Some people know better about friendship

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Durante uma parte do nascer do sol, Wendy ouviu, grogue e com a cara enfiada no travesseiro, os resmungos de Mare a respeito da dança dos dois. Dera apenas respostas curtas, sim ou não, e algumas vezes murmurava coisas como "alkoholia demais" ou "falta de faíscas".  Mare, sabendo que não tiraria nada dela, bastou-se de chamar o irmão de porco manipulador, idiota leproso e outras coisas que Wen não se dera ao trabalho de ouvir por causa do sono.

E, apesar da noite ter sido consumida por uma festa divertida que agitara seu corpo e coração semi-mortos, Wendy teve tudo, menos um sono feliz depois disso —sequer calmo, para todos os efeitos. De início, acreditou que poderia ter. Um sono calmo, por algumas rápidas horas, um suspiro de descanso tranquilo, que estaria talvez cansada demais sequer para sonhar

Talvez. Mas aquilo não era um sonho. Parecia um, no entanto. Daqueles que surgem das sombras, moldando-se como fumaça nas entranhas confusas de uma mente cansada. De primeira, não era nada mais que caos. Luzes, falhas, sons elétricos, estáticas, arranhados e calor. Sons confusos de épocas passadas, vozes que ela achou que jamais escutaria novamente, nomes e sorrisos nostálgicos. Lembranças, aquilo eram lembranças. Pessoas, lugares, cores. Cenas felizes e cenas trágicas da própria vida.

Ela já estava chorando no início, era difícil dizer por quanto tempo.

Então, mesmo parcialmente distraída pela explosão de informação acontecendo diante de seus olhos marejados, Wendy o ouviu. Ouviu o próprio nome, ecoando nos confins de sua mente, vinda de longe. Um som familiar, mas muito afastado e abafado.

Ela olhou para trás. O espaço era branco, praticamente tão cheio de luz que tornava difícil confiar nos próprios olhos, mas Wendy viu a pequena silhueta escura e miúda que a observava de longe, com a cabeça inclinada e ar curioso. Estava tão parado que, por alguns instantes de adrenalina, ela teve medo da figura sombreada.

Lembrava um menino mas, pelo que a luz cegante permitia que enxergasse, parecia coberto de pêlos cinzentos e tinha orelhas apontadas para cima. Ela notou olhos, no entanto, círculos vibrantes. Azuis.

Wendy?, a voz abafada pareceu tremular entre o espaço que os separava, como se divididos por uma parede de água. Wendy...? Wen?

Wendy piscou, estupefata, querendo se livrar das lágrimas. Não funcionava muito bem.

Foi quando aquela coisa apareceu, atrás do menino desatento à presença monstruosa. Era brutalmente enorme, sombria e espinhosa. Maior que uma casa talvez, mas o cenário era desfavorável para qualquer análise, fosse pela água na visão, a distância ou a altura distinta do menino afastado. Wendy entrou em pânico, tremendo tanto que teve vertigem, mas seu grito de alerta não atravessava a parede líquida entre eles.

O monstro estava dando passadas para mais perto. O menino, de costas, ainda olhava na direção dela, confuso, inalterado. Ele veria os olhos da morte muito tarde. A criatura continuou, sombria e sedenta, na direção da criança de orelhas caninas. Os olhos do monstro eram a única coisa não sombria de toda sua gigantesca silhueta turva, íris brilhantes e brancas sob escleras completamente negras.

Wendy gritou. O som foi sufocado como se ela tivesse a boca e garganta cheias de neve cortante e ardente. Ela se encheu mais de pânico corrosivo. Aquele frio, aquele com o qual vinha lutando todo esse tempo para abafar, tinha conseguido alcançá-la, tomado controle. O gelo tomou seu rosto, suas mãos, seu nariz, arrancou com socos todo seu oxigênio e por fim tornou seus olhos cristais secos. Mas, como parte de sua trama maligna talvez, não completou o trabalho antes que Wendy deixasse de ver a criatura chegando ao menino, cobrindo-o completamente com sua sombra.

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