29.

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n/a.: Penúltimo capítulo!

Sabe quando você abre a caixa de um quebra-cabeças e as peças caem para fora formando uma enorme bagunça? Era assim que eu me sentia. Todas as informações estavam ali, eu só precisava encaixá-las. Giancarlo, Anita, meu pai, Figo, Lucas, Felipe, Léo... Até a minha mãe. E eu. Todos estávamos conectados, amontoados pelo chão. De alguma forma as nossas histórias se encaixavam — porém, às vezes é melhor manter as peças embaralhadas do que juntá-las e descobrir o que têm para mostrar.

Continuei observando a sacada mesmo depois que Léo e Giancarlo voltaram para dentro da casa e apagaram as luzes. No dia do acidente, meu pai ordenou que eu levasse Lucas até esse endereço. A casa de Giancarlo. Por que?

"— Ele está no carro — meu pai disse — Dormindo como um anjo no banco do passageiro. Decore este endereço: rua José de Alencar, número 809. Leve-o até lá e certifique-se que ele não acorde até que esteja... Entregue.

— Lucas não é uma encomenda! — eu gritei, assustado.

— Filho, escute bem — meu pai caminhou até mim, dando um passo após o outro com uma irritante tranquilidade — Eu tenho uma dívida que precisa ser paga.

— Que dívida? Sobre o que você está falando?

— Lucas vai ficar bem. Apenas leve-o até o endereço que te falei — ele levou a mão até o meu ombro e acariciou com as pontas dos dedos — Eu serei eternamente grato — desviei o ombro, ainda com a garrafa de vidro agarrada ao meu peito.

— O que... O que eu devo fazer depois que chegar no endereço?

— Um amigo meu estará o esperando".

Eu tenho uma dívida que precisa ser paga. — sussurrei, lembrando das palavras que meu pai dissera — Uma dívida... com Giancarlo... Meu pai tem uma dívida com Giancarlo.

Quando olhei para o lado, o banco do motorista não estava mais ocupado por Maia. O corpo pequeno de Anita ficava engraçado atrás daquele volante que parecia um bambolê.

— Como as pessoas conseguem dirigir um troço desses? — Anita perguntou, enquanto fuçava em cada detalhe do caminhão — Se eu estivesse viva, teria uma lambreta.

— Combinaria com o seu vestido azul.

— Se eu estivesse viva, usaria roupas de outras cores — Anita deu de ombros e então apontou para a sacada — Eu tinha um guarda-roupas cheio delas bem ali.

— O meu pai tinha uma dívida com o seu — eu disse, e Anita esboçou um sorrisinho.

— Ah, ele tinha. E não, não estamos falando sobre dinheiro. Estamos falando sobre sentimentos. Já experimentou vender seu coração, Bernardo? — revirei os olhos — Emprestar a sua dor para alguém, por exemplo?

— Anita, aonde você está querendo chegar? — arqueei uma sobrancelha.

— A lugar nenhum, o caminhão está parado e não temos lambretas por aqui — continuei sério enquanto ela torcia o canto da boca, convencida. Estendeu a pequena mão para mim e eu a segurei, fechando os olhos — Alerta de spoiler: essa história pode ter gosto de terra.

Abri meus olhos quando escutei os soluços. Eu e Anita estávamos dentro de um dos quartos do Colégio São Dimas. O espaço não estava muito diferente do que eu já conhecia, tirando o fato de que a madeira estava menos gasta. Metade do quarto tinia de tanta arrumação, o lençol perfeitamente colocado sobre a cama e dois pares de sapatos posicionados ao lado da escrivaninha onde quatro livros grossos estavam empilhados.

A Última Gravata VermelhaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora