamente e trazia uma rosa vermelha na mão. Balancei a cabeça negando, enquanto o olhava. Ele não podia ter visto aquilo.

— Algo errado? — perguntou William segurando em meu braço. Eu o olhei de modo sério, me desvencilhando e voltei minha atenção para o lugar onde Victor estava, mas ele havia ido.

— Como você pôde? Não bastou fazer o que fez comigo, Will, ainda se unir aos modificados? Não te conheço mais, não sei do que você é capaz.

— Alice, eu posso explicar.

— Não, vi o suficiente — o empurrei. — Saia da minha frente ou só Deus sabe o que farei.

— Eu não desisto fácil Alice.

— Vai embora! — Eu gritei extravasando toda a minha raiva, naquele momento. As lágrimas fazendo meus olhos arderem de tanto ódio. William assentiu e não disse mais nada. Apenas deu a volta e seguiu até o seu carro. Desabei depois daquilo. Entrei em casa e peguei as minhas coisas o mais rápido que pude. Iria ao lago rapidamente, apenas para que meus pais vissem que estava bem e depois seguiria para a mansão de Victor. Tinha que falar com ele, explicar o que houve. Mesmo que parecesse que aquilo não tinha justificativa.

Não pensei duas vezes antes de cair na estrada e fiz o percurso o mais rápido que consegui. Conhecia aquele caminho como a palma da minha mão, por isso corria feito uma desesperada. Sabia onde estava cada curva, cada lombada e cada entroncamento. Tudo. Ali era meu lar.

Respirei fundo quando as lágrimas começaram a se acumular em meus olhos outra vez. Naquele percurso de vinte minutos, já tinha chorado mais do que em toda a minha vida. Isso sem contar os arrepios que me gelava as costas até a minha nuca. O desespero tornou-se ainda maior, porque sabia que isso só acontecia quando algo de ruim estava para acontecer.

Tinha o conhecimento de que era algo ligado a Victor. Entrei em desespero. Não queria tê-lo aborrecido ou magoado e não entendia o que havia dado em mim. Como pude beijar William? Me odiei profundamente ali.

Desejava saber se Victor estava bem e o que ele teria pensado quando me viu. Mas a pergunta mais pertinente era se ele voltaria a me ver. Pensei em tantas coisas até que uma simples pergunta me deixou aflita: Por que me importava tanto com o que ele pensava? Victor me deixava confiante, viva e calma. Não compreendia o porquê daquilo tudo, o porquê das maravilhosas sensações que ele despertava em mim. Talvez só me importasse porque queria continuar sentindo aquilo, era algo sobrenatural.

De repente minha atenção e meus pensamentos voltaram para a pista. Uma névoa espessa começou a surgir, o que impediu a minha visão. Continuei ainda dirigindo por alguns metros, me esforçando cada vez mais para continuar. Mesmo conhecendo o caminho, resolvi parar e não arriscar.

Antes que de estacionar, a névoa cessou e a pista voltou a ser visível. Então voltei a dirigir normalmente, olhando pelo retrovisor, sem entender de onde surgiu aquilo. Tamanho foi meu susto quando ao olhar de novo para a minha frente, vi um homem parado no meio da estrada. Para não bater nele, desviei de modo brusco para a direita fazendo com que o carro saísse da pista e passasse por cima da linha do trem. Sabia que depois dali só tinha uma única parada: o lago Roland.

Nem tive tempo para pensar direito e já estava dentro do lago. O carro afundava rápido e o desespero crescia a cada milésimo de segundo. Tinha a certeza que morreria. E o pior nem era morrer, por que para mim seria um descanso, mas o fato era que eu retornaria. Havia sangue de vampiro correndo em minhas veias e não havia se passado vinte e quatro horas. Retornaria como uma subespécie.

Com a velocidade com que o carro despencou, fui jogada para frente, batendo a minha cabeça no volante, o que me fez perder a consciência por alguns instantes. Quando voltei a mim, a água já estava no meu peito e o meu para-brisa rachado. Era questão de segundos para ele romper por completo e a água invadir o carro. Tentei tirar o cinto de segurança, mas ele ficou preso. Depois de tentar, resolvi finalmente desistir. Não havia como fugir.

Toquei em meu pescoço na esperança de encontrar o colar e retirá-lo. Tentaria fazer com que Victor me escutasse, mas não o achei. Só então percebi que ele não estava ali.

— Me desculpa, Victor, por favor — falei enquanto as lágrimas corriam.

A minha cabeça começou a pulsar, no local aonde houve o impacto. Perdi a linha do raciocínio. Antes de desmaiar só me lembro de ver meu vidro estourando e algo partindo o meu cinto.

— Respira Alice! Respira, por favor — ouvi a voz familiar de Victor, enquanto meus pulmões permaneciam encharcados de água. Senti a pressão contínua em meu diafragma. — Reage, droga! — Mais algumas friccionadas fortes em meu peito e um beijo gelado. Finalmente me dei conta de que estava prestes a morrer. — Alice! — Ele chamou meu nome enquanto prosseguia com a massagem cardíaca, seguida de respiração artificial boca a boca. Minha mente ainda estava um caos, mas percebia exatamente que era ele. A água que estava em meus pulmões voltou com força, enquanto Victor me colocava de lado para que não sufocasse mais uma vez.

— Grande garota! — me mantive naquela posição por um tempo antes que finalmente tomasse o controle de meu corpo e fizesse menção de levantar. O vampiro me forçou a deitar de novo, e me empurrou.

— Fique aí por mais tempo.

— Victor — falei enquanto o observava. Não consegui evitar que as lágrimas se acumulassem em meus olhos. Apresentava-se completamente encharcado e sério. — Obrigada! — agradeci ao mesmo tempo em que aproximava ainda mais dele. Queria senti-lo perto, que ele me abraçasse e dissesse que ficaria tudo bem. Tamanho foi meu alívio quando os braços dele me envolveram. Mesmo tendo consciência de que era gelado e só iria aumentar o frio que sentia. Não me importei.

— Você está bem agora? — Perguntou no mesmo instante em que se afastava. E depois, me encarou.

— Só minha cabeça que dói um pouco. Mas fora isto, estou bem — respondi e toquei o local que latejava. — Precisamos conversar sobre hoje...

— Outra hora! — repreendeu de modo frio.

— Não posso! — retruquei esquadrinhando o rosto do vampiro. Até que ele paralisou e seus olhos tornaram-se claros, antes que prendesse a sua respiração. Não desviou os olhos de onde minha mão estava. Estranhei a atitude dele e trouxe a mão de volta até as minhas vistas, só então percebi o que era. Estava completamente ensanguentada.

— Sean — Victor levantou-se, me deixando sentada no chão. Afastou-se o quanto conseguiu. — Por favor, leve-a em segurança até a sua casa. Cure-a antes.

— E o senhor, mestre? — perguntou o loiro que me ajudava a reerguer.

— Vou voltar à mansão. Tenho coisas para resolver — respondeu secamente.

— Victor... — comecei a falar, mas fui interrompida.

— Cuide-se, Alice. Falta ainda algumas horas para que o sangue de Sean perca o efeito. Não estarei por perto o tempo todo — a feição estava rude e não me disse mais nada, apenas deu as costas. No segundo seguinte, partiu.

Sean aproximou-se de mim, mordeu seu dedo e passou o seu sangue em meu corte. Senti a pele repuxar e quando percebi, não existia mais ferida. Ajoelhei na beira do lago, peguei uma quantidade de água, tirei todo o sangue que escorreu pela lateral de minha testa e sujou meu rosto. Não queria assustar, ainda mais, meus pais.

Caminhei calada ao lado de Sean, tentando colocar a mente em ordem. Olhei para o vampiro e a expressão dele era serena e constante. Não parecia nem um pouco abalado ou preocupado com o que aconteceu. Era a frieza em pessoa.

— Sean, ele vai ficar bem? — perguntei enquanto andava os duzentos metros que faltavam para a minha casa.

— Sim, minha senhora, isso é questão de tempo — respondeu sem me olhar.

— Ele te contou?

— Contou — respondeu e finalmente seus olhos desviaram até mim e voltaram-se para estrada.

— Sean, eu não...

— Não é a mim que deve explicações. É a ele.

— Ele não me escuta. Como vai acreditar em mim?

— Está magoado. Com o tempo ele vai pensar direito e conversará com a senhora.

— Ele está lhe dizendo isso, não é? Sei que ele está com você vinte e quatro horas por dia.

— Não agora — parou e virou o corpo para mim. — Não deveria comentar sobre isso, mas o que aconteceu vai além de um beijo.

— Como assim? — perguntei tentando me controlar, por um minuto apenas, e colocar as ideias em ordem.

— É algo que talvez não possa entender.

— Por que você não tenta? Irei me esforçar.

Sean deu um sorriso que se mostrou no canto da sua boca.

— Está bem! — ele parou por um segundo e continuou — A história da humanidade sempre foi cheia de coisas sobrenaturais e o amor é uma delas. Nós, vampiros, acreditamos que existe alguém especial à nossa espera. Alguém que mais cedo ou mais tarde encontraremos e muitas vezes lutamos contra o tempo e o espaço para que isso aconteça. Quando um vampiro escolhe uma parceira, é como se ele formasse uma ponte mental com ela. Sente tudo o que ela sente e vice e versa. Se ela está triste, saberá que ela está triste. Se ele está alegre, ela sabe que ele está alegre. Isso é algo intenso e marcante. Porém, esse elo não é algo indestrutível. Ele pode ser quebrado. Existem várias formas de fazê-lo, mas a mais eficaz é quando um dos dois morre ou se houver traição, e foi isso que aconteceu. Ele soube, através de sua mente, que você estava com outro. A senhora rompeu a ponte quando beijou William.

— Não, eu não rompi! Não fui eu quem o beijou. Foi ele que me agarrou!

— Mas você retribuiu. Ele sentiu.

— Não... — tentei me justificar, mas a realidade era que sim, tinha retribuído. Até certo ponto eu quis. Mas parecia que não era dona de mim mesma. Estava fragilizada, porque quase havia morrido. Quando mais precisei, foi William que estava por perto. Agora, conheci a real razão de sua reaproximação. — Como poderia saber que existia essa tal ponte? — parei por um instante, falando tão baixo quanto eu podia. — Por que Victor não me falou nada, Sean?

— Achou que a essa altura, a senhora já compreendesse os mistérios do nosso mundo.

— Não! Não compreendo! — falei irritada, quase como um grito. Sentia muita raiva e remorso. — E como isso pode ser possível? Não sou vampira. Não poderíamos ter um elo.

— Quando disse que os parceiros tinham que ser, necessariamente, da mesma espécie? — Sean me olhava com a expressão de pena, enquanto milhares de perguntas nasciam em minha mente. Victor estava distante porque o afastei. Com minhas meninices e minha maneira egoísta de pensar. Agora, finalmente havia entendido a razão pela qual não consigo parar de pensar nele. A razão pela qual eu tenho sentido essas sensações maravilhosas ao seu lado. O porquê de pensar nele a cada segundo. Eu o amava e o elo se rompeu. Voltara a ser sozinha.

Lágrimas corriam pelos meus olhos, como se fossem rios furiosos. Não conseguia esconder aquele sentimento que começara a me corroer de dentro para fora, tão rápido quanto o vento. Continuamos por um tempo caminhando calados até que avistei minha casa acesa, por detrás das copas das árvores. Então parei mais uma vez.

— Como eu posso fazer para...

— Restaurar o elo? — perguntou Sean, sem deixar que completasse a minha pergunta. Agora ele podia ler minha mente, nada mais impedia. — Prove para ele que você o ama. Só assim as coisas voltarão a ser como era antes — Sean enxugou o meu rosto e se afastou. — Agora preciso ir, Victor me chama.

— Diz a ele que eu sinto muito, por favor.

— Direi sim! Adeus!

— Até mais, Sean.

O vampiro curvando-se, como sempre fazia, e correu como um raio para dentro da mata. Olhei para o meu lado direito e as luzes da minha casa estavam todas acesas. Meus pais, certamente, estavam acordados. Tudo o que menos queria era chegar e ter que responder perguntas como: Por que você está toda molhada? Cadê o carro? Por que tem sangue em sua roupa?

Então lentamente encostei em uma árvore e ali fiquei por um tempo que não me importei em cronometrar. A floresta era a minha amiga, a única que sabia o quão louca minha vida se tornou. Testemunha de eu ter sido tão estúpida e talvez até compreendesse o meu sofrimento.

Sentei e chorei. Não me envergonhava disso. Ali fora seria um lugar ideal para afugentar minha culpa e ao menos, tentar me recompor antes de encarar meus pais e contar a verdade.

Nunca vi nada parecido com aquela noite. Estava mais escura que o habitual, silenciosa e apavorante. Não se ouvia passos de animais ou o cantar dos pássaros. Muito menos se via sinal de vida no meio de todo aquele verde.

Fiquei pensando em o que Victor estaria fazendo naquele momento. Tentei captar alguma coisa relacionada a ele. Pensar que não era a culpada por aquilo. Mas quanto mais tentava mais me afogava no remorso.

Me encolhi no mesmo lugar onde me encontrava e o ar se foi. Tentei respirar fundo e me acalmar. Porém, nada do que fizesse traria minha paz de volta. Só teria sossego quando Victor me perdoasse.

Coloquei minha cabeça entre os joelhos, procurando me acalmar e mandar aquela crise de pânico para longe. Mas era algo maior do que eu. Tentei lembrar do dia em que estive exatamente assim. No dia em que Nicholas foi morto. Ele me ajudou a me controlar. Pude ouvir a sua voz, me dizer o que fazer e como respirar.

As lágrimas ainda rolavam e a culpa me consumia. Pensamentos vinham à tona e ao mesmo tempo retornavam as desculpas para meu ato. Mas todos esses caminhos me levavam a uma única conclusão: Era a pior pessoa do mundo e não merecia Victor. Não mereci quando era Christine e não merecia sendo Alice.

— Espero que você me perdoe algum dia, Victor — essas palavras saíram como se não fosse vê-lo, nunca mais. Na realidade, era isso que estava disposta a fazer. Estava dando carta branca para Victor viver sua vida e me deixar de fora dos seus planos.

Levantei quando o ar gelado entrou em meus pulmões, como se estivesse vivendo dentro de um iceberg. Caminhei de forma lenta em direção à porta de casa. E o que me lembro, daquela cena, foi de ter virado uma última vez para olhar a floresta e jurar ter visto Victor me observar de longe. Um pouco antes de desaparecer.

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