Bônus Júlia III

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— Não consigo acreditar no que está acontecendo Márcia. Preferia estar dormindo ainda naquele hospital que presenciar o Caíque preso, pior, por algo que não faço a mínima ideia do que é. — bufei exasperada no sofá, meus braços apoiados em minhas pernas, apoiando a cabeça sobre minhas mãos.

— Acalme-se Júlia, ou terá um colapso nervoso. Caíque deve ter tido um forte motivo para agir como agiu. Nós o conhecemos.

— O Caíque que conheço jamais mentiria pra mim, Márcia. — soltei austera demais para o meu gosto.

— Não o condene, não sabe o que ele pode estar tentando salvar Júlia. — suas palavras chamam minha atenção e levanto meu rosto para fitá-la nos olhos.

— O que você está sabendo? O que está pesando na cabeça do Caíque para ele estar agindo dessa forma?

— Júlia ele só quer te proteger...

— Fala Márcia! Eu tenho o direito de saber. — insisti com firmeza, observando-a se mover inquieta pela minha sala.

— Ele está sendo ameaçado.

Ouvi atentamente tudo o que minha amiga tinha para me dizer e quanto mais ouvia, mais nada parecia fazer sentido nessa história louca. Achei que tudo estava resolvido com a prisão de Thomás, mas pelo jeito o ex-funcionário da minha amiga era somente a ponta do iceberg.

— Por que ele não confiou em mim? Se pensássemos juntos, talvez ele não estivesse nessa situação absurda de agora. — praguejei num misto de raiva e preocupação quando Márcia se sentou ao meu lado, tomando minhas mãos trêmulas nas suas.

— Ele não sabia o que fazer. Ficou apavorado de que algo ruim pudesse acontecer com você e o bebê. — sua voz suave acabou por me acalmar lentamente.

— Eu não sei como, mas preciso ajudá-lo Márcia.

— Rubem disse que o advogado já entrou com o pedido de habeas corpus, agora é esperar pela decisão do juiz. — suspirei longamente, mal percebi a chegada de Janete na sala até ela se pronunciar.

— Desculpa interromper dona Júlia, mas fui dar uma geral no sótão e encontrei essa caixa com algumas coisas, muitas, no nome de Melissa Castro. Não sabia o que fazer com elas. — olhei espantada para Márcia que me lançou um olhar de incentivo para o objeto em minha frente.

Não sabia que Mauro poderia ter guardado as coisas de nossa mãe, aliás, duvidava seriamente que ainda existisse algo dela nessa casa após todos esses anos.

— Obrigada, Janete! — disse prontamente, tomando a caixa nas mãos, engolindo a seco até que a mulher tivesse desaparecido de nossas vistas.

— Vá em frente Júlia! Abra! — pressionei os lábios com força por um segundo, reunindo coragem para fazer o que minha amiga havia sugerido. Se eu teria um momento para exorcizar todos os meus medos e pesadelos com o passado, esse momento era justamente agora.

Meus dedos se moveram lentamente pela tampa da caixa, em segundos uma enxurrada de sentimentos dominou meu coração numa pontada tão forte que precisei respirar fundo para conseguir me acalmar.

Eram tantas lembranças de dias difíceis, de palavras que magoaram, de atos que feriram e principalmente, era uma dor quase insuportável para digerir após tanto tempo.

Achava que minhas cicatrizes haviam se curado, mas assim que meus olhos encontraram tudo o que me levava para minha conturbada adolescência, foi como se uma avalanche de sofrimento se apossasse de mim.

— Vocês pareciam tão felizes. — funguei alto, enxugando algumas lágrimas que já escorriam pela minha face tão logo ouvi a voz suave de Márcia com uma foto da nossa família entre os dedos. Eu tinha sete anos.

De volta ao Passado - Livro 2 Série VoltasWhere stories live. Discover now