Capítulo 39

931 102 36
                                    

Passado

Ir caçar era uma das poucas coisas que poderia espairecer a sua cabeça quando estava em Ílac. Não que Evelyn fosse uma má pessoa, ele gostava dela, mas não queria ela. Contudo, ele tinha um dever a cumprir e faria conforme foi treinado, ainda que tivesse que sorrir com satisfação para o rei Miles todas as vezes que o encontrasse, além de ter que desviar o olhar da direção que realmente queria ir. Além disso, a rainha o olhava de uma forma estranha e ele preferia mil vezes estar longe dela.

Ílac era conhecido pela floresta densa e seus animais, além dos pastos verdejantes que proporcionavam um belo local. A primeira vez que saiu para caçar lá foi sugestão do rei Miles, haviam ido todos juntos. Agora ele ia apenas com os irmãos, uma rotina que já havia sido estabelecida em cada viagem que faziam.

Estar longe do pai também era um refrigério. Será que era por isso que seus irmãos o acompanhavam?

Aquele era o único momento que ele deixava de lado a responsabilidade de ter que abandonar o seu reino, o seu legado em Medroc, para ir a uma terra estrangeira, assumir um trono que nem mesmo seria totalmente seu. Afinal, Miles treinara a filha para ser mais do que um vaso ornamental.

Não.

Evelyn entendia cada ponto do seu império. Ela era inteligente, tinha uma boca esperta e lutava como um bom soldado.

Se fosse lhe perguntar, não era isso que ele escolheria. Dividir o trono com outra pessoa...

Aliás, dividir não. Ele sabia que estava em desvantagem ali. Dificilmente os aldeões e o restante do reino o olharia como olhavam para Evelyn - que tinha o sangue puro de Ílac. Ele era o filho do inimigo, uma peça na artimanha de paz entre os reinos. Nenhum deles tiveram escolha.

Era por isso que ele precisava em toda maldita viagem colocar o seu melhor sorriso, buscar uma simpatia que ele basicamente nunca aprendeu a ter e tentar ser a pessoa mais sociável que pudesse, afinal, ele precisava ser idolatrado pelo menos o mesmo tanto que sua futura esposa seria ao assumir o trono. Se Evelyn carregasse metade do clamor que Miles levava, o povo beijaria os seus pés sem pestanejar.

Ele respeitava Evelyn. Mas, ainda assim, não era o que desejava, era apenas o que deveria ser feito.

Tudo isso era cansativo. Ele sempre foi o que o pai desejou, o filho amado que cumpria todas as exigências e tinha a estima muito elevada em Medroc. Claro que Rory jamais mandaria o seu querido filho para ser um capacho. Na cabeça dele, o filho poderia tomar as rédeas de Evelyn e Medroc teria indiretamente o poder sobre Ílac. No tardar, com alguns anos, poderiam dar um golpe e tudo seria território da família Buckhaim.

Contudo, Henrique sabia que não era bem assim, mas contrariar o pai também não estava nos seus planos.

No fim das contas, tudo resumia a exaustão. Construir uma imagem para o pai, outra para o rei Miles e outra para sua futura esposa. Talvez seja por isso que ele olhou para um fruto proibido, alguém que nunca poderia ter. Talvez fosse a sede de aventura, a vontade de ser ou fazer algo por ele próprio pela primeira vez.

Mas até isso o tempo apenas sufocou.

Então estava ali, junto com seus irmãos - infelizmente -, para esquecer por um momento tudo e descarregar a raiva por ser enfiado em um acordo que ele nunca quis, em primeiro lugar. Por um breve momento ele desejou abrir mão de tudo, seguir o que o seu íntimo ansiava, ou melhor... alguém. Mas Rory sempre estava um passo à frente. Portanto, ele preferia estar agora ao lado do irmão que o odiava e vivia cobiçando a sua futura esposa, e o outro que o olhava como um cachorrinho, esperando uma aceitação que ele nunca daria. Nunca foram próximos afinal.

Trono de SangueWhere stories live. Discover now