XV - O MAGÍER RETORNA

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— Como dizia, meus senhores, errei! Errei de forma tão miserável que por algum tempo achei que, ao voltar a Vulkermónt, cidade na qual por anos aconselhei meu príncipe e o pai deste antes, Reijak VI, já não existiria; achei que nada de vida restaria em meu soberano e senhor! Agradeço ao bom Arkik por isso, como agradeço! — A luz âmbar do cajado ora iluminava-lhe as feições do alto, ora lançava sombras oblíquas no rosto antigo, resultando numa aura mística antes inconcebível para o capitão simplório, que nada entendia do mundo da magia. O velho voltou-se ao príncipe e, após um suspiro cansado, revelou: — Há um mal, meu príncipe, muito além do que imaginamos.

Algum tipo de alquimia macabra ocorreu no rosto do príncipe, e o semblante leve e sorridente transformou-se numa carranca plúmbea, pesada e fosca como o próprio elemento.

— Externe-o, senhor, é o que queremos! — ordenou ele por fim.

— Prestem muita atenção no que contarei; não temos muito mais tempo se quisermos salvar o reino daquilo que enfrentamos! Prestem bem atenção, relato agora com a maior sinceridade o que me ocorreu nesse tempo de ausência: esta estupidez que cometi! — exclamou Raërn. — Como bem sabe, meu príncipe, ordenei que meu acólito lhe informasse de minha viagem. Achei por bem não incomodar com minha presença e, principalmente, não ser alvejado com perguntas, pois o bom criador apenas sabe, como o senhor não se satisfaz antes de uma dúzia de perguntas bem respondidas, meu bom príncipe: eis uma qualidade, é o que acho, não me leve a mal! Mas não poderia respondê-las àquela hora, mas o tempo chegou!

Raërn mexeu-se inconfortável e deu início ao relato:

— No início do inverno, quando do alto da torre avistei a Veiramónd, a lua verde, a esmeralda dos céus, só então, e não antes — e já somam-se quarenta e oito dias completos — decidi partir em viagem! Aonde? perguntam-me os senhores com olhos inquisidores, pelo que bem vejo. Aonde mais? A Hájen, é claro!

Os ouvintes ficaram atônitos, e então lívidos, e por fim perguntou o príncipe, a máscara plúmbea ainda mais carregada:

Sozinho?! A Hájen?! Peço que se explique, magíer. Explique-se! Nenhum homem voltou àquelas bandas desde— — Explique-se, senhor, suplico!

— Sim, a Hájen! Paciência, senhor. Como disse, a história será longa e pretendo esmiuçar os detalhes relevantes para que então saibam tudo que sei e adoeçam, como eu, ao debruçarem-se em perguntas sem respostas — pois admito eu mesmo não compreender tudo que cerca o mistério!

Mexeu mais uma vez os ombros, como que procurando posição confortável para levar o longo relato a cabo, e voltou a falar:

— Pois bem! Meu bom Teriá, como sabem, é como o senhor, meu príncipe, pois não se sacia com qualquer resposta! Oh, não, põe-se a perguntar diretamente sobre minhas empreitadas, e, quando não obtém resposta, as faz indiretamente. Diferente de como o trato, meu bom nobre, pois alegro-me genuinamente em tratá-lo com reverência e mesura por ser tão justo e digno, o mesmo não vale para o meu acólito: ameaço-o, senhores, e meu pobre companheiro apressa-se a fazer o que ordeno, e não raro esquentei-lhe as orelhas após suas sabatinas.

"Pedi que lhe avisasse e que não me inquerisse sobre a rota que eu tinha a seguir, e foi o que Teriá fez, até onde sei, pois escapei logo depois. Tomei meu rumo a Skjaldrøvík a bordo de um pequeno barco comerciante, pagando uma pequena fortuna pela discrição e— — Acalme-se, príncipe! Já explico, já explico! Sim, Skjaldrøvík, senhores, pois um homem, sozinho como sou, não pode simplesmente marchar em direção a Hájen. Sei do poder que tenho nas mãos com o meu arken, bem como o que dizem de mim, das minhas habilidades e façanhas, sei bem, mas não me atreveria a subestimar meus inimigos. Não desta forma! Então fui àquele reino maldito, meu bom príncipe, porque, conhecedor como sou da genialidade dos homens simples à maldade, não subestimaria o indizível poder dos vis que deviam controlar Hájen, mesmo que então não soubesse da verdade.

"Como um adendo, visto que pretendo revelar tudo que me ocorreu aos senhores, devo contar primeiramente de um antiquíssimo amigo da Ordem Magíera. Chama-se Uléster, senhores, guardião de Steensark; Uléster, o desbravador das Monhas Azuis, o magíer protetor da Arca, portador de um arken, como eu, este, sim, digno de todas as estórias e lendas que se desenvolveram ao redor do seu nome, pois foi o primeiro magíer de Domera Kais e conhecemos todos de cor as batalhas daquela região, não é mesmo, senhores e sores de armas?"

A simples menção do nome do magíer foi suficiente para Vinst, outrora firme e inabalável — ou pelo menos assim se via o pobre capitão — perder a força nas pernas e esbarrar pesadamente contra a mesa. Vinst conhecia o magíer, e não pouco: o rosto bondoso do velho marcara toda uma infância de verões verdejantes e invernos secos naquela cidade-jardim que era Domera Kais, seu antigo lar. Lembrava-se bem, com certo calor no peito, pois com o homem vinha sempre uma menininha de mãos dadas, pulando as lajotas que pavimentavam a estradinha até a varanda fresca onde ele, o irmão e a vó a esperavam. A pequena Eloés, assim como ele, costumava passar longas temporadas na casa da sua vó, Elva da Domere, uma das principais figuras na cidade florescente, ocupada às pressas devido à guerra que assolava os litorais da ilhas vvysenas.

Àquela época Vinst não entendia bem por que devia ficar tão longe do pai, que continuara na capital com seus armazéns e navios, protegendo-os, como dizia, para ele e o irmão, e assim relegou as duas crianças aos cuidados da vó, na casa ocre que por vezes reaparecia nos sonhos mais vívidos do capitão. Eloés tampouco entendia os negócios do avô, nem por que devia ficar na casa da anciã, e talvez isso tivesse feito dos dois tão amigos.

Uléster voltava tão de súbito quanto sumia, levando consigo a neta pela mão enquanto ela desviava-se dos arbustos floridos que abundavam o lugar, temendo que grandes insetos escondidos entre os galhos espetassem-lhe os braços, como nas histórias que Vinst criava para assustá-la. As crianças pouco ligavam quando o avô vinha buscá-la, pois apesar dos dias de brincadeiras e das noites frias próximos à lareira, ouvindo as admiráveis contos da avó, de barriga cheia e os olhos semi-cerrados, bastava atravessar alguns jardins e sebes e estariam juntos mais uma vez: assim se deu aquela infância tão amada e cara aos dois.

— (...) pois como sabem, senhores, Steensark não poderia continuar mais sem um guardião, foi quando nosso ilustre magíer de Domera Kais mudou-se para a torre, adotando-a como sua morada — dizia o magíer quando o capitão despertou do repentino transe. — Da minha torre, ainda nesse inverno, enquanto abri minha mente em nossa região, pondo-me a vasculhá-la em busca de perigos que nos circundassem as muralhas; enquanto, nessa minha atividade magíera, esquadrinhava as áreas de Lyttbien e os pastos além, das encostas congeladas pelo fim do outono às imediações de Drumenvaal, veio-me à mente uma ideia tão arriscada quanto súbita, senhores: decidi aventurar-me para mais perto de Hájen. E é imperial que saibam o quão perigoso é ter a mente aberta em regiões amaldiçoadas como aquelas, senhores, muito perigoso! Mas eu conhecia os riscos, sim!, e mesmo levei a mente àquele lugar.

VIRMÍRIA I {REVISÃO}Dove le storie prendono vita. Scoprilo ora