29• Silence.

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"Quem se mata corre atrás de uma imagem que forjou de si próprio: as pessoas matam-se sempre para existir" – André Malraux

            Anestesiada.

A única prova de que estou viva, são meus olhos opacos enxergando as terras, muitas terras sendo jogadas.

Não sou capaz de identificar os sons ao meu redor, mas imagino que estejam orando.

Não sou capaz de sentir o meu corpo, mas imagino que meus joelhos diante de vários longos minutos sob o chão estejam castigados.

Silêncio.

Nem as batidas do meu coração sou capaz de ouvir, mas imagino que meus batimentos cardíacos possam ser ouvidos a quilômetros de distância.

Querida, levante-se!

É mentira a frase motivacional "Tudo passa", porque eu sei que essa dor nunca vai passar. De forma alguma. Se é insuportável para mim, como deve estar sendo para aquela que lhe deu a luz?

Emma, vamos! Eu sei que doi, filha... mas temos que ir...

Estou alheia a minha volta, contudo, diante de meus olhos, não vejo nada além de flores.

Nem lápide tem.

Tão precoce e tão nova. Mais uma vítima.

A última.

O maldito finalmente fora preso. Ele arrancou um pedaço de mim, matou uma parte de Beatrice, e arrancou de Billie as chances de ver a irmã crescer.

— EMMA! – meu corpo dá sinais de vida, mas não é o suficiente para me fazer agir. Tão perto, mas meus sentidos não notaram a sua aproximação. Há quanto tempo Shawn está ajoelhado em minha frente? O peso em meus ombros, são o peso da minha angústia, contudo, não consigo proferir uma palavra para o fazer retirar suas mãos dalí. — Sua mãe tem te chamado tem alguns minutos, você precisa levantar.

Esquadrinho seu rosto com meus orbes vazios, demorando a entender o seu pedido, porém as minhas pernas não obedecem o comando de meu cérebro, e preciso de seu auxílio para me manter em pé.

De repente, só havia nós alí.

Eu, mamãe e Shawn.

Corro meus olhos em direção a minha mãe, recebo um sorriso banhado em lástima e um olhar de compaixão.
Suas mãos substituem a de Shawn, e me guiam até um carro amarelo com faixas pretas. Um táxi.

Sou auxiliada para entrar no banco de trás, deslizo o meu trazeiro para o outro canto, dando um espaço para Shawn se juntar a mim, mas ele faz ao contrário, em vez de adentrar e se acomodar, ele fecha a porta do carro.

Minha mãe ocupa o espaço ao lado do motorista. Seu pescoço gira em minha direção, e suas órbitas me lançam um olhar de culpa por ter que me deixar sozinha num momento dolorido como este.

Não a culpo, sabendo do seu dever de ter que trabalhar.

Minutos depois, o taxi estaciona na rua de minha casa. Levo alguns segundos para entender que eu deveria me deslocar para fora do automóvel, e quando minha mãe abre a porta para mim, me arrasto, juntando-me a ela debaixo do céu nublado de Wiserood.

— Escute meu bem...– sou tomada pelas suas mãos em meu rosto, paralisando a minha face para que minha total atenção seja em suas palavras — Isso, é extremamente difícil, mas agora, Billie está em um lugar melhor. Nada do que aconteceu é sua culpa, e lembre-se dos momentos bons que já viveram – meus olhos marejam, eu pensei que nem tinha mais lágrimas para chorar — Infelizmente vou ter que ir agora, mas Geoffrey estara aqui com você, logo. Okay, meu bem!?— assinto com a cabeça,  minhas bochechas ficam úmidas num choro silencioso — Eu te amo, Emma! Eu te amo, meu amor.

Os braços cobertos por lã me envolvem, transmitindo-me todo o carinho e aconchego fraternal que há dias eu não o sentia.

🌆

Não sinto fome.

Me pergunto se Aurora ficou assim no seu luto por Chloe, com o corpo desfalecido na cama e só a mente funcionando. Todavia, com meus pensamentos vagando pelos dias de lutos de Aurora, ela nem de casa saía.

Assim como eu.

Quatro dias no meu quarto sem vontade de ter contato com ninguém. Na verdade, ninguém fez questão de comparecer para saber sobre meu bem estar, a não ser por Geoff que em dez e dez minutos aparece na minha porta entre-aberta, para certificar que eu não cometi suicídio.

Nem ao menos meu pai apareceu.

O reflexo no espelho mostra uma garota vazia, quebrada e morta. As olheiras é evidente, e o cabelo curto totalmente desgrenhados.

Eu não me reconheço.

Desvio meus olhos para a garota refletida em minha frente, olhando meus pés sob a água morna que, até então, não havia ali sobre o chão, e percebo que esqueci a torneira da banheira ligada. Desligo-a, checando a temperatura do líquido transparente. Entro. Um pé, depois o outro.

Mergulho meu corpo enfraquecido, encostando minha cabeça na borda, sentindo minha pele se aquecer. Fecho os meus olhos, mergulhando-me na escuridão, a qual eu venho almejando durante meu luto.

Escorrego-me. É como se algo estivesse me puxando para o fundo, até eu ficar submersa. Contudo, eu sei que é o meu consciente buscando por paz, por isso permito-me ficar submersa.

Sem respirar.

Ignoro o meu cérebro quando desesperadamente ele manda alertas para o meu corpo. O espasmos sombrios não são os suficientes para me fazer agir no impulso e buscar por ar. Estou fraca demais para obdece-los, e me sinto cada vez mais fraca quando o esperado acontece...

Me afogar.

Dizem que quando estamos de frente com a morte, a nossa vida passa como um filme na nossa mente. Talvez seja mentira, já que eu não consigo nem lembrar o meu nome.

Me sinto relaxar, e sei que é o fim.

Acho que estou na zona de limbo, pois consigo detectar algumas vozes, e mãos puxarem o meu corpo.

Agora não sei se são os anjos me levando para o céu...

Ou, os meu demônios me levando para o inferno.

Shawn The KillerOnde as histórias ganham vida. Descobre agora