Perna de Magia

By PriscilaBarone

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Toni Maro é um jovem com uma doença incurável, problema que lhe ocasionou a perda de uma das pernas. Com o us... More

Prólogo
01 - Encontros e esperança
02 - Magias e dimensões
03 - Curiosidade, quartos vazios e rancor
04 - Segredos e ironia
06 - Confissões e resoluções
07 - Lutas e partida
08 - (Des)Encontros
09 - Rotina, mentes e descobertas
10 - Passado, história e objetivo
11 - A véspera
12 - Conflito, fogo e calor
13 - Lembrança
14 - Elementais, artefatos e conjurações
15 - Batalha e sangue
16 - Pacto, loucura e júbilo
17 - Luta, gelo e água
18 - Passado, morte e vida (parte 1)
18 - Passado, morte e vida (parte 2)
19 - Acontecimentos inesperados
20 - Consciência, poder, despertar
21 - Enfrentamentos e ilusões
22 - Aparências e embates (Parte 01)
22 - Aparências e embates (Parte 02)
23 - Medindo forças
24 - Pesquisas e decisões
25 - Jóia brilhante
Epílogo
Comunicado
Aviso Rápido!
Capítulo Extra - Ren - Sobre Elementais e Fatasmas - Parte 01
Capítulo Extra - Ren - Sobre Elementais e Fatasmas - Parte 02
Capítulo Extra - Irene - Sobre Mentes e Magia - Parte 01
Capítulo Extra - Irene - Sobre Mentes e Magia - Parte 02
Prêmio Wattys 2016

05 - Desespero e calmaria

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By PriscilaBarone

- Eu sabia! Eu SABIA que não devíamos confiar em você! Faz alguma coisa, o meu irmão já tá azul!

- Droga, droga, eu NÃO SEI o que fazer!

Newcomen, o navio de Toni, atravessara a passagem entre as dimensões a toda a velocidade, e assim continuava pelo céu, sem um condutor e sem rumo. As pessoas a bordo estavam desesperadas demais para se preocupar com a direção que a embarcação tomava. O início de noite parecia predizer o destino de Perna de Magia com seu céu agourento totalmente negro, sem lua ou estrelas. Ren gritava a plenos pulmões com Irene, que, angustiada, estava ajoelhada ao lado de Toni, tentando alguns feitiços, porém sem sucesso. Os olhos dele começavam a desfocar, e o corpo padecia de dor, mas escutava as duas perfeitamente. Caso não estivessem tão nervosas, as mulheres notariam que ele sufocava como um peixe fora da água.

- Não adianta, não adianta! Não dá pra desfazer o feitiço daquela velha bruxa dos infernos se eu não souber as posições de mão corretas!

Quando Irene acabara de terminar a frase, Toni a agarrou firmemente pelo ombro e sacudiu um pouco, fazendo com que prestasse total atenção nele. Fez então dois símbolos com a mão esquerda. Ela piscou, como se não entendesse. O rapaz repetiu os dois movimentos, com mais urgência. Em um movimento, os dedos afastados, como se estivesse segurando um copo, mas com a mão na vertical. Em outro, os dedos unidos numa ação parecida com pegar água de um riacho, com a mão em concha. Os olhos de Irene se arregalaram quando tomou consciência.

- Certo, Perna de Magia, e quais eram as outras posições de mão? As que ela fez atrás das costas?

Praticamente gritou na cara dele, a saliva voando. Ele a encarou com puro desespero no olhar. Não sabia.

- Irene, os outros dois movimentos eram assim!

Ren se ajoelhou do outro lado do irmão, de frente para a mulher de cabelos castanhos. Também com a mão esquerda, demonstrou o primeiro movimento: Um golpe seco no ar, como se cortasse algo, com os dedos indicador e médios juntos, porém separados do anelar e mindinho, formando uma espécie de V. O segundo, a mão se fechando, num golpe para baixo.

Num átimo, Irene concentrou todo o seu poder e refez os símbolos a ela mostrados. Findos os movimentos, espalmou ambas as mãos no peito de Toni. Uma luz se desprendeu dos dedos, penetrando o corpo combalido. Quase que instantaneamente, o jovem conseguiu preencher os pulmões com o tão necessário ar, fazendo um chiado enorme. Ren sorriu como uma criança, com lágrimas de alívio escorrendo pelo rosto. Quase o abraçou por impulso, mas ele precisava de espaço para respirar. Irene se jogou de bruços ao lado de Toni, com a cabeça virada para ele, aliviada como nunca se sentiu na vida. Ninguém notou que a perna mágica continuava sumida.

Alguns minutos se passaram em total silêncio, a respiração descompassada do trio se acalmando. A escuridão da noite os envolvia, apenas uma luz fraca vinda do interior da cabine da nau os iluminava. O sentimento de alívio envolvia os três, unindo-os numa comunhão estranha.

Quando a situação se tornou esquisita demais, Toni tentou se levantar. A irmã ajudou, amparando-o com um braço nas costas. Ele se sentou e observou a mulher que acabara de salvá-lo, a qual também se erguera e ajeitara-se com as pernas cruzadas.

- Pode me explicar O QUE FOI AQUILO?

- Longa história, Perna de Magia. Tão longa que dá preguiça.

- Você quase me matou, Irene!

- Er... Tecnicamente, foi você quem pulou na minha frente, lembra? Muito obrigada, aliás. Mas não entendo. Por que fez aquilo?

- Porque é um idiota, inconsequente! Eu também quero saber que porra foi aquela, Antonio!

- Você só me chama de Antonio quando fica brava comigo. Me desculpa, Ren, eu sei que deixei você preocupada... Eu não pensei em nada na hora, só agi.

- Síndrome do herói de novo, Toni? Você tem que enfiar nessa sua cabeça que você não é nenhum merda de herói! Não está aqui pra ficar se preocupando com o problema dos outros, está aqui para não morrer!

- Pra não morrer?

- É, Irene, pra não morrer. Ele tem uma doença degenerativa, vai morrer em pouco tempo. E francamente, você não está ajudando!

Ficou espantada com o conhecimento. Toni, se sentindo péssimo, voltou-se para ela.

- Estou perdendo o movimento dos membros pouco a pouco. Não é algo que me agrada. Acho que é por isso que eu acabo fazendo coisas sem pensar. Prefiro morrer de uma vez a ficar definhando.

O sonoro ruído de um tapa se fez presente na noite silenciosa.

- Ren...

- Eu detesto quando você começa com essa conversinha... Se começar com isso, vai tomar outro tabefe! Ainda há esperança!

- Olha, eu acho que vocês estão muito nervosos... Qual tal irem descansar um pouco?

Toni concordou com a mulher e enfim notou que a perna mágica não estava onde deveria. Concentrou sua energia. Nada. Não conseguia conjurá-la.

- R-Ren... Não estou conseguindo manifestar a perna. Pode me ajudar? Estou sentindo meus braços dormentes também.

Sem uma palavra, Ren passou o braço do irmão pelo pescoço, servindo de apoio para ele. Mancando, o escoltou até o quarto, deitando-o na cama. Ele apagou imediatamente. Ela o cobriu com uma manta leve, desligando o lampião em seguida. Fechou a porta e voltou à proa do navio. Irene ainda esperava lá.

- Precisamos conversar, Dragoa das Águas.

******************

O povo de Rio Contrário era pacato e hospitaleiro, apesar de isolado. Ficava a sudoeste de Kailotron, num local aprazível. A região era acidentada, com muitos vales e depressões, mas Rio Contrário encontrava-se numa planície relativamente grande. Era cortada por três rios paralelos dos quais dois fluíam para o leste. O terceiro rio, o do meio, corria para oeste. Daí vinha o nome da pequena vila. A população era heterogênea, uma mistura de raças. As pessoas que não encontravam ou não se ajustavam aos padrões de seus respectivos povos, geralmente eram muito bem recebidas em Rio Contrário, que prezava pela diversidade. Eram da opinião de que a mistura de raças só tinha a enriquecer e fortalecer os povos originais.

Apesar do dia ensolarado e sem nuvens, flocos de neve caíam suavemente por toda a vila. Pequenos e finamente elaborados, derretiam imediatamente ao tocar o solo morno. Os moradores se regozijaram diante do estranho fenômeno. Correram às ruas, gritando, saudando, abrindo os braços freneticamente para receber a benção dos flocos. Porque aquilo significava apenas uma coisa: que a Dragoa, sua patrona, havia finalmente retornado.

Uma estranha nau voadora se aproximava da cidade, e todos souberam que lá estava sua líder.

- Precisa mesmo dessa demonstração inútil do seu poder?

- Eu gosto de saudar o meu povo, Ira dos Sons. E, nesse caso específico, também é necessário pra que eles não botem o navio de vocês abaixo pensando tratar-se de um ataque.

- Eles seriam capazes disso? - Perguntou uma Ren um tanto desconcertada.

- Bem, sim. Embarcações que voam não são muito comuns, não é?

Ren limitou-se a responder com silêncio. Estava seguindo a sugestão de Irene muito a contragosto. Durante a noite a discussão de ambas havia sido longa.

- Dragoa das Águas? Eu ouvi a Tecedeira dizendo isso, mas não acreditei. Você não pode ser a lendária Dragoa das Águas.

- Você queria o quê? Uma santa virgem com auréola?

- Esperava qualquer coisa, menos você! Que pessoa mais irresponsável, sem noção! A Dragoa das Águas que eu ouvi falar é uma maga incrível, que manipula a água como se fosse uma extensão de seu corpo! A Dragoa das Águas é uma lenda tão improvável quanto a Tecedeira!

- E, no entanto, estou aqui de pé na sua frente... Você me viu manipulando a água, não?

- Sim... sim, mas... mas... você é humana demais! Pra ser um mito as pessoas não precisam ser sérias, altivas e sábias?

- Obrigada por me chamar de estúpida. A Tecedeira não é essa idosa benevolente que você está pensando, sabe. Nós somos pessoas, antes de sermos lendas.

- Mas dizem que a Dragoa das Águas era uma maga muito habilidosa... que lutou na guerra dos 10 anos que ocorreu entre os humanos e os Lenmenthes... Dizem que pode congelar uma cachoeira, respirar debaixo d'água, criar água a partir do ar! Caramba, eu li um livro sobre você! Um livro que te relacionava à necessidade que os humanos possuem de criar deuses para cultuar, e como o fato de você ser uma "deusa" da água demonstra a grande afeição dos humanos à sua imagem, já que se trata de um elemento que é essencial à vida.

- Assim você me encabula. - Irene soltou uma risadinha, fingindo estar envergonhada. - Mas é mais ou menos por aí. E quanto à guerra, só pra você saber, lutei nela por muito pouco tempo. Acho que me dei melhor como conselheira estratégica.

- Você não pode ter mais de 500 anos!!

- Você se surpreenderia com a quantidade de coisas inesperadas que pode acontecer nessa nossa grande Novea... - retrucou Irene mirando fundo nos olhos de Ren. - Eu mesma estou impressionada com você e seu irmão.

- Por que, exatamente?

- Bem, veja... Existem várias magias básicas, comuns, que podem ser feitas por qualquer mago. É padrão, seus sinais não mudam. Vão depender da intimidade do usuário com a magia para que possam ser realizados. Só que existem magias, as chamadas Spells, que são de conhecimento unicamente do mago que as criou. É tipo um golpe secreto, entende? O feiticeiro "combina" com a magia, por assim dizer, que posições de mão ele fará para atingir determinado fim. Aquele golpe que a Tecedeira usou contra mim, por exemplo, era uma Spell. Ela paralisa os pulmões para que o infeliz sufoque, e também paralisa o funcionamento do Coração de Magia para que a vítima não reverta essa condição através de feitiços. Não que algum feitiço fosse ser de ajuda, pois pra desfazer uma Spell, é necessário saber as mesmas posições de mão usadas para realizar essa magia.

- Um Coração de Magia é uma espécie de órgão, não é? Que controla a magia? Eu e Toni também temos isso?

- Sim, vocês já estão desenvolvendo o de vocês, que fica cada vez mais poderoso conforme o utilizam. É como um centro de poder, que vai acumulando cada vez mais energia.

- A Tecedeira mencionou alguma coisa sobre níveis... Isso tem alguma coisa a ver?

- Ah, os níveis dos Omags. Sim, tem tudo a ver. O nível de um Omag é definido pelo número de Corações de Magia que ele possui. Se ele tem dois Corações, é de nível 2. Se tem três, é de nível 3 e assim por diante.

- Então a Tecedeira tem dez centros de poder? Mas por que ter mais de um Coração? Você não consegue ficar forte o suficiente com apenas um?

- Você até pode tornar-se poderoso com apenas um, mas leva tempo. Muito tempo. Obtendo pelo menos mais um, seu nível cresce vertiginosamente, e rápido. Veja, uma pessoa que tem apenas um Coração nem é considerado Omag. Eles chamam essas pessoas pejorativamente de "nível 1". Só a partir do segundo Coração que você ganha a definição de Omag.

- Certo, Irene, mas o que tudo isso tem a ver com o fato de você estar impressionada com a gente?

- Porque um mago que cria uma Spell não quer que ninguém saiba quais os movimentos chave de seu golpe. Se o mago adversário for tão forte quanto ele, poderá reproduzir e usar o truque contra ele mesmo. No caso da velha louca, ela faz os movimentos numa velocidade impressionante que nem eu consigo acompanhar. E ainda por cima, fez outros movimentos nas costas, para que ninguém veja mesmo.

- Bem, os da frente eu não vi mesmo. Mas o Toni com certeza viu. Ele é muito bom com essa coisa de enxergar magia, sabe? Ele já tinha me falado sobre uma esfera de energia se formando no peito da gente, mas eu não dei muita bola.

- Você está me dizendo que ele VIU os movimentos da Tecedeira? Que ele consegue VER o Coração de Magia?

- Sim. Ele consegue ver desde que perdeu a perna. Por quê?

- Porque a magia é invisível, Ira dos Sons. Ela só fica visível aos nossos olhos quando a conjuramos para se manifestar em nosso mundo.

Um silêncio pesado se instaurou entre as duas. Ren ficou observando-a por alguns minutos, como se não entendesse de imediato. Irene aguardou, com olhos atentos.

- Você está querendo dizer que o que o meu irmão consegue fazer não é uma coisa comum?

- Com certeza não. Ninguém vê a magia flutuando por aí, Ira dos Sons. Nem os Omags mais poderosos. Mas isso também não explica como você viu os movimentos que a Tecedeira fez nas costas.

- É como eu disse, ver eu não vi mesmo. Eu ouvi.

- O quê?!

- É, eu ouvi os golpes de ar que ela fez com a mão. Daí eu inferi os gestos.

- Você tá de brincadeira!

- Isso também não é uma coisa comum, né?

- Claro que não, Ira dos Sons, presta atenção! Você consegue ouvir a magia também?

- Se ela tem algum som, quando não foi conjurada, não consigo ouvir.

- Mesmo assim, impressionante. Impressionante! Então você não apenas produz sons altos ou baixos, mas consegue ouvi-los também.

- Bom, sim, é difícil reproduzir algo que você não escuta, não é?

As duas se encararam em silêncio por alguns minutos. Então, Irene finalmente desviou o olhar para o firmamento sem estrelas. Ficou quieta por tanto tempo que Ren considerou se retirar e dar uma olhada em Toni. Quando ia exatamente fazer isso, a chamada Dragoa das Águas a interrompeu.

- Gostaria que me desculpasse, Ira dos Sons. Por favor, venham à minha vila para que possamos cuidar melhor do seu irmão.

- Ir à sua vila? Por quê?

- Gostaria de ajudar o Perna de Magia. Obviamente, eu sou a responsável por tudo isso. Em seu atual estado, seria melhor que ele pudesse descansar em terra do que continuar em viagem. Assim poderia se recuperar mais rapidamente. Haveria também vários curandeiros apenas a serviço dele.

Ren ponderou a oferta. Deveria pensar no que seria melhor para Toni. Por mais que detestasse Irene e desconfiasse dela, de fato o ideal seria que seu irmão pudesse se restabelecer em terra. O plano original da moça era levá-lo de volta para a casa deles, numa região bem mais ao norte, mas a viagem levaria vários dias.

Desta forma, ali estavam os três, com o povo saudando a chegada de sua patrona sob o cair dos flocos de neve. Ren jamais diria algo a Irene, mas estava bem impressionada com a quantidade de gente a recebê-la tão calorosamente. Na verdade, dava a impressão de ser a vila inteira.

Mas seus dias de descanso não durariam muito.


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