Capítulo IX: O Verão e Um Conto (Parte 2)

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Em junho daquele ano (após Stalin ter discursado a respeito dos tão criticados calendários de cinco dias), entrou em vigor na União Soviética a nova semana de trabalho: agora todos os trabalhadores folgavam no sexto dia, sem que houvesse uma distinção entre classes operárias, como era anteriormente.¹

A medida foi muito bem recebida pelo povo, que agora, teria um dia específico para passar inteiramente com as famílias ou para receber visitas. Como foi o caso daquele sexto dia, em que Gregor Nasekomoyev, junto a sua filha, rumaram até a casa de Mikhail para visitar os amigos.

Pavel (que voltava da casa de Klaus, em meados da manhã) ao subir as escadas, acabou encontrando com Gregor e Mikhail, que saiam do apartamento familiar para conversarem no jardim comunitário do prédio. Cumprimentaram-se os três: Mikhail saudou o recém-chegado com um sorriso breve, ao passo que Nasekomoyev estendeu o braço para receber um aperto de mãos.

Pararam os três nos degraus: Pasha subia, os outros desciam.

— O Camarada não gostaria de nos acompanhar até o pátio? Eu contava a Mikhail sobre como Katherina ganhou um concurso de escrita em sua escola. — Gregor dirigia-se a Pavel e lhe oferecia a cortesia já conhecida.

— Eu li o conto... é de uma primazia única para uma moça de tão pouca idade —- Completou Mikhail, na intenção de mostrar a Pasha que ainda dedicava-se a leitura. — Katherina nos trouxe uma cópia. Li enquanto Gregor e a moça conversavam com Anya a respeito da nova medida das folgas. Eu lhe empresto mais tarde... acho que você vai gostar.

— Eu lerei — Pavel retribuiu com um sorriso educado e fez menção a continuar a subida. Carregava nas mãos um par de livros. O primeiro, tratava-se de uma coletânea contendo discursos e panfletos de Lênin, o outro era "Memórias do Subsolo" de Dostoievski, autor que tornou-se o favorito do rapaz. — Só vou guardar estas coisas antes.

Nenhuma das obras que trazia consigo poderia ser considerada subversiva, ao contrário, incentivava-se aquele tipo de leitura, no entanto, Pavel não pretendia carregá-las de um lado para o outro quando bem podia guardá-las em seu apartamento.

Gregor concordou, Mikha deixou escapar um suspiro e os dois amigos seguiram para o jardim que tornou-se movimentado nos dias de folga e silencioso durante a semana.

Falavam sobre a nova medida, sobre o trabalho e Gregor, a todo momento, encontrava uma brecha para expor um ou outro acontecimento no desfile de Primeiro de Maio, quando encontrou os grandes nomes do governo e até mesmo o próprio Stalin, com quem trocou meia dúzia de frases.

Mikhail achava engraçado, mas não ria. Depois de anos convivendo com Gregor Dmitrievitch, o rapaz chegou a conclusão de que a reputação e o respeito que a alcunha "Nasekomoyev" carregava no partido, servia como um pilar de sustentação para alguém tão abalado pelo passado.

A figura física de Gregor costumava espantar e afastar as pessoas, ao passo que a lenda que cercava Nasekomoyev o colocava como um homem distinto e respeitável. Eram quase duas entidades distintas, uma vista com repúdio e a outra com uma aura dourada de importância.

Gregor Dmitrievitch acendeu um de seus cigarros e sentou-se em um banco. Mikha, logo postou-se ao seu lado. Em poucos minutos, Pavel juntou-se aos dois. Logo encontrou um caixote de madeira e o posicionou diante ao par de senhores, para sentar-se e participar da conversa.

— Como vão as coisas na construção, Camarada? — Perguntou Nasekomoyev a Pavel. Mikha relatava algum acontecimento geral na fábrica de armamentos e Gregor decidiu que aquela era a melhor forma de introduzir o terceiro no assunto.

— A construção é uma área vasta nesses tempos. Acaba-se um prédio e parte-se para outro... o meu grupo se concentra no centro. — Respondeu o rapaz.

Um Conto do LesteWhere stories live. Discover now