— Veneno feérico, Lucien? — Azriel deu um passo a frente, inquieto — Não faz sentido você se arriscar dessa maneira!
— Feyre ficou bem — argumentou Lucien — Durante os últimos dias na Corte Primaveril ela sentiu o laço de parceria com Rhysand abafado, e descobrimos antes de fugir que Ianthe estava colocando veneno feérico em nossa comida.
— Eu não vou deixar você se envenenar!
O illyriano avançou para tentar pegar o frasco, mas Lucien fez o objeto sumir com um estalar de dedos.
— Eu já comecei a tomar.
— O quê? — o mestre-espião levantou os braços como se esperasse que ele desmaiasse a qualquer momento. — Eu vou buscar a Madja, nós podemos...
— Eu estou bem — Lucien apoiou as mãos no peito de Azriel e o ouviu engolindo em seco, os olhos avelã esquadrinhando seu rosto. — Não tomei o veneno puro, como a Ianthe nos obrigou a tomar. E, mesmo daquela vez, levou dias para nos enfraquecer.
— É veneno, amor! — as mãos grandes seguraram os braços de Lucien. — Não sabemos que efeitos pode causar em você ao tomar pela segunda vez! Foi o Helion quem sugeriu isso?
— Não, e ele também ficou tão animado quanto você com a minha ideia — Lucien deu um sorriso de lado para Azriel — Eu contei a ele enquanto estávamos na Corte Crepuscular. E não é veneno puro; essa é uma versão refinada para ter o efeito de um medicamento. Aliás, mesmo o veneno puro levou dias para afetar a minha magia na Primaveril, eu vou ficar bem.
— Eu não gosto disso.
— Será útil também agora que preciso treinar Koré. Não sabemos quanto tempo precisaremos ficar em Velaris antes de Eris arrancar a cabeça do Beron e todos estarmos livres... Será mais uma maneira de manter a magia da Corte Diurna sob controle.
— A proximidade... o laço... — Az franziu o cenho e passou o dedo pelo maxilar de Lucien — A parceria está afetando você? Esse é o problema? Por que não esperar?
O coração de Lucien acelerou e ele desviou o olhar. Aparentemente as sombras tinham respeitado seu pedido e não contado a Azriel sobre o que poderia ter acontecido com Elain no jardim escuro.
— Não exatamente a proximidade, mas... Elain tem estado estranha, e eu senti um puxão incômodo todo o tempo em que estive no Solar hoje mais cedo. Por algum motivo Elain cismou que quer ser amiga de Koré, e Feyre ofereceu um trabalho a Koré, então imagino que passaremos mais tempo lá. Por isso tomei a primeira dose antes de irmos pro Rita´s.
— Eu não gosto disso — Azriel repetiu fracamente.
— Prefere me ver distraído pela Elain? — a pergunta escapou antes de Lucien conseguisse se controlar. A lembrança da noite em que saía do Solar e quase beijou a parceira ainda o assombrava. Não, não se arriscaria de novo.
— Prefiro você seguro. Sempre. — Az inspirou fundo e segurou o rosto de Lucien — Não importa o que aconteça com Elain, não vale a sua segurança. Não importa se você reparar cada vez mais nela.
— Importa para mim, se eu for magoar você — Lucien fez o frasco reaparecer e o entregou para Azriel — Não é a mesma versão que Ianthe usou para nos prejudicar, os alquimistas da Corte Diurna se certificaram disso. Helion jamais me enviaria algo que pudesse me adoecer.
— Promete que vai parar de tomar se sentir que está enfraquecendo sua magia?
Lucien apertou os lábios em uma linha fina e puxou Azriel para sentar na cama ao seu lado. Ele pegou o frasco da mão do encantador de sombras e o colocou novamente na mesa de cabeceira.
— Lucien...
— Az, você mesmo disse que eu fui mais rápido que você e o Cassian, mesmo eu tendo tomado apenas a primeira dose... Um cortesão mais veloz que dois guerreiros illyrianos é algo que chama atenção. Não sei o quanto da magia que herdei do Helion está esperando para explodir. Talvez seja mais prudente estar um pouco enfraquecido... — argumentou Lucien.
— Não gosto disso, mas obviamente não conseguirei convencê-lo do contrário hoje.
Lucien se inclinou em sua direção e o beijou. O illyriano se afastou delicadamente quando as sombras sibilaram em seu ouvido.
— Espera, amor — Az deu um suspiro cansado — Eu preciso contar algumas coisas, não quero mais esconder nada de você.
— Ah... Agora sou eu que não estou gostando disso...
— Nós tivemos tantos problemas por não falar algo — disse Azriel — Não quero que magoemos um ao outro novamente por isso...
— Tudo bem — Lucien concordou com a cabeça. — O que é tão importante?
— Você precisa entender que eu não estava escondendo nada de você, só estava esperando a oportunidade de contar...
— Agora eu estou oficialmente preocupado.
— Não é nada grave — Lucien arqueou uma sobrancelha e Azriel hesitou — Tudo bem, algumas coisas são... Não fui eu que contei, mas o Rhys e a Feyre sabem que o Helion é seu pai desde antes da queda da Muralha.
— O quê?! Como...?!
Lucien se levantou em um pulo e, antes de continuar a falar, Azriel pediu silenciosamente piedade ao Caldeirão.
— Você se lembra que Eris nos contou que te protegeu do Beron e avisou o Tamlin para que te resgatasse, certo?
— É claro que eu me lembro... — que você não me contou isso. Lucien mordeu a língua para não completar a frase; não havia motivo algum para trazer um erro de Azriel a tona no exato momento em que o macho se esforçava para não repetir esse erro.
— Bem — Azriel se levantou com as palmas das mãos voltadas para Lucien —, eu juro que realmente não sabia do resto até pouquíssimo tempo. Feyre descobriu sobre o caso que o Helion e a sua mãe tiveram e... percebeu.
— Percebeu? — repetiu Lucien, incrédulo — Ela descobriu uma coisa que o Eris e minha mãe esconderam por séculos de toda Prythian? Isso é impossível, Az!
Az deu um passo para frente, tocando levemente o braço de Lucien. O mestre-espião tinha se preparado para ver o rosto de Lucien se contorcer na mesma expressão de raiva e traição de quando descobriu que Az não lhe contou sobre Eris, e ficou aliviado por ver que não havia nenhum tipo de ressentimento direcionado a ele.
— Eu sei o que parece, mas Rhys jurou que eles não invadiram a mente de nenhum de vocês — Azriel segurou os braços de Lucien só porque podia, só porque o macho não estava magoado com ele como naquela noite da Corte Crepuscular — Feyre estranhou que Eris tenha se preocupado em proteger você... lembre que, para o Eris que nós conhecemos por séculos, não fazia o menor sentido... Então ela soube sobre Helion e sua mãe, percebeu a semelhança entre vocês e as peças se encaixaram.
— Pela Mãe! — Lucien começou a andar de um lado para o outro, tentando raciocinar — E eu pensando em como contaria para eles... Quem mais sabe? e por quanto tempo sabem?
— Na noite em que acordei, Rhys contou para Cassian e para mim. Por isso ele pediu que você saísse. — Az umedeceu os lábios — E na Casa do Vento o chicote de fogo que você lançou no Cassian quebrou o escudo que ele criou com os sifões também...
Sem parar de andar de um lado para o outro, Lucien arregalou os olhos para Azriel.
— Bom, então ele não se surpreendeu quando eu impedi suas sombras de apagarem as chamas essa noite.
Azriel murmurou em concordância e Lucien finalmente reparou no quanto ele parecia nervoso, esperando que Lucien explodisse com ele. Então se obrigou a parar de andar e respirar fundo antes de falar.
— Por que contar quando estávamos preocupados com você?
— Por causa da segunda coisa que eu preciso contar para você...
— Ah, Caldeirão! — resmungou Lucien ao se sentar na cama — O quê?
As sombras deslizaram como cobras nos ombros de Azriel enquanto o encantador de sombras abria e fechava a boca. Precisava contar sobre a visão do futuro deles, mas não poderia contar tudo porque significaria arriscar que a visão jamais se concretizasse. Az prometeu a si mesmo que assim que todas as cenas felizes que Rhys lhe mostrou acontecessem, contaria tudo a Lucien. Até lá, precisava editar a verdade para garantir a felicidade dos dois.
— Eu estou ficando mais preocupado... — Lucien amarrou o cabelo ruivo em um rabo de cavalo descuidado — Só fale, por favor.
Lucien ficará preocupado com a falta de limites de Elain? Vai se preocupar que nós a estejamos deixando infeliz? Mas eu preciso contar, especialmente por ela ter dado um chá estranho para Koré e ter ficado ansiosa quando Lucien olhou para a xícara... Eles acabarão ficando mais expostos a ela, não tenho como protegê-los sem alertá-los...
— Amor? — Lucien se levantou e segurou as mãos de Azriel. O encantador de sombras não gostava de falar sobre sentimentos, mas geralmente não hesitava ao falar de acontecimentos. — O que houve?
Encarando o olho avermelhado e o olho dourado, Azriel despejou tudo em um jorro de ansiedade:
— Elain descobriu sobre eu e você em uma visão, e foi por causa dela que passei dias dormindo. A tal planta misteriosa que você queimou... ela usava para fazer um chá que me mantinha dormindo, por isso as sombras começaram a impedí-la de entrar no meu quarto, e por isso elas tentaram avisar você e estavam tão agitadas para falar como quando finalmente acordei. E acho que a Elain deu esse mesmo chá à Koré hoje por ciúmes da proximidade de vocês.