44 - O conto

195 29 22
                                    

Ao entrar na sala de aula o professor Green percebeu a animação dos alunos, que estavam divididos em seus respectivos grupos.

Estava mais sério que o habitual, não dormira bem durante a noite, que fora recheada de pesadelos assustadores, e lembrou-se de anotar para depois da aula uma visita a certa moldura, que era o centro das atenções do que sonhara.

Um pesadelo totalmente sem nexo, imaginou, onde era ele quem aparecia exibido nela, preso, eternamente, numa cela sem grandes, sendo admirado pelo muitos alunos que visitam o grande museu que a MES havia se transformado.

Seu sexto sentido lhe dizia para ficar alerta e como ele acreditava em premonições, tinha certeza que esta era uma delas.

Ainda estava distraído quando um aluno lhe chamou a atenção. Era Derick, que animadamente conversava com o pessoal do seu grupo, formado pelo Sr. Taylor e suas duas amigas.

— Tudo bem, vamos iniciar a aula de hoje e eu sei muito bem o motivo de toda essa euforia.

Todos ficaram em silêncio, enquanto o professor abria uma pasta contendo diversos trabalhos.

— Não foi difícil selecionar o conto vencedor, pois ele foi muito bem escrito e seguiu perfeitamente a linha que eu propus.

— Antes, porém, de anunciar o grupo vencedor, eu farei a leitura completa do conto, trecho por trecho, que servirá como base para o roteiro da nossa peça, para depois no final dividirmos os papéis principais, que serão três, e todas as demais participações secundárias.

— Vamos ao conto que se chama O pedido do garoto...

🔷🔷🔷🔷🔷

Esticou o braço para sua filha de cinco anos e juntos atravessaram a rua. Seguiu aqueles dedos frenéticos da menina, disparando seu desejo naquela vitrine. Um pônei branco feito de madeira, a sela tinha um assento perfeito. Ela poderia galopar por horas naquele balanço.

— Sei, filha. O Natal está chegando.

— No Natal? Vai comprar mesmo, papai?

— Desde que se lembre de uma coisa: você sempre terá aquilo que deseja, mas nem sempre o que pede.

Ela tombou a cabeça ao lado e franziu a testa. Ele reagiu com cafunés nos seus fios negros.

Não soltou de sua mão mesmo na calçada. Jamais soltaria se pudesse. O aperto de mãos fazia falta a quem já pertenceu a duas famílias. Dependendo de si, não perderia a terceira, mesmo esta sendo instável.

Dobrou a segunda esquina e entrou na terceira a direita. Apertou a mãozinha mais forte antes de desprender e ela correr aos braços da mãe, ao lado de seu padrasto.

Cumprimentou o casal e despediu da mocinha, prometendo revê-la em breve.

A sua ex morava naquela mesma rua. Passou por aquele beco e viu a escuridão do corredor. Deslizou o dedo indicador em seus olhos, lembrou que era a hora de rever o bom velhinho.

Parou numa mercearia e comprou duas barras de chocolates amargas, só podiam ser estas.

Tentou atravessar, mas o veículo não cedeu a preferência sob o sinal vermelho. O próximo carro parou e assim foi ao outro lado da rua.

Entrou no prédio e foi direto a recepcionista.

— Vim visitar o senhor Charles.

Ela discou o ramal e em seguida respondeu:

— Terceiro andar a direita, senhor.

Agradecido, seguiu a orientação já memorizada.

Encenação MortalOnde as histórias ganham vida. Descobre agora