- Derrotas, Vitórias e Mais Derrotas -

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Quando ele terminou de cair sem vida, Eurene enfim afastou-se do corpo e respirou profundamente. Estava muito ofegante e com o rosto suado, além de completamente suja pelo banho de sangue. Antes mesmo que pensasse em se sentar para descansar, lembrou-se de Devin. Ela saiu em disparada para encontrar o irmão. 

O empasse entre os andors ainda se prolongava pela rua, ambos demonstravam máximo empenho em derrotar o adversário. A ponta dos bastões pretos agora emitiam uma luz branca quando se chocavam um contra o outro. Em dado momento, Umeril atacou Idarcio sucessivas vezes com golpes verticais e horizontais. O andor andarilho ficou na defensiva apenas bloqueando as investidas, mas chegou a um ponto em que seu bastão parecia ter perdido toda a resistência que demonstrou até então, pois ele partiu-se ao meio quando Idarcio o ergueu sobre a cabeça para parar um ataque. 

Idarcio viu-se perdido enquanto olhava para as duas partes do objeto em suas mãos. Sem um bastão ele dificilmente conseguiria derrotar um adversário que assemelhava-se a si, tanto em poder como em astúcia. 

— É notável que você possui experiência em combate — disse Umeril em posição superior. — Mas claramente não domina feitiços poderosos. No fim não passa de um mendigo ou um vagabundo.

Mas Idarcio não estava lutando sozinho, Filo aproximou-se do andor inimigo e mordeu ferozmente seu tornozelo. Ele deu um pulo de susto e praguejou aos céus contra aquele animal selvagem, segundo suas palavras. Foi nesse momento que Idarcio aproveitou para golpear o adversário com um dos pedaços do bastão em sua mão. A pancada foi tamanha que Umeril caiu no chão aos gemidos e levou as mãos no rosto para conter o sangramento. 

— Mendigo ou andarilho. Mas andarilho é um termo mais gentil. — Idarcio livrou-se do que restara de seu bastão e abaixou-se para acariciar Filo. — O que seria de mim sem você ao meu lado, meu amigo? — E o animalzinho fartava-se de alegria pelas carícias. 

Não levou muito tempo para que Borbon e Roren derrotassem seus adversários restantes, embora tal tarefa exigisse grande empenho por parte dos dois. Mas no fim eles conseguiram, mataram os soldados de forma eficiente e rápida, sem muita agonia ou sofrimento por parte destes. Já Fenuella, ainda divertia-se com o único dos três combatentes que enfrentava. O homem esforçava-se arduamente para vencê-la, mas todas as suas tentativas mostraram-se em vão. Fenuella chegou a perguntá-lo se gostaria de desistir, mas como ele respondeu com mais ataques ferozes, ela interpretou que a resposta seria não. Após um curto período de golpes em vão, a princesa pôs fim ao embate perfurando-o pela retaguarda e dando-o uma morte rápida e isenta de longa agonia. 

— Foi uma boa descontração — disse ela observando os corpos ao redor. 

Apesar de não restar vivo mais nenhum dos treze soldados vordianos, a batalha na rua da cidade não estava completamente encerrada pois Mercel e o comandante Norben ainda se empenhavam na tentativa de derrotar um ao outro. 

Nenhum dos dois apresentava marcas de golpes provocados por socos ou cotoveladas, tudo se limitava no choque entre as espadas. Norben demonstrava destreza em seus movimentos, embora seu manto negro o atrapalhasse de vez em quando. Já Mercel era firme como um poste e ao mesmo tempo ágil como uma lebre; usava a lâmina para atacar e para se defender. Chegou-se a pensar que seria uma desonra para ele usar técnicas ocultas como um punhal, mesmo que fosse para salvar sua vida. 

— Mate-o logo, comandante! — Finnan ordenou ainda montado em seu cavalo, assistia o duelo com grande expectativa e impaciência. 

Em meio a luta, os dois aproximaram-se um do outro pois travavam uma disputa de força bruta. Norben golpeou o estômago do cavaleiro com seu joelho, este afastou-se e encolheu-se para tossir, foi nesse momento que o oficial desceu-lhe a espada. Mercel ajoelhou-se e pôs a sua lâmina sobre a cabeça para defender-se, ambos ficaram nesse embate de força. 

— Eu vou ajudá-lo. — Fenuella empunhou sua espada novamente mas foi interrompida por Borbon. 

— A luta é dele, nenhum de nós pode se intrometer. 

O comandante empregava grande força para descer sua espada e Mercel empenhava-se em impedí-lo. Foi com um repentino movimento que ele livrou-se da situação jogando a lâmina do rival para o lado e imediatamente cravando a sua própria no estômago deste. Norben encolheu-se e gemeu de dor, logo ajoelhou-se e levou a mão no ferimento. Mercel não vacilou, pôs-se de pé e se posicionou atrás do comandante ajoelhado. 

— Olhe para a sua frente — disse ele em um tom autoritário, e assim o oficial fez. — Esses que está vendo, são os guerreiros que irão destronar o seu rei. 

Mercel ergueu verticalmente sua espada acima da cabeça do militar ajoelhado e virou a ponta para baixo. Sem hesitar, ele violentamente desceu a lâmina e atravessou o crânio daquele homem que estremeceu com o impacto. Todos que assistiam a cena puderam ver a fúria na face do cavaleiro. Ele desceu a espada mais duas vezes até que a lâmina saísse por baixo do queixo da vítima. 

— Não é possível... — Os olhos de Finnan lacrimejaram, e nem mesmo ele sabia dizer o por quê. Se sabia, não teria a coragem para confessar. 

O príncipe olhou o ambiente à sua frente e sentiu temor ao constatar os corpos dos treze soldados com os membros decepados ou perfurados. Agora o tapete de sangue sujava toda aquela rua e também as paredes das casas nas calçadas. O andor de branco aparentemente jazia desmaiado. Mas o que mais fazia o príncipe sentir medo era ver o corpo de Norben sem vida. Finnan estava totalmente desorientado. 

— Não pensem que isso é uma vitória, seus imbecis! — ele esbravejou mordendo os lábios de fúria. — Meu pai vai mandar um batalhão para matá-los. Todos vocês vão morrer, nem que ele tenha que mandar um exército para cá. 

— Você não devia fazer ameaças quando está em desvantagem, mocinho — Fenuella o repreendeu. 

— Acha mesmo que estou em desvantagem?! Eu sou o Príncipe de Vordia, garota estúpida. Tenho centenas de soldados debaixo de minhas ordens na cidade.  

— Pode até ser, mas eles não vão chegar aqui a tempo de impedir que eu mate você. 

— Não vou lutar contra você aqui, seria uma desonra para mim. Como um príncipe real, possuo direitos de hospedagem, vocês não podem me machucar sem a permissão do rei idiota daqui. Por isso exijo que saiam do meu caminho para que eu possa negociar com o...

Finnan mal pôde terminar de pronunciar seus direitos reais pois foi atingido violentamente no peito por um feitiço luminoso. O rapaz caiu de seu cavalo e sua armadura provocou um alto barulho quando chocou-se contra os blocos do chão. O cavalo que ele montava assustou-se com o repentino fenômeno e bateu em disparada relinchando e criando faíscas com sua ferradura.

Um pouco mais atrás de Fenuella, Idarcio abaixava o bastão que havia acabado de tomar das mãos do desmaiado Umeril.

— Mmm, este funciona tão bem quanto o meu, aparentemente — disse a si mesmo analisando o objeto. — Sei que isso foi uma atitude inadequada, meus amigos, mas eu não estava mais suportando ouvir as palavras orgulhosas desse rapaz prepotente. 

Finnan gemeu de dor pela queda e virou-se no chão para se sentar. Quando ergueu sua cabeça para cima, viu-se cercado pelos três cavaleiros, uma princesa, um andor e um flito. 

— Você não vai negociar com o rei daqui, Príncipe de Vordia — Fenuella afirmou de forma imponente. — A partir de agora, pode se considerar como o nosso prisioneiro.



A Pretensão dos CavaleirosWhere stories live. Discover now