O homem fechou a portinha e se sentou no chão à minha frente, me encarando ainda sem expressar qualquer sentimento em seu rosto duro e frio, como uma estátua.

Engoli em seco e esperei algum gesto ou palavra, mas ele apenas empurrou a tigela com o ensopado em minha direção e deixou uma colher ao lado.

Talvez ele esperasse que eu começasse a comer aquilo, mas toda vez que olhava para aquela "sopa", meu estômago se revirava e eu sentia o vômito subir por minha garganta.

Eu sentia o suor frio escorrer pela minha testa e o meu coração bater forte sob o peito. Aquele homem não tinha nada de estranho ou ameaçador, nem havia sequer dito uma palavra a mim, mas ele me assustava.

E não era um medo qualquer, como o medo de insetos e bonecas que eu tinha normalmente, não era um medo inconsciente. Tinha um motivo para que eu me sentisse tão assustada, eu só não entendia ou lembrava ainda, mas lá no fundo daquela minha mente misteriosa e um tanto desconhecida, eu sabia o porquê.

Ele voltou a apontar para a tigela, seus olhos cinzentos sem desviar de mim por ao menos um segundo.

– Coma – sua voz era firme e decidida. Era uma ordem.

Mordi a língua e, com os dedos fracos e trêmulos, peguei a colher no chão e a mergulhei na tigela, enchendo-a com aquele ensopado que tanto me enojava.

Com uma das mãos sobre o nariz, rapidamente coloquei aquilo para dentro da boca e engoli. O gosto não era ruim, mas eu sabia que não era certo, que tinha alguma coisa muito errada com aquilo.

Inesperadamente, vi o homem sorrir e suas mãos enluvadas deram dois tapinhas "amigáveis" em minha cabeça, como se ele estivesse se comunicando com um animal.

– Boa menina.

Uma lágrima escorreu pela minha bochecha mesmo que contra a minha vontade e voltei a encarar a tigela à minha frente. Eu sabia que teria que tomar tudo.

Enquanto enchia mais uma vez a colher, o homem se levantou e pegou a boneca – que chutei ter mais ou menos o meu tamanho no momento – no colo, a levando para um canto abaixo de uma pequena janela, junto de tantas outras já esquecidas porém igualmente belas.

Belas porém assustadoras e tristes. Por algum motivo eu as repugnava e temia, e sabia que chorava a cada noite que precisava passar sozinha com aquelas coisas.

Eu me lembrei de algo acontecido há muito, quando eu ganhara a primeira daquelas tantas bonecas:

"Sei que às vezes é solitário ficar aqui sozinha, então trouxe alguém para te fazer companhia".

A primeira não era tão perfeita e bonita. Haviam falhas por entre seus cabelos e um de seus olhos não estava lá, mas eu gostei dela.

Gostei até entender o que ela era.

O homem voltou e abaixou sua máscara para me dar um beijo na testa. Depois, com uma careta insatisfeita, recolheu a colher e a tigela com ainda mais da metade do ensopado restando.

– Vou melhorar – ele disse, seu sotaque francês era forte e claramente perceptível. – Tudo para você, ma petite abeille.

Em seguida, abriu a portinha e saiu, logo a fechando novamente.

Senti um pânico imensurável tomar conta de mim e imediatamente me arrastei até lá, batendo e arranhando a madeira com toda a força que tinha nas minhas mãos suadas e ainda trêmulas.

Lágrimas caíam de meus olhos e pingavam no chão. As minhas mãos e todos os dedos doíam mas eu não conseguia parar, eu... Eu só queria sair dali.

Por quê? Por que eu quero tanto sair daqui? Eu me perguntava, sentindo minha cabeça doer e girar, confusa com a quantidade de pensamentos e sentimentos, dúvidas e respostas e o desespero que transbordava pelo meu corpo através das lágrimas e do suor que encharcava minhas roupas.

Papa! – minha voz aguda e infantil gritava entre os soluços, rouca e embargada pelo choro.

Outra unha se quebrou e vi sangue se espalhar por toda parte.

– Não... – murmurei passando o dedo machucado de forma frenética e desesperada pelo meu vestido amarelo encardido.

Assim que o sangramento parou, comecei a passar as mãos rapidamente pelo chão onde o sangue havia caído numa tentativa falha de limpá-lo.

Eu não podia me machucar, Ele não gostaria, ficaria bravo e... Eu não queria deixá-lo bravo, só queria ser perfeita, assim Ele gostaria de mim e me trataria bem.

Ainda chorando, voltei a me encolher contra a parede, desistindo de lutar. Ele nunca me deixaria sair, não é?

Eu só quero que entenda, Lis, a voz feminina e infantil que eu já conhecia muito bem disse em minha mente e eu assenti, secando as lágrimas que ainda escorriam com minhas mãos doloridas.

Eu entendo, pensei em resposta com o coração mais pesado do que nunca.    

  ◈◇◈  

Primeiramente, olá e... muuuito obrigada mesmo pelo 1K de visualizações! Sério, eu tô muito feliz mesmo porque eu realmente não esperava que a história fosse chegar a esse nível de visibilidade tão rápido. Jesus, eu nem tenho muito o que dizer, apenas que vocês são as melhores pessoas do mundo!!! Obrigada de verdade por sempre gostarem e colaborarem com cada obra minha, uma sempre mais louca que a outra - e tem que ter saco pra aguentar esses coiso viu. Espero de verdade que sempre continuem gostando, um capítulo após o outro, porque é saber que pessoas tão maravilhosas como vocês gostam do que escrevo que me faz feliz de verdade ♥

E segundamente... Perdão pelos atrasos. Eu realmente não queria que isso tivesse acontecido, mas, novamente, a escola e o técnico me tacam trabalho sem nem se importar se tenho mais coisas pra fazer ou não, e nesse fim de semana eu estive ocupada com algumas outras coisinhas, então acabei ficando bastante tempo sem dar as caras por aqui, o que resultou na falta de capítulo novo tanto em A Casa de Bonecas, quanto em The Crazies. Eu admito que estou ciente de que a tendência é só piorar mas acreditem, eu também não fico nem um pouco feliz com isso. Enfim, me desculpem mesmo!

E sobre o capítulo, sei que ficou meio confuso mas era impossível deixar as coisas realmente claras aqui, porque a Lis não era Lis e a Abelle também acabou não sendo Abelle, e os pensamentos das duas se misturaram e ficou um negócio só, bem abstrato como a própria Lis disse shaushuahs mas ainda assim espero que tenham entendido o necessário e conseguido ler o capítulo sem praguejar contra a minha pessoa pelos momentos confusos :v

Milhões de beijos e até a próxima! ♥

A Casa de BonecasWhere stories live. Discover now