33 - O pedido do garoto

Start from the beginning
                                    

Me prometa algo, filho — pediu ele — Quando eu e sua mãe nos formos, busque constituir uma família também, não deixe que a solidão o transforme de forma negativa. Você me promete?

O garoto o encarou e disse algo que estava guardado dentro de si.

Tarde demais. Não quero família alguma para mim no futuro. Estou arrependido de um dia ter desejado fazer parte de uma família. Se um dia os senhores não existirem mais, voltarei correndo para a minha solidão.

Não diga isso, filho, nunca é tarde demais...

Se o senhor me dá licença, tenho mais tarefas a realizar.

Menos de dois anos depois, seus pais foram fazer uma viagem e nunca mais retornaram. Se passaram alguns meses e eles foram encontrados mortos numa vila da Suíça, deitados numa cama, congelados.

O garoto, agora quase um homem-feito, herdou todos os bens deles, resolveu parar seus estudos e se dedicar a uma paixão particular que o mantinha na solidão que lhe fazia tão bem.

Na noite de Natal deste ano que passou a viver só e não compareceu a nenhum dos convites de confraternização dos parentes herdados pela adoção, teve um sonho assustador, ao mesmo tempo que revelador.

Neste sonho ele estava de volta ao beco e idealizava fazer o pedido para pertencer a uma família. Só que após refletir bem, decidiu pedir para o Bom Velhinho somente o poder da manipulação, com o qual conseguiria fazer tudo que quisesse.

Neste momento no sonho um Papai Noel vestido de preto se materializou na sua frente e com um sorriso amarelado lhe disse uma única frase:

Este poder foi o que eu lhe dei naquela noite, você é que ainda não aprendeu a usá-lo...

Na manhã de Natal acordou assustado e em poucos minutos uma compreensão caiu sobre ele.

Fez algumas ligações e naquele mesmo dia visitou todos os parentes, sem exceção.

A partir daquela data o garoto definitivamente se transformou num homem e chegou a conclusão que o seu destino havia sido traçado naquela noite do pedido realizado.

Não sabia ainda qual era o preço que pagaria, mas tinha certeza de que não seria algo bom de ser pensado, mas logo se conformou, afinal, ele pediu um presente e não era educado ser um mal agradecido.

Tinha certeza que seu pai adotivo aprovaria aquele pensamento, se estivesse vivo para isso — imaginou com um sorriso no rosto e foi dormir.

E nunca mais sonhou...

🔷🔷🔷🔷🔷

O professor Green se calou e ficou olhando para os alunos.

— Alguém tem algum comentário a fazer?

— Eu tenho — disse uma garota loira — Era para ser um conto de Natal? Porque me pareceu muito triste...

— Quem mais tem algo a dizer? Sr. Taylor?

— Penso que esta história está incompleta para servir para nossa encenação teatral.

— Ótimo! Por que diz isso?

— Porque ela não tem fim — respondeu ele.

— Exatamente! Não é para ser uma história nem alegre nem triste. É um enredo que os escolhidos para atuar terão que desenvolver o seu final.

— Este será o grande desafio dos senhores — continuou Adam — Os alunos que, em grupo, escreverem a melhor conclusão para esta história, na opinião minha e dos professores escolhidos para julgar este trabalho, vão compor o elenco principal desta peça.

— Agora estão dispensados. Nos vemos amanhã, para o último dia de aula.

Os alunos foram deixando a classe, ficando somente Anderson e suas melhores amigas, Priscilla e Sarah.

— Teve uma parte da história, professor, que eu achei que você era o garoto, mas depois percebi que não podia ser...

— E o que lhe fez mudar de ideia? — perguntou Adam com um olhar curioso sobre eles.

— O garoto abandonou os estudos, jamais poderia ter se tornado um mestre em nada, quanto mais um professor de Artes tão talentoso quanto o senhor.

— Isso mesmo Sr. Taylor, sua conclusão está correta. A propósito, pretende participar?

— Mas é claro! — respondeu sorrindo e abraçando as garotas — E venceremos facilmente, a Priscilla aqui escreve como ninguém; a Sarah é ótima com os desenhos; e eu tenho uma imaginação muito fértil e sou talentoso no palco.

— Ah, professor — continuou ele — Amanhã não poderei vir para aula, meus pais vão me levar para o norte. Lhe desejo antecipadamente um excelente Natal, apesar da morte recente da sua tia...

— Muito obrigado! E não se preocupe com a minha finada parenta, tenho certeza de que ela está num lugar muito melhor.

Anderson começou a sair da sala, mas retornou com uma nova colocação.

— Ah, se o professor estiver sem compromisso, tenho certeza que a minha família adoraria recebê—lo em sua propriedade...

— Fico agradecido pela sua generosidade, Sr. Taylor, mas tenho vários outros parentes para visitar...

Afinal, preciso manter as aparências — pensou Adam enquanto os garotos finalmente se foram e o deixaram com a solidão, que ele tanto apreciava.

Encenação MortalWhere stories live. Discover now