- Mas que droga! – Gritei. Por sorte o lago não era fundo o suficiente para me cobrir, do contrário eu estaria em sérios problemas. – Porque fez isso? – Questionei, espremendo a água da confusão que tinha se tornado meu cabelo.
Era isso que eu ganhava por tentar ajuda-lo uma única vez? Bom, não haveria uma segunda.
- É uma punição. – Disse, sentando-se ao lado da margem de pedra.
- Punição?! Perder tanto sangue deve ter ferrado sua cabeça. – Falei furiosa, agarrando-me a margem para sair do lago, a água fria estava trazendo calafrios para meu corpo.
- Punição por ter se machucado tanto, o que vou fazer com uma noiva cheia de cicatrizes? – Perguntou, tirando suas botas. – Ademais se não a jogasse na água, eu não poderia fazer isso. – Disse, entrando no lago.
- Se você queria nadar não precisava ter me empurrado, eu não teria tentado te impedir. Na verdade se já esta bom para nadar, não precisa mais de ajuda. – Falei, erguendo meu corpo para sair do lago quando ele me puxou.
Sua mão estava reconfortantemente quente, bem diferente de minutos atrás. Isso tomou minha atenção para ver seu tórax, a água tinha levado boa parte do sangue recente e o ferimento parecia menor, quatro simples linhas rosadas com exceção da grande perfuração do seu ombro. Aquilo me incomodou, apesar de saber que não deveria, que tinha sido mais que merecido, não pude deixar de me sentir mal.
- Salvou minha vida, senhorita Nowak. – Falou sério. Apesar de eu não achar que tinha sido para tanto. – Se não tivesse o distraído até que a toxina estivesse fora do meu corpo, estaríamos ambos mortos. – Disse, movimentando sua outra mão para meu ombro, me encolhi quando seus dedos tocaram os arranhões em meus braços. – Então me permita fazer algo por você, afinal deve ter sido uma escolha difícil, salvar alguém que odeia.
Sim, eu o odiava. Odiava pelas coisas que tinha feito, pelo seu egoísmo e suas meias repostas. Mas eu não tinha feito aquilo para salvá-lo...
Dei um sorriso sem humor.
- O que, por exemplo? – Falei o encarando, bastava de me sentir intimidada. – Contar o que é um Dominante e o que isso tem haver comigo? Contar quem é o seu alvo? Me libertar? Qual dessas coisas você estaria disposto a fazer, todas ou nenhuma? – Falei firme, o desafiando, eu podia estar ferida fisicamente e esgotada mentalmente, minha caixinha estava a um ponto de se despedaçar, mas eu nunca seguiria seu jogo sem questionar. – Não preciso que me engane mais, Lobo. Só quero que me deixe ir, preciso descansar, nem todos tem um corpo mágico como o seu. - Concluo, vendo a engenhosidade por trás dos seus olhos infernais trabalhar.
Infernais. Um termo que melhor se aplicaria a versão vermelho sangue que eu tinha visto eles tomarem mais cedo, quando o Lobo havia inesperadamente chegado a cela. Por que haviam mudado, senti vontade de perguntar, porque sua transformação beirava a sombras e não apenas um clarão de luz como a de Elikham? Precito. O quê essa palavra queria dizer e onde eu tinha a ouvido antes? Minha mente pregava divagações e para minha surpresa ele respondeu.
- Dominância, essa é a razão pela qual não posso simplesmente marca-la ou trata-la como um objeto, é o poder de em termos mais simples não se curvar perante ninguém, o poder de um Mestre. E você Aysha, é puro poder. – Respondeu cautelosamente, escolhendo as palavras. – Drivand, esse é o nome do meu alvo, ele não é um humano se isso é o que a preocupa e muito menos alguém que não mereça a morte. A libertar... – Ele fez uma pausa, como se cogitasse a ideia. – Se você fosse livre para onde iria, voltar a sua vila que tanto despreza ou para a promessa de uma vila que não conhece? Não posso liberta-la, que noivo deixaria sua amada no meio de estranhos?
- Você. Não. Me. Ama. – Afirmei, pausando as palavras. Não havia nenhuma incerteza em minha voz e muito menos em seus olhos.
- Não. – Assumiu. – Mas temos um compromisso, preciso de você e você de mim.
- Porque eu precisaria de você?- Questionei confusa.
- Porque o Mestre Lican que mandou seu subordinado até aqui para tomar seu coração não vai parar mesmo que saia da minha proteção.
- Então você admite que sabe quem foi. – Constatei em tom acusador.
Mesmo que estivesse satisfeita por ligar os pontos não pude deixar de me sentir amedrontada. Outro Lican tinha interesse em me matar, seria apenas por estar ao lado do Lobo ou isso teria alguma relação com a tal Dominância?
- Satisfeita? – Perguntou, arqueando uma sobrancelha negra para mim.
Até demais, apesar de desconfiar que haviam motivos dúbios para me contar tudo.
E você Aysha é puro poder.
Poder. Eu não me sentia poderosa, não quando podia ser tão facilmente subjulgada e ferida. E se...
- Só quando me soltar. – Falei, ignorando os pensamentos obscuros da minha mente. – Preciso cuidar das minhas próprias feridas agora.
- Posso fazer isso por você. – Se prontificou. Calafrios que não eram pela água fria se agitaram em meu corpo.
- De jeito nenhum. – Falei apressadamente, tentando me desvencilhar, mas ele continuou firme segurando meus braços.
- Você não ficou com medo quando me viu arrancar o coração daquele Lican, mas tem medo que minha língua toque sua pele. Achei seu ponto fraco, Senhorita Nowak? – Perguntou, inclinando sua cabeça. Um sorriso zombador tocou seus lábios. – Porque acha mesmo que a joguei na água?
- Maldito. – Sibilei, ele havia premeditado tudo.
- Sabe que não posso deixar minha noiva com o rosto ferido. – Sussurrou, pressionando seu polegar em baixo do meu queixo, me forçando a olha-lo, desafiadoramente movi minha cabeça, olhando para a direção oposta. Ele usou um segundo dedo para prender meu rosto e vira-lo novamente. – Há menos que queira tornar isso prazeroso para mim, não resista. – Aconselhou sombriamente.
Comprimi meus lábios assim que senti sua língua tocar o ferimento em minha testa com movimentos propositalmente lentos. Eu já estava prestes a afasta-lo quando ele inesperadamente foi até a curva do meu pescoço, movendo sua mão para minha nuca, seus dedos quentes acariciaram meu pescoço e eu pendi a respiração assim que senti o roçar de seus dentes no ferimento que Kohina tinha me causado. Pude sentir sua frustração no momento que tentei me afastar, seu corpo se pressionou no meu e eu fechei os olhos apreciando um pouco o calor inquietante que ele emanava. Soltei o ar assim que ele lambeu meu pescoço, uma única vez, tentadoramente. Os dedos em minha nuca se moveram, descendo por minhas costas até chegarem em minha cintura, na porção de pele descoberta que a roupa de combate covardemente não protegia.
Eu me afastei, assim que senti meu próprio corpo me entregar.
- Já é o suficiente. – Falei, colocando um braço defensoramente entre nós, não para afasta-lo, mas esconder que meus seios tinham ficado enrijecidos com seu toque. – Deveria estar preocupado com as próprias feridas. – Assinalei, apontando para o ferimento em seu ombro. – Se essa ferida continuar progredindo da forma que esta, será um problema.
- Não há com o que se preocupar, já fui ferido por prata antes. – Disse, andando até a margem do lago, por sorte, talvez pura sorte ele não tivesse reparado...
Mesmo depois de escutar que tinha saído da água continuei parada, regulando minha respiração.
Seu traidor, não ouse ficar assim, falo para meu corpo, agitando meus braços na água para dissipar a sensação do calor do Lobo ou talvez do meu próprio corpo. Eu precisava esfriar minha cabeça, talvez afundar no lago e não emergir nunca mais.
- Se gosta tanto do lago deveria ao menos tirar suas preciosas botas. – Avisa.
- Merda. – Praguejo, assim que lembro do mecanismo das botas, se a água o enferrujasse eu podia dar adeus a minha única recém descoberta arma. Sem pensar duas vezes saio apressadamente do lago e tiro minhas botas. – Se ficarem estragadas vou chutar seu traseiro, Lobo. – Prometo, afinal que ideia ridícula me jogar na água para apenas me lamber depois.
Sem aviso sou acertada por uma toalha, gentilezas, puff, pra que?
Quando estou prestes a devolvê-la com uma maldição, sou surpreendida por ver que ele ainda não havia pegado uma toalha para si, me contemplando uma visão do traseiro em questão e de todos os músculos que um corpo masculino deve ter.
Senti o rubor arder em minhas bochechas e com nenhum outro pensamento a não ser sair daquele quarto me levantei e corri até a porta segurando minhas botas.
- Vou subir agora. – Falo, sem olha-lo.
E sem esperar sua resposta saio do quarto imaginando ter ouvido uma risada atrás de mim.