Capítulo Três - Parte 1

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Eu sempre falo que Monte das Pedras só tem um bar, mas na verdade tem vários. Um deles virou "o bar", porque é o maior e mais sofisticado. Dos outros, a maioria são botecos ou bares sem nada de diferente, o tipo de lugar que você encontra em toda parte. Não que eu tenha algo contra botecos. Meus quatro anos em Belo Horizonte e os lugares onde costumava terminar a noite deixam isso bem claro. Mas ir parar em um deles, ali, não era uma boa ideia por vários motivos diferentes. "O bar" tem três espaços grandes ligados entre si, dois na altura da rua e um mais baixo. A impressão que eu tenho é que o dono comprou três lojas uma do lado da outra e basicamente tirou as paredes internas. Onde antes eram as portas da loja agora são grades baixas, que saparam o espaço do bar da calçada, e ainda bem que nunca inventaram de colocar vidros ali, senão o lugar ia ser um forno. As paredes são pintadas numa combinação de vermelho e creme. As cadeiras têm armação de metal, com almofadas combinando com as cores das paredes, e as mesas têm tampo de vidro – o que para mim é a maior prova de que é um barzinho "chique", por falta de outra palavra.

Nas sextas e sábados à noite, ele costumava estar lotado. Por sorte, quinta-feira tinha bem menos movimento, já que todo mundo ia trabalhar no dia seguinte, então conseguimos uma mesa sem nenhum problema. Estávamos em um dos espaços no nível da rua, à direita do balcão comprido que corria pela parede dos fundos, com bebidas nas prateleiras atrás dele.

Olhei ao redor, sorrindo. De certa forma, estar ali me lembrava de antes. Não de BH e das noitadas com o pessoal da faculdade, mas de quando eu ainda era menor de idade e mal podia esperar até meus dezoito anos para poder entrar ali. Eu falava que assim que fosse maior ia tirar um dia no mês, no mínimo, para sair e me divertir sem me importar com o que fossem falar. Sonhos de adolescente que foram pisoteados pela realidade, no fim das contas, mas não era tarde demais para recuperar um pouco daquilo.

— O que deu em você hoje, Lau? Planos que não quer contar, agora resolvendo vir aqui...

Me virei para Rick. Ele estava me encarando e balançando a cabeça de leve, como se não tivesse certeza do que estava acontecendo. Bom, para ser honesta, nem eu sabia bem.

Sorri.

— Só estou de bom humor.

Ele se inclinou para trás na cadeira e cruzou os braços. Meu sorriso se alargou enquanto eu o observava. Rick, naquela posição, com a luz batendo logo atrás dele e as cores do bar... Daria um bom desenho. Já tinha o que fazer no dia seguinte.

— De bom humor? — Ele ergueu uma sobrancelha.

— Aham.

Estiquei a mão para o menu, mas Rick o pegou antes de mim. Soltei um suspiro irritado enquanto ele escolhia o que ia pedir. Era capaz de apostar que ele ia tentar pedir por mim, e não queria nem saber daquele tipo de coisa.

Olhei ao redor de novo, reparando nas pessoas que podia ver. Um grupo de três adolescentes que eu não tinha certeza de que eram maiores de idade estavam sentados no fundo do espaço onde estávamos. Um casal mais velho que meus pais estava em uma das mesas pouco atrás de Rick, e mais nada ali. Levando em conta que só tinha visto duas mesas ocupadas no caminho, ou todo mundo tinha descido para o terceiro espaço, ou o movimento não estava muito bom mesmo.

— Ei, Saulo! — Rick levantou o braço.

Foi minha vez de levantar as sobrancelhas quando um dos garçons se virou na hora e veio na nossa direção. Moreno, com o cabelo curto e espetado e olhos castanho claros, ele estava usando um avental vermelho sobre uma camiseta clara e calça jeans. Precisei de um instante para me lembrar dele. Tínhamos conversado um pouco em uma festa na casa do Rick, uns meses antes. E ele só sabia falar de academia e de como se manter em forma. Bom, pelo menos parecia que estava tendo resultados.

Refém da Noite - DegustaçãoWhere stories live. Discover now