11.

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- O que você fez?! - gritei para a garota. Jorge estava esparramado ao meu lado, a cabeça tombada sob uma poça de sangue. O peito movia-se lentamente, mas não havia alguma manifestação do resto do corpo, exceto uma linha vermelha que escorria pelo canto da boca. A jovem andou até o altar e depositou o castiçal exatamente onde Felipe o deixara algumas horas atrás. Pegou um pano que estava sobre a mesa e limpou a mancha vermelha como quem não se importasse com mais nada que acontecia naquela igreja.

Ajoelhei ao lado de Jorge, colocando a mão no peito e na jugular, para sentir a pulsação e garantir que eu não teria que lidar com mais uma morte. Arranquei a gravata, desabotoei a camisa e a apoiei sob a cabeça dele, para conter a poça de sangue que se espalhava. Exibir meu corpo no meio de uma igreja era completamente desconfortável, mas era por uma boa causa, então Jesus me entenderia. Ou não, já que envolvia uma pessoa desmaiada pós-briga e uma crise de ciúmes homoafetiva.

- Você sabe que vai ter que dar um fim nessa camisa depois, não sabe? - ela disse, limpando os respingos de sangue das pontas dos dedos.

- Quem deveria fazer isso é você. Não era para as coisas terem chegado a esse ponto - estiquei o braço, apontando para o Jorge imóvel. - Era só uma briga.

- E você estava levando uma surra! Deveria ver seu estado. - meu rosto pesou depois do comentário dela, uma sensação estranha ao redor do meu olho e a viscosidade do sangue escorrendo sob meu nariz.

- O que nós vamos fazer agora? Esperar até que ele acorde? Escondê-lo em algum lugar?

- Bernardo, respira. Não há nada que você possa fazer. Vá para o seu quarto e deixe que eu cuido da situação por aqui, está bem? - ela cruzou os braços, impaciente. Era engraçado como conversávamos agora, como ela estava completamente nítida e real na minha frente. - Lave seu rosto e coloque uma camisa.

- Tudo bem - concordei, tenso - Você me garante que amanhã não terei que aguentar dor de cabeça por causa disso?

- Eu jamais te causaria dor de cabeça, Bernardo. Agora, vá!

Muito pelo contrário. O fato dela saber meu nome, nunca se identificar, aparecer em momentos esporádicos e ser possivelmente o espírito de uma suicida me causava muita dor de cabeça. Mas, não vou reclamar. Às vezes, a certeza pode ser mais dolorosa do que a própria dúvida.

* * *

Três copos de bebidas rolaram no chão quando abri a porta. No meio daquela confusão toda, sequer lembrei que estava rolando uma festa no meu quarto. Então, cheguei trajado da melhor forma possível: sem camisa e com o rosto ensanguentado. E certa parte daquele sangue sequer era meu.

- Bernardo! - Felipe me puxou pelo braço para fora do quarto. - O que aconteceu?! Você se meteu em mais alguma merda? - Felipe me encarou da cabeça aos pés, parando o olhar por alguns segundos no meu abdômen.

- Esqueci da festa... Você poderia pegar uma camisa para mim? Vou tomar banho.

- Mas o que aconteceu? - os olhos de Felipe estavam arregalados, ele parecia mais preocupado com a minha situação do que eu mesmo.

- Não quero falar sobre isso, Felipe.

- Você tem que parar de guardar os seus problemas para você!

- Conveniente escutar isso da pessoa que, logo no meu primeiro dia, pediu para que eu mentisse sobre meus problemas. - respondi. Felipe deu um passo para trás, rendido pela minha rispidez.

- Vou pegar uma camisa para você. - ele entrou no quarto, a música soando mais alta quando a porta se abriu. Pouco tempo depois, ele estendeu o braço, me entregou uma camisa branca e fechou a porta.

A Última Gravata VermelhaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora