Capítulo 5
You're no good for me
Baby you're no good for me
You're no good for me
But baby I want you, I want you
Diet Mtn Dew – Lana Del Rey
Se havia de chover era naquela manhã. Na realidade, a mesma não cessara durante a noite inteira e o vento soprava com força, o que me fazia encolher na cama. Após ganhar coragem para me levantar, tratar da minha higiene pessoal e me vestir, desci em direção à cozinha onde encontrei Rachel. Senti um alívio ao vê-la e quando olhei para a mesa, Evan também se encontrava lá. Ele sorriu e acenou na minha direção.
- Bom dia. – As suas palavras formaram-se antes de eu ter oportunidade para dizer algo. Ele parecia mais alegre hoje.
- Bom dia. – Respondi de volta, desejando também a Rachel.
- Quer que lhe prepare o pequeno-almoço, menina? – Ela questionou com a simpatia de sempre.
- Não obrigada, eu posso tratar disso hoje. – Sorri-lhe e ela retirou-se, subindo as escadas em direção aos quartos. Peguei numa taça e enchi-a com leite, despejando os cereais depois. Sentei-me e Evan repetiu o ato. – Queres alguma coisa? – Questionei enquanto ele me observava a comer.
- Não, mas obrigada. – Quando ele sorriu, eu apercebi-me o quão aquele gesto me aquecia por dentro.
- Estás mais animado hoje. – Constatei o facto e ele anuiu silenciosamente.
- Falar sobre aquele assunto ontem à noite foi como retirar um peso dos ombros. Tenho a agradecer-te.
- Não precisas. – O sorriso permaneceu nos seus lábios, mas quando a sua atenção se focou no seu relógio de pulso, ele levantou-se quase instantaneamente.
- Temos de ir agora, ou vamos chegar atrasados.
Apressei-me a terminar os cereais, correndo pelas escadas acima para lavar os dentes e dar uns últimos retoques ao cabelo. Lembrei-me que o casaco do Zayn ainda se encontrava dobrado no meu armário e caminhei até lá, colocando-o dentro da minha mochila, sentido o odor exótico que provinha do mesmo. Quando começava a sentir-me perdida nos pensamentos, a voz de Evan soou e acabei por abandonar a divisão.
Assim que chegamos lá procurei instintivamente por Zayn, para lhe devolver o casaco e agradecer-lhe, não apenas pela peça de roupa, mas também pelo que ele fez. Como não o encontrei, continuei a seguir Evan para o interior e entramos para a aula.
*
Aquela aula passou a correr. Caminhei com Evan até aos cacifos e abri-o, guardando tudo o que não precisava lá dentro. Acabei por pegar na mochila devido, ao facto de o casaco de Zayn ainda se encontrar dentro da mesma. Já não bastavam os comentários que surgiram, se me vissem a entregar-lhe algo assim.... nem queria pensar. Engoli em seco e coloquei uma alça ao ombro, deixando a outra descaída. Encostei-me ao cacifo enquanto Evan fechava o dele. Vi-o a olhar para o lado oposto que eu me encontrava e reconheci a rapariga da festa com quem ele tinha estado.
- Porque não vais falar com ela? – Embora a minha tentativa de incentivo, Evan olhou-me hesitante.
- Achas que devo? – Ele questionou, mordendo o lábio inferior depois.
- Claro. – Afirmei enquanto o empurrava ligeiramente. – As coisas correram bem na festa, certo? – Ele ia responder, mas não o deixei falar e continuei a empurrá-lo. – Vai lá.
Ele sorriu como que em forma de agradecimento e dirigiu-se até aos cacifos onde se Melody permanecia. Ao avistá-lo, um sorriso adornou os seus lábios e após isso, eles caminharam pelo corredor abaixo. Senti-me realizada com o cenário.
Zayn apareceu no meu campo de visão e senti arrepios percorrerem a minha espinha. Se queria devolver-lhe o casaco, esta iria ser a minha oportunidade. Caminhando lentamente, tentei recolher a coragem que me faltava, para lhe falar sem que sentisse o meu coração a bater freneticamente dentro do meu peito. Por momentos considerei-me ridícula. Só lhe vais devolver o que lhe pertence, não o vais pedir em casamento.
- Olá. – Enquanto ele fechava o cacifo, os seus lábios formaram-se num pequeno sorriso sarcástico. Eu engoli em seco, enquanto ele se virava para mim e me olhava, aguardando, uma expressão de entretenimento no seu rosto.
- Bom dia, Charlotte. – O sorriso não desapareceu, muito pelo contrário. Ele parecia satisfeito com o facto de ter sido eu a ir ter com ele, e eu acabei por olhar em volta quando senti de novo os olhares depositados em nós. Desejei tornar-me invisível.
- Eu... - Parei de falar quando ele ergueu as sobrancelhas e voltei ao raciocínio. – Queria apenas devolver o teu casaco. – Como ele não falou, balancei apenas a mochila de modo a que ela ficasse de lado e abri-a. Entregando-o para as suas mãos, que afagaram suavemente as minhas, senti o calafrio que percorreu a minha espinha. Anuindo, como em forma de agradecimento, acabou por o guardar dentro do seu próprio cacifo. – Zayn... - A sua atenção depositou-se em mim de novo. – Porque é que me defendeste naquela noite?
- Almoça comigo e eu conto-te. – Cruzando os braços, ele aguardou a minha reação.
- O quê? – Ele soltou uma gargalhada devido ao meu ar, claramente, confuso.
- Almoça comigo hoje e eu conto-te o motivo pelo qual te protegi.
- Eu não acho que seja boa ideia, tenho alguns trabalhos para fazer...
- Tu é que ficas sem saber. – Ele remexeu no bolso do seu colete e retirou um maço de tabaco, retirando um cigarro do mesmo. Pensei nas palavras de Evan, na promessa que lhe fizera, mas queria entender o motivo dele me ter protegido, a razão de ele se ter preocupado minimamente para me levar a casa e deixar-me em segurança.
- Espera. – Murmurei quando ele ia virar as costas. Olhando por cima do seu do ombro, com aqueles olhos escuros repletos de mistério, eu esforcei-me para engolir o nó na minha garganta.
- Espero-te à hora do almoço na entrada. – Antes de abandonar o edifício, ele olhou para trás e apercebi-me que eu permanecia no meio do corredor, esperando que ele desaparecesse do meu campo de vista. – Se fosse a ti despachava-me... Já estás atrasada para a aula. – Olhei para o relógio branco que se encontrava afixado na parede do corredor e apressei-me para a sala.
***
- Vens? – Quando Evan falou, eu despertei dos pensamentos que me mantiveram distraída durante a aula.
- Onde? – Rindo-se da minha evidente confusão, Evan pegou nos meus livros e depois entregou-me para as mãos.
- Embora, para casa. Já terminou por hoje. – Levantei-me da cadeira e olhei-o, relembrando o meu almoço com o Zayn. Estremeci só de pensar na ideia – porque é que eu tinha concordado com aquilo afinal? – Estás bem, Charlotte?
- Sim, claro. – Disfarcei um sorriso e senti o estômago a contorcer-se. - Lembrei-me que tenho de ir ter com a Lyn ao trabalho dela. – Murmurei.
- Oh. – Ele assentiu, quase observando-me. – Estás pálida, tens a certeza que te sentes bem?
- Não te preocupes. – Voltei a exibir um sorriso falso e ele franziu a testa.
- Queres que vá contigo até lá?
- Não, Evan, eu estou bem. Apenas tenho fome, nada mais do que isso. – Após falar isso, senti o meu estômago a contorcer-se novamente. – Eu vou à cafetaria e compro alguma coisa para levar pelo caminho.
- Ligas-me se acontecer alguma coisa? – Quis sorrir, mas o seu ar sério impediu-me.
- Claro que sim. – Não consegui conter o sorriso nervoso. – Tenho de ir, senão vou chegar tarde ao emprego da Lyn e ela não gosta de ficar à espera. Até logo.
Despedi-me e vi Evan afastar-se. Caminhei mesmo para o interior da cafetaria apenas para passarem alguns minutos, até ele ter tempo para sair do recinto. Acabei por sair da divisão, caminhando lentamente enquanto tentava mentalizar-me que ia estar na casa de um possível...
Os meus pensamentos foram interrompidos pela sua voz grave.
- Estás pronta?
Quando ele apareceu por detrás de mim, segurei os livros contra o meu peito para me impedir de estremecer à sua frente. Zayn guiou-me quando eu assenti e ambos caminhamos em direção ao seu carro, o odor que permanecia no interior causando-me uma sensação desconhecida. Sabia que talvez no dia seguinte nos tornâssemos um dos motivos mais falados na escola, visto que ele aparentava ter uma certa reputação, mas não lhe daria o gosto de recuar agora.
A viagem não foi longa, cerca de quinze minutos e assim que chegámos encontrei-me revestida de surpresa. Esperava ver uma casa em mau estado e um tanto assustadora no exterior, mas surpreendi-me ao testemunhar uma casa típica inglesa que até parecia um tanto acolhedora. Zayn abriu a porta do carro do meu lado e eu segui-o até ao interior do seu lar, sentindo a súbita mudança de temperatura devido aos aquecedores que se encontravam ligados.
Ele entrou e fechou a porta. Movendo-se em direção à cozinha, testemunhei enquanto ele começou a preparar o que seria o nosso almoço. Olhei em volta e admirei a sua casa. Era de facto grande, bonita e nada do que eu esperava.
- Então vives aqui sozinho? – Questionei.
- Não, divido a casa com um amigo. – Ele olhou por cima do ombro e sorriu. Saí de onde estava e aproximei-me, observando-o.
- O que vais fazer?
- Carbonara. – Ele exibiu um sorriso orgulhoso. – Gostas?
- Nunca provei. – Dei de ombros quando ele esbugalhou os olhos.
- Bom, vais provar hoje.
- Resta saber se vou gostar. – Sorri, provocando um pouco. Ele retribuiu o sorriso e algo dentro de mim anunciou que talvez ele não fosse tão mau como diziam. – Então, és tu que cozinhas cá em casa? Entre ti e o teu amigo?
- Se não quero sofrer de intoxicamento alimentar, sim, é o melhor a ser feito. – Ele arqueou as sobrancelhas e dei uma risada. Enquanto a massa a cozia, ele acabou por retirar o gorro preto, pousando-o em cima do balcão. Os seus cabelos negros encontravam-se todos desgrenhados, mas dava-lhe um ar diferente. A sua barba encontrava-se por fazer e os seus olhos castanhos refletiam curiosidade.
- Então, fala-me sobre ti. – Ele começou o que me fez sentir um sufoco na garganta que me impediu de respirar durante segundos. – De onde vens? – Inclinando-se para a frente, como se estivesse repleto de curiosidade e pronto a ouvir o que tinha a dizer, os seus olhos encontraram os meus.
- Lundwood. – Respondi um tanto hesitante.
- Isso fica a meia hora de carro daqui. – Ele cofiou o queixo enquanto eu assentia, confirmando. – Porque vieste para cá? – Os seus olhos brilhavam com a curiosidade neles espelhados. E pensei que teria de repetir a mesma mentira.
- Os meus pais viajaram em negócios e vim passar uns tempos com a minha tia. – Surpreendi-me por a tratar por minha tia, mas de facto mais tarde ou mais cedo teria de começar a fazê-lo. Ele escutou atento e após isso elevou-se e caminhou até à panela, remexendo. Retornando para onde se encontrava, a sua posição anterior regressou. Eu sentei-me numa das cadeiras que permaneciam por detrás do balcão.
- E os teus pais? – Decidi questionar.
- Andam por aí algures. Saí de casa cedo porque eles não queriam saber. – Ele deu de ombros e fitou o balcão negro polido. Arqueei o sobrolho e olhei-o, indignada. – Até que conheci o Harry e dividimos a casa. – As palavras que ele proferia soavam tão honestas, que eu não sentia dúvidas à medida que ele falava. Questionava-me se eu soava assim também. – Reparei que tens uma boa relação com o Evan.
- Sim. – Um sorriso formou-se nos meus lábios. – Ele é um bom amigo.
- Ele avisou-te para te manteres afastada de mim? – Quando engoli em seco, Zayn deu uma risada. – Foi por isso que disseste que eu era o tipo de rapaz do qual tu te devias manter afastada. – Fitei as minhas mãos e não me atrevi a olhar na sua direção, permanecendo em silêncio.
- Ele só quer o meu bem. – Defendi-o, enquanto Zayn verificava mais uma vez o almoço.
- No entanto aqui estás tu... - O seu olhar provocador quase que queimou a minha pele. – Apesar de ele querer o teu bem não lhe deste ouvidos. – Ouvi-lo a dizer aquilo fez-me perceber que realmente, eu devia ter dado ouvidos a Evan e nunca me devia ter aventurado para vir até aqui. – Eu gostei da tua coragem. – Ele murmurou desligando o fogão elétrico. Olhei-o sem entender o que ele queria dizer.
Por momentos pensei em sair dali a correr e voltar para casa, mas havia algo nele que me cativava e incentivava a ficar. – Não penses mal de mim, Charlotte. Nunca magoei uma rapariga, esta não vai ser a primeira vez. – Senti um alívio no meu peito e apercebendo-se disso, uma risada animada soou.
Ele tirou carbonara para ambos e encheu dois copos com sumo, colocando depois as bases pretas na mesa com os pratos por cima. Sentando-se ao meu lado, eu conseguia sentir o seu olhar em mim e saboreei. O facto é que estava demasiado delicioso.
- Está muito bom! – Sorri e fiquei completamente surpreendida.
- Obrigada. – Ele levou uma garfada à boca e depois sorriu orgulhoso.
Assim que terminamos de almoçar, ajudei Zayn a levar os pratos para a máquina de lavar e depois encostei-me ao balcão, observando-o a arrumar as bases e a colocar os talheres dentro da máquina.
- Zayn...
Ele olhou-me e aguardou. Subitamente, ouvi gargalhadas vindas do exterior e vi-o a dirigir-se para a porta, abrindo-a para trás. O rapaz pareceu-me familiar e quando pensei bem já o tinha visto na entrada da escola, mas a rapariga nunca a vira antes. Os seus cabelos eram loiros e compridos, davam-lhe quase pelo fundo das costas. Mechas que eram mais claras estavam presas com ganchos, de ambos os lados e eles entraram para o corredor de mão dada ainda a rirem-se.
Ele envergava uma t-shirt preta com uma imagem estranha estampada em branco, uns jeans escuros, blazer azul e all star brancas. Os seus cabelos eram revestidos de caracóis e o seu sorriso desvaneceu quando ele me viu, encostada ao balcão observando-os. A sua mão moveu-se da rapariga loira e ambos se mostraram um tanto incomodados. Considerei-me um estorvo entre eles e considerei a ideia de ter vindo até aqui, um erro. Dos grandes.
Zayn quebrou o silêncio e fechou a porta.
- Estávamos a falar de ti. – Ele deu palmadas leves nas costas do rapaz.
- De mim? – As suas sobrancelhas arquearam-se e ele seguiu Zayn até à cozinha. Os três aproximaram-se e engoli em seco. – Deves ser a Charlotte, ouvimos falar muito de ti. – As suas palavras causaram com que me contorcesse ligeiramente e anuí.
- Não tanto. – Zayn concluiu e a rapariga exibiu meio sorriso. Ela lançou-me um olhar amável e o sentimento desconfortável desvaneceu ligeiramente. – Charlotte, é o Harry o meu colega de casa e amigo. E ela é a Scarlet. – Ela levantou a mão acenando e sorriu. Os seus olhos eram cobertos por um azul-marinho e o seu sorriso inspirava-me confiança, algo que não sentia desde que aceitei vir para aqui.
- Vão almoçar? – Foi a vez de Scarlet falar e a sua voz soou harmoniosa.
- Já almoçamos. – A loira assentiu e trocou um olhar com Harry. A sua tez era pálida e ela era magra. Envergava apenas um casaco de couro preto, uns calções, collants rasgados e umas botas brancas que lhe davam um pouco acima do tornozelo.
- Bem, eu vim mostrar umas coisas à Scarlet, portanto... Se precisares de nós, não chames. – Harry riu e subiu as escadas, sendo seguido pela rapariga. Limitei-me apenas a observá-los enquanto eles subiam as escadas e depois ouvi uma porta a ser fechada.
Zayn suspirou e abanou a cabeça negativamente com um sorriso estampado nos seus lábios. Limitei-me a tentar processar o que acabara de assistir e ele aproximou-se.
- O que se passa? – Questionou.
- Nada. – Disfarcei um sorriso e depois olhei em volta. – A tua casa é enorme! – Exclamei.
- Ainda não viste nada. Vem e eu mostro-te o resto.
Senti a hesitação de novo, mas já que estava aqui, que mal poderia fazer? Ele subiu as escadas e eu segui-o. Pairava um aroma na casa que não soube identificar, no entanto esperava talvez um pouco mais de... desarrumação? Ele abriu uma porta que se encontrava ao fundo do corredor e senti o súbito calor a invadir o meu corpo.
Parecia uma espécie de lavandaria, demasiado pequena para duas pessoas. Havia também uma porta e Zayn abriu-a para trás. A súbita mudança de temperatura fez-me tremer, mas a vista valeu completamente a pena. Na pequena varanda feita de pedra, existia apenas duas cadeiras, e o local era tão apertado que cabiam duas ou três pessoas e dali conseguia ver quase toda a cidade.
Sorri fascinada e Zayn sentou-se. Ele olhou-me e deu três palmadas ligeiras no banco de madeira, convidando-me para me sentar ao seu lado. Comprimi os lábios e assim o fiz. Ele retirou um cigarro do bolso do colete e acendeu-o.
- O que achas? – Quando o olhei, o seu olhar carregava um brilho que não havia testemunhado anteriormente.
- A vista é fantástica. – Afirmei com um sorriso. – Gostava de ter esta vista de minha casa. – Ele riu-se e eu fitei as minhas mãos sem saber o que referir a seguir. Começava a sentir as borboletas no meu estômago, indicando o percurso perigoso que decidira tomar. Porém, ao olhar para Zayn a expelir o fumo dos seus lábios bem delineados, levou-me a esquecer que ele podia ser um perigo para mim.
- Zayn... - Murmurei o seu nome enquanto o via a passar o cigarro para a mão oposta, olhando-me de seguida. – Eu ainda gostava de ter a resposta pela qual me protegeste naquela noite. – Ele pareceu ficar sem saber o que me responder, dando de ombros ligeiramente.
- Intrigaste-me. – Olhei-o enquanto arqueava o sobrolho. Ele riu-se devido à minha expressão e depois de dar um toque suave ao cigarro para a cinza cair no chão, olhou-me. – Intrigaste-me no dia que chegaste. Quis conhecer-te. – Afirmou naturalmente e senti um pequeno arrepio percorrer o meu corpo. - Eu conheço o Nathan. – Falou quando não ouviu uma resposta da minha parte. – Ele gosta de problemas e nessa noite fiquei de vigia nele porque sabia que ele mal pusesse os olhos em ti, que tentaria algo. – Continuou como se isto fosse completamente normal. Abri os lábios para falar, mas as palavras não saíram.
- Mas havia sangue... - Zayn expeliu o fumo novamente e reparei que o cigarro se encontrava quase no fim.
- Foi apenas um lábio rebentado. Só levou alguns pontos, nada de grave. – Olhei-o um tanto chocada e relembrei aquela noite e o seu olhar mortífero. Havia algo mais que isso, havia ódio. – Não fiques tão surpreendida, Charlotte. As coisas por aqui funcionam assim. – Ele deu de ombros e ele apoiou o braço que se encontrava livre, no banco por trás das minhas costas. Não conseguia encontrar as palavras certas para proferir e mantive-me no silêncio. Atirando o cigarro para o chão, calcou-o e apagou-o seguidamente. O facto de ele estar a falar assim só me relembrou o que Evan me contara sobre Phoebe. – Pensei que o Evan te tivesse contado. – Ele falou como se me tivesse lido os pensamentos.
- Não. – Murmurei apenas. – Ele não me contou... - Zayn olhou-me e fiquei um pouco reticente devido ao que ele acabara de me revelar, como se tratasse de uma rotina diária.
- Zayn! – Ouvi uma voz masculina entoar. Tratava-se de Harry, com certeza, e um suspiro seguiu-se enquanto ele se levantava.
- Vem. – Ele murmurou e limitei-me a segui-lo. Passamos novamente pela pequena lavandaria e senti o calor do interior novamente. Harry saiu de uma das divisões e olhou-nos.
- Daqui a nada vou levar a Scar a casa, podes descer comigo só por uns minutos? – A sua expressão séria causou com que eu receasse do que se tratava. Por momentos pensei não querer saber mesmo. Zayn acenou afirmativamente e a sua atenção depositou-se em mim.
- Eu já volto. Mas podes ir ter com a Scar, ela está ali.
Ele apontou para a porta de onde Harry viera há alguns segundos atrás. Assenti e vi-o caminhar até ao fundo do corredor, descendo depois as escadas. Caminhei lentamente até ao quarto, não querendo incomodar, e vi Scarlet sentada em cima de uma cama de solteiro por fazer com as pernas cruzadas. Aproximei-me da entrada e ela sorriu carinhosamente, convidando-me para entrar. Assim o fiz e mantive-me de pé a observar o quarto —— era absolutamente masculino.
As paredes eram revestidas pela típica cor branca, a mobília do quarto variava entre o castanho-escuro e o branco e a cama era demasiado pequena para duas pessoas. Por isso deduzi que era o quarto de Harry. Ao canto da secretária encontrava-se um cesto de roupa suja e as botas de Scarlet encontravam-se ao pé da televisão. A persiana estava quase fechada enquanto o sol tentava penetrar pelos pequenos orifícios.
- Podes sentar-te. – Ela sorriu amavelmente e sentei-me aos pés da cama, observando a televisão.
- Então és a namorada do Harry? – Decidi quebrar o silêncio. Olhei-a e ela encontrava-se a limar as unhas, parando apenas para me olhar, mas sem proferir uma única palavra. – Desculpa se me estou a meter na tua vida, não era minha intenção. – Desviei o olhar e fitei os meus pés.
- Não. – Ela respondeu com meio sorriso, voltando a limar as unhas. – Não somos um casal. Não é que eu não queira, mas... não dá. – Ela deu de ombros e uni as sobrancelhas tentando entender. – Tu és nova por aqui. – Assenti. – És a nova namorada do Zayn? – Senti um aperto na garganta e esqueci-me de respirar por alguns segundos, mas a pergunta apanhou-me completamente desprevenida.
- Não. – Acenei negativamente.
- Não vai faltar muito. – Ela respondeu quase tão naturalmente como ele fizera na varanda e exibi uma expressão confusa. – O Zayn não anda atrás de ninguém a não ser que lhe despertem interesse. Infelizmente, para ele, as raparigas só servem para ele se divertir enquanto são novidade, mas depois ele descarta-as e procura por algo novo. – Ela soou um tanto acusadora e parou de limar as unhas para me fitar. – Tu és tão bonita. Tão inocente. Não sabes nada desta vida que eles têm. Se eu estivesse no teu lugar, Charlotte, eu afastava-me. Rapazes como eles são más notícias e causam destruição para onde quer que eles vão. – Demorei um pouco a processar tudo o que ela me estava a dizer.
- Então porque é que andas com o Harry? – Deixei escapar a questão que era para manter na mente. Ela lançou-me um olhar perigoso e estremeci.
- Eu já estou enterrada nisto até à cabeça. – Ela murmurou. – Vive a tua vida. Curte com alguns rapazes, vai à escola, segue as tuas paixões, faz amigos, viaja. Mas não te metas com o Zayn Malik. – Ouvi passos nas escadas e engoli em seco quando os vi na porta. Será que eles ouviram alguma coisa do que Scarlet me dissera? Harry sorriu e ela pegou nas suas botas, devolvendo-lhe o sorriso. – Não digas que não te avisei. – Ela murmurou quando passou por mim e saiu, despedindo-se de Zayn. Harry despediu-se também e acenou para mim desejando um "vejo-te depois." Eles saíram e mantive-me na mesma posição. Zayn entrou no quarto e encostou-se ao armário.
- Ela foi simpática contigo? – Acenei afirmativamente e ele sorriu.
- Muito, por acaso. Achei-a muito querida. – E intimidante também. – Eu perguntei-lhe acerca dela com o Harry... Penso que ela ficou um pouco aborrecida com isso.
- Eles não sabem o que querem. – Vi-o a dar de ombros, cruzando os braços seguidamente. Desviei o olhar para o despertador achatado com os números vermelhos, que marcava as cinco e meia. Como é que o tempo tinha passado tão rápido? Zayn seguiu o meu olhar e depois chegou-se para a frente.
- Queres que te leve a casa? – Ele questionou com meio sorriso.
- Agradecia.
***
Pelo caminho as palavras de Scarlet ecoavam na minha mente. Não conseguia simplesmente esquecer a história de Phoebe e senti-me perdida.
- Hey. – A sua voz grave soou. – Chegamos.
- Obrigada por me trazeres. – Sorri e ele segurou o meu braço gentilmente, impedindo-me de sair.
- Charlotte... - Ele pausou por alguns segundos ainda a segurar o meu braço e depois olhou-me. – A Scar disse-te alguma coisa? – Ele questionou e eu engoli em seco, esperando que a minha expressão não demonstrasse quaisquer sinais de mentiras.
- Não. – Balbuciei.
- Tens a certeza? – Ele fitou-me e por alguns segundos temi que ele conseguisse descobrir todos os meus segredos mais profundos.
- Absoluta. – Assenti com firmeza e ele inclinou-se para o volante, soltando-me então. – Obrigada mais uma vez por me trazeres.
- Vejo-te amanhã. – Ele murmurou antes de eu sair e fechar a porta. Vi-o arrancar no jipe e estremeci, apenas podia esperar que ele não fosse falar com Scarlet. Desci a rampa até chegar a casa e assim que entrei, vi Lyn.
- Olá querida. – Ela cumprimentou-me, passando por mim e depositando um beijo na minha testa.
- Olá, Lyn. – Sorri e olhei automaticamente em volta. – O Evan passou por cá?
Ela olhou para trás enquanto subia as escadas e acenou negativamente. Senti um peso a ser retirado dos meus ombros e acompanhei-a, para depois entrar no meu quarto. Abri a cortina e a de Evan encontrava-se aberta, mas ele não estava lá. Suspirei e atirei-me para cima da cama. As palavras de Scarlet e as de Evan misturaram-se na minha mente, avisos sobre o Zayn. Mas havia algo, nele que simplesmente me prendia e não me deixava ir... mesmo que eu quisesse.
Editado: 08/02/2020