Capítulo 17

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Quitéria aparentava irritação, andava pelo bordel para lá e para cá, parecia perdida. Ouviu alguém bater palmas e chamar do lado de fora, lá da rua; estranhou na mesma hora, pois não era o dia de medirem a luz ou a água. Prendeu os cabelos no alto da cabeça, ajeitou a saia e foi em direção à porta. Sempre foi costume de ela olhar pelo olho mágico, mas nesse dia ela não fez. Uma por uma foi destravando as trancas, abrindo as fechaduras e botando os cadeados de lado. A porta foi abrindo aos poucos, a claridade do dia ofuscou a vista já cansada. Do lado de fora em pé de sorriso encabulado no rosto estava Cláudio, o pastor da igreja vizinha do bordel.

- Bom dia senhora! – Disse ele timidamente.

Só podia ser um sonho. Não podia ser possível, o dono da igreja frente a frente com Quitéria, a dona do bordel.

- Bom dia! – Quitéria respondeu. – O que o traz aqui? – Questionou a cafetina.

- Bem, só vim aqui lhe pedir desculpas pelo ocorrido, a Matilde...

- A Matilde quer acabar com o bordel, eu sei, não precisa vir me dizer.

Quitéria foi entrando. Enquanto começava a puxar a porta para ser novamente trancada um impulso surgiu de não se sabe onde e Cláudio segurou as mãos dela.

- Não é nada disso. Ela me contou o porquê da briga de vocês e que se arrepende muito.

- Pastor, o senhor acredita nessa mulher? Eu não sei quanto tempo ela frequenta a sua igreja, mas eu a conheço faz mais de trinta anos. Eu sei muito bem do que ela é capaz.

- Eu entendo, mas as pessoas podem mudar, ou a senhora não acredita nisso?

- Acredito e muito, mas existem casos e casos. O da Matilde, por exemplo, é um caso perdido.

- A senhora sabe que o poder da oração pode libertar as pessoas de erros do passado?

- Sim, eu vivo rezando. Não é porque eu seja uma cafetina, uma puta de profissão, que eu não acredite em deus, pelo contrário, rezo todas as manhãs e a noite após concluir o serviço. Peço proteção a mim e as minhas meninas e oriento que elas façam o mesmo, mas a Matilde, não dá. Desculpe-me.

A resposta de Quitéria foi arrebatadora. Cláudio se calou e ficou parado na frente dela. A cafetina só observava o jeito do pastor e também não falou nenhuma palavra, aquilo que precisava ser dito já estava de bom tamanho.

- Mais uma vez eu lhe peço desculpas. Prometo que nunca mais a Matilde, e nem ninguém da minha comunidade irá importunar o seu...

- Bordel. – Completou Quitéria.

- Exato, o seu bordel. Tenha um bom dia, passar bem. – Disse o pastor acenando com a cabeça e se retirando logo em seguida.

Quitéria parou por um instante na cozinha. Algumas meninas limpavam o recinto, uma lavava a louça, uma varria o chão, e duas conversavam.

- As duas aí. – Disse ela apontando para as duas moças de cabelo preto. – Vão se mexer, ajudar no serviço, ou vão continuar de fofoquinha? – Bradou a proprietária do bordel.

As moças pararam na hora e saíram. Cada uma foi para um canto.

- Eu não quero ouvir futrica aqui dentro, deu pra entender?

Quitéria começou a subir as escadas que levavam até os quartos.

- E a Francine? Alguém a viu?

Uma das moças, a que varria o chão respondeu.

- Dona Quitéria, eu a vi saindo hoje cedo, só não sei pra onde ela foi.

Quitéria ficou em silêncio, subiu mais alguns degraus, parou, apoiou uma das mãos no corrimão, virou-se lentamente e olhando pra menina disse:

- Quando ela chegar faça o favor de mandá-la para os meus aposentos. Entendeu?

-Entendi sim senhora. – Respondeu a moça.

Quitéria abriu a porta do quarto, era enorme e bastante confortável. A cama era de casal enfeitado com lençóis de seda e diversos travesseiros faziam parte da decoração. Deixou o corpo cair e relaxou fechou os olhos e em poucos segundos estava dormindo.

Em nome do paiWhere stories live. Discover now