Ansiedade

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Os dias passaram-se e os alunos fizeram suas provas finais. O vestibular já havia sido feito e então eles gastaram o resto de suas energias nas provas finais para que pudessem concluir o ensino médio com êxito. Na última prova do ano, Anna fez o que sempre fazia com Lola: implicou com a menina.
              Lola mordiscava a borracha verde na ponta do lápis enquanto pensava em qual alternativa marcaria um ''x''. Era a última questão da última prova e a matéria era química. A questão era sobre pH e ela deveria, a partir de uma fórmula e analisar um quadro, descobrir qual era a medida certa em números e se a substância era ácida, básica ou neutra. Ela estava em dúvida entre a letra a ou a b. Enquanto isso, alguns alunos já haviam entregado a prova, quando a Anna levantou de sua carteira, atravessou a sala com seu salto de 15 centímetros de altura, na volta, enquanto arrumava sua mochila para ir embora, resolveu implicar com Lola que estava concentrada fazendo a prova. Como a menina havia sentado bem atrás de Lola, ficou mais fácil de se comunicar com ela.
   - Está pronta? - perguntou Anna baixinho.
  Lola piscou os olhos e olhou em sua volta em busca da voz que havia chamado a sua atenção. Se dispersou e virou a cabeça para trás olhando para a loira.
- Pronta para oquê? - perguntou bufando.
- Pronta parar ter o que merece - Anna destilou o seu veneno.
- Acho que mereço um 7 nessa prova, pelo menos e se você me der licença eu terminarei a minha prova.
- Não estou falando disso...
- Está falando sobre o que então? - Lola perguntou curiosa.
- Com o tempo saberá - Anna piscou para a menina e colocou a mochila no ombro enquanto fazia um barulho no piso com o seu salto alto cor-de-rosa.
   Antes, de marcar a alternativa, Lola a olhou e balançou a cabeça e revirou os olhos e não levou a sério o que a menina havia dito.
  Entregou a prova para o professor de história que estava no encargo de aplicar a prova de química e deu um longo suspiro, sentindo-se finalmente aliviada.

**********

  No corredor, antes de irem embora do colégio, Erick aproximou-se de sua amiga e comemorou o fim das provas.
- Finalmente estamos livres! - disse ele alegremente.
- Nem consigo imaginar! - Lola sorriu.
- Lembra no início do ano, Lola? Parece que foi ontem que estávamos falando sobre o último ano do ensino médio, vestibular e tal...
- Verdade, o tempo passa muito rápido.
- Falando nisso, já sabe mais ou menos qual faculdade você irá fazer?
- Pelo meu pai eu faria direito e seria advogada como ele, mas eu estava pensando em artes plásticas, história ou quem sabe letras.
- Sério? Não te imagino como advogada mesmo - ele riu.
- E você? O que vai escolher? Educação física?
- Não... Eu estou pensando em engenharia, que tal?
- Uma boa! Você é inteligente - ela piscou para ele.
- E aí, está ansiosa para a formatura? Eu já comprei minha roupa social...
- Estou sim, não vejo a hora de finalmente nos formamos - os olhos castanhos de Lola brilharam mas não pela formatura em si mas no plano em fugir com Miranda após esta celebração.
- Nem acredito que já é amanhã. Eu nunca fico nervoso com essas coisas mas pensar que nunca mais vamos estudar juntos, dói o meu coração. - confessou ele.
- Ah, que bonitinho, Erick! - Lola o abraçou forte - Eu também vou sentir sua falta. E sabia que aonde eu estiver lembarei de você, ouviu? Eu te amo!
 Erick a abraçou e a rodopiou em círculo fazendo os dois morrerem de rir.
- Falando assim até parece que não vamos nos ver mais. Esqueceu que somos praticamente vizinhos? Eu vou sempre lhe perturbar!
  Lola apenas sorriu e olhou para suas mãos que se entrelaçavam em sua frente. Ela jamais poderia contar o que estava planejando fazer, mas se despedir de seu amigo deveria ser feito. Ela jamais o esqueceria e tentaria manter contato com ele, mas não sabia se ele iria querer manter com ela após descobrir o que ela havia planejado para sua vida, mas ela estava disposta a dar adeus à todos em sua volta para viver o que mais almejava; ser feliz ao lado da pessoa amada. E para isso, ela estava disposta a correr os riscos necessários, mas ela mal sabia a gravidade destes riscos.

**********
  

NARRAÇÃO DE LOLA

  Eu estava sentada na sala, lendo uma revista para adolescentes, esperando uma ligação de Miranda para podermos combinar o nosso plano antes de colocá-lo em prático. Havíamos combinado que antes da formatura, eu iria colocar minha mochila com meus pertences indispensáveis; como documentos, roupas e fotografias; perto do carro dela. Assim que eu desse o sinal, ela guardaria meus pertences dentro de seu carro. No final da celebração haveria uma recepção e comemoração com comida e bebida para os alunos, professores, pais e convidados. Mas nós não iríamos participar, fugiríamos exatamente neste momento. Quando todos estivessem distraídos comemorando e conversando entre si, Miranda e eu daríamos início a nossa grande fuga. Enquanto eu esperava uma ligação dela, como havia sido combinado, iríamos confirmar tudo antes de irmos dormir. Foi quando fui dispersa de minha ansiedade pela voz de minha madrasta ecoando pela porta sendo aberta.
  - Lola! Você não sabe o que eu comprei hoje no shopping! – ela balançou várias sacolas de lojas conhecidas.
  - Ela quase comprou o shopping inteiro. Tem coisas aqui que eu acho que realmente não seriam necessárias, como este móbile de bichinhos da fazendinha – meu pai estendeu o pacote para mim que exibia a imagem do enfeite para o berço de um bebê com bichinhos como vaquinhas, porquinhos, cavalinhos e galinhas.
- Claro que isto é necessário! Li em uma revista que esses móbiles são ótimos para o sono do bebê. Eles ficam relaxados.
- Se eu dormisse com um treco desses rodando sem parar encima de minha cabeça eu ficaria louco e não relaxado.
 Michele e eu rimos. Ver meu pai que meses atrás era um advogado sério discutindo sobre um brinquedo para recém nascidos me fez perceber como as coisas podem mudar.
- Mas, não comprei apenas coisas para mim ou para o meu filho. Comprei um vestido lindo de formatura para você!
  Ela me entregou uma enorme caixa e quando eu o abri, fiquei chocada e surpresa com a beleza do vestido. Era exatamente o que eu havia imaginado e almejado.
O  vestido era branco e longo, a parte de cima era composta por pedrarias e seu fundo era transparente mas com um tecido nude para cobrir o corpo. Na parte de baixo, a saia era trapeada e lembrava um vestido de uma deusa grega.  Ele poderia ser usado em um casamento de tão belo que era. Fiquei sem palavras para agradecer, não somente pelo presente mas pelo carinho que Michele tinha por mim.
  - Muito obrigada, Michele. Você não sabe o quanto fico feliz em saber que você gosta de mim e tem um carinho pela minha pessoa. Eu amei o vestido e ele é mais bonito do que eu havia imaginado.
  Michele me abraçou e meu pai ficou nos olhando com lágrimas nos olhos.
- De nada, meu anjo. Fico feliz e com orgulho de ir em sua formatura. Que só coisas boas possam acontecer em seu vida daqui para frente e que você realize todos os seus sonhos.
  Nos abraçamos de novo e percebi meu pai estava se aproximando de nós  e também nos abraçou.
- Vocês não sabem o quanto me fazem felizes. Eu amo vocês e vê-las juntas, se dando bem foi o meu maior sonho.
  Dei um beijo na bochecha de meu pai e Michele deu um selinho nele.
- Que a nossa família continue unida e com a vinda de nosso pequeno rapaz ilumine mais ainda o nosso lar.
- Então vocês já sabem... É um menino? – perguntei afoita.
- Sim, e se chamará Gabriel.
 Pulei de alegria e comemoramos juntos com abraços. Por instantes meu coração doeu ao  perceber que eu não veria este menino crescer, mas a vida tem dessas coisas. Para se alcançar um sonho, alguns sacrifícios devem ser feitos. Mas eu faria o possível para vê-lo sempre que possível, mas sei que isto não depende apenas de mim.
 - Lola, você pode ter certeza de onde  Mayra estiver, ela está feliz em vê-la bem e orgulhosa do que você se tornou – disse meu pai.
 Engoli em seco pois Michele me lançou um olhar para que eu falasse o meu segredo para o meu pai. Apenas ela sabia de minha orientação sexual, mas eu ainda não estava pronta para contar para ele.
 - Obrigada, pai. Minha mãe deve estar feliz em vê-lo reconstruir uma família e pela sua felicidade.
  Meu pai secou uma lágrima dos olhos.
- Lola, saiba que você pode contar conosco para tudo.
 Michele me lançou um olhar incisivo e encorajador.
 Cogitei em contar, mas o celular tocando em cima do sofá chamou minha atenção e fez meu coração disparar pois era Miranda.
- Com licença.
   Deixei-os na sala entretidos com as compras e fui para o meu quarto para ter privacidade na conversa com Miranda.
- Amor, tudo bem? – ela perguntou.
 Toda vez que ela me chamava de ‘’amor’’ meu coração se acelerava ainda mais e um sorriso boba se exibia em meu rosto.
- Tudo sim e com você? Está tudo de pé?
- Sim. Vou deixar a porta de meu carro aberto para que você possa colocar sua mochila lá dentro. A formatura começará às 14:00 em ponto, então chegarei com antecedência. Deixe seus pertences por volta das 13:40, ok?
- Ok. Farei de tudo para chegar antes. Mas... tem algo que não falamos ainda.
- O quê? – percebi o desespero em sua voz.
- Depois de fugirmos para onde iremos?
-  Vamos direto para aquele hotel que passamos a nossa noite especial... e depois, bom depois é o de menos. Estando ao seu lado é o mais importante.
   Fiquei tão feliz de ouvi-la dizer tais palavras que se estivesse sozinha em casa seria capaz de dar um gritinho de felicidade.
- Então está tudo certo. Te encontro amanhã no colégio!
- Ok, amor. Vou indo pois Henrique chegou e não quero que fique ouvindo nossa conversa.
- Claro. Eu te amo, amor.
- Eu te amo mais ainda.
  Nos despedimos e desliguei o celular e coloquei sobre os meus  seios com a mão fechada, deitada na cama e sonhando acordada enquanto olhava para o teto.
  Mal podia esperar para finalmente começar uma nova vida com a pessoa que eu mais amava no mundo.

A Cor Púrpura de Teus CabelosWhere stories live. Discover now