XV - O MAGÍER RETORNA

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As portas da torre abriam-se com um estrondo e o velho, meio correndo, meio andando, fez sua reestreia na corte, bem acompanhado da grande lua azul, cuja visão as nuvens descortinavam preguiçosamente, bem ao norte. O magíer trazia consigo um cajado longo e delgado e da ponta escapava uma luz âmbar, tão forte que feria o olhar, como se ostentasse o grande Raërn um dos quatro sóis de Virmíria. Em poucos instantes Vinst viu o magíer cruzar toda a extensão da ponte suspensa, a sombra da balaustrada caminhando com rapidez sobre os rostos dos homens a sua volta, e chegar ao torreão que guardava uma escadinha aos jardins.

— Oh, grande magíer! — exclamou Hájenor, de braços abertos, quando o outro alcançou o térreo. O príncipe pôs-se à frente de seus homens e ajoelhou-se. — Venha a nós, Raërn, o grande. O tão esperado retorno deste cujos conselhos Arkik por tanto tempo nos privou; cuja proteção nos é tão cara e justa: venha, magíer Raërn! — Sua voz era forte e clara que ecoou pelos jardins e logo muitos outros juntaram-se a eles.

— Meu príncipe — bradou o Magíer. Sua voz era cortante e áspera, tão forte quanto a do príncipe, mas de algum lugar, bem ao fundo, Vinst não pôde deixar de notar algo de calma e suavidade, conferindo ao velho uma aura de mistério e inteligência. O magíer fez uma breve reverência e continuou, sem parecer notar os convidados à volta do príncipe, a cobrir os olhos ante a luz forte: — Meu príncipe, solicito uma reunião urgentíssima!

O magíer, apesar de velho, possuía uma compleição robusta e grave. Os olhos, escuros e severos, eram encimados por sobrancelhas que, assim como o bigode, terminavam em longas pontas prateadas. A barba grisalha escondia o pescoço arfante e terminava nas vestes roxas salpicadas por estrelinhas, como em regra vestiam-se os magíeres de Era — a dele, porém, em péssimo estado, rasgada e chamuscada em alguns pontos. Também o chapéu cônico e longo, acocorado sobre a cabeça e munido com o mesmo padrão das vestes, mostrava-se avariada. Os cabelos longos, acinzentados como a barba, permeados por algumas tranças já quase desfeitas, colavam-se no rosto molhado de suor, que, junto com a expressão de urgência na voz do velho, fizeram o príncipe levantar-se, numa postura rígida, e dizer:

— Concedida, meu mais nobre conselheiro — e então virou-se pra Jiorde: — Leve esses cavalheiros — disse, indicando os músicos — e pague-lhes o justo. Minha senhora de Vulker — endereçou-se mais brandamente à esposa, as filhas ainda à mesa —, leve as crianças para o quarto. 

Tendo suas ordens acatadas, o príncipe por fim virou-se para o velho, dizendo:

— Peço que diga, magíer, pois encontramo-nos entre pessoas de confiança. Pergunta-se o que fazem juntos tantos homens valentes, eu bem sei. Saiba, meu bom amigo, que muito se passou a nós vulkers desde que me foi anunciada sua partida.

— Pois é o que me pergunto, meu príncipe, e antes de tudo, o que te peço é perdão: sim, perdão! Um erro grotesco de um velho, se me permite dizê-lo, pois é o que sou: nada além de um velho tolo! E sinto-me no meu nobre exercício de magíer da corte, um servidor do reino, o dever de prestar-lhes conta acerca do que estive a empreender. A todos! — acrescentou ele, parecendo notar pela primeira vez os cavalheiros e sores que ouviam-no em transe. — É imperial que os senhores, que com nobreza e em verdade defendem o reino, a honra do Kai e, acima de tudo, os vulkers, fiquem a par do que se assoma contra nosso reino — ou que restou dele! 

Vinst, sentia-se um tanto desconfortável em estar ali entre sores de armas e guerreiros vulkers; sentia como se as palavras e a natureza do que o magíer tinha a dizer não se endereçava de todo a ele, mas de toda forma, decidiu-se por ficar. Acalmou-se quando viu o sarhájo forçar passagem entre os homens e mulheres atentos e pôr-se ao seu lado para escutar as palavras do velho: também não pertencia aos vulkers, como Vinst, e não mostrava qualquer desconforto em estar ali.

VIRMÍRIA I {REVISÃO}Onde as histórias ganham vida. Descobre agora