Com amor, Lizzie [Pausado]

III

– Sem discussões, Mark! – Vociferou Lucy enquanto me encarava de forma a deixar claro que eu não deveria abrir a boca para responder. – Tire o dia de folga e volte amanhã, se estiver se sentindo melhor. – Eu já havia dito dezenas de vezes antes que estava bem, mas Lucy parecia confiar mais na menina de cabelos vermelhos que espreitava a discussão da porta da lanchonete.

– Sim, senhora. – Eu respondi, um tanto desanimado. Lucy estava no auge de seus quarenta e tantos anos sem aparentar tal idade, algo que provavelmente provinha de sua descendência asiática. – Eu volto amanhã.
       
***

Depois do beijo houve um momento constrangedor de silêncio entre nós, onde a garota ficou me encarando enquanto ainda estava em cima de mim como se nunca tivesse visto um rosto humano antes. Esse estranho momento persistiu até que a Sra. Winston, uma velha que morava na casa em frente ao local do acidente, se aproximou dizendo que viu o que havia acontecido da janela de sua sala e, como não nos levantávamos, resolveu sair para ajudar e ver se estávamos bem. Aparentemente, como vim a ser informado, eu havia sido atropelado por uma garota de skate e não conseguia pensar numa maneira mais humilhante de começar o dia.

Assim, ignorei os diversos pedidos de desculpa da garota e segui apressadamente para a lanchonete, enquanto ela me seguia dizendo que eu não podia trabalhar depois de bater a cabeça daquele jeito e que eu deveria ir ao hospital. Situação que só piorou quando sra. Winston foi até a lanchonete dizer a Lucy o que aconteceu, descrevendo o acidente de uma forma que extrapolava significativamente os limites da física e da realidade na forma em que a entendemos. Então, com Lucy surpresa por eu estar vivo após escutar os exageros da velha, eu ganhei um dia de folga forçado.

Talvez tenha sido pela queda ou por ter batido a cabeça, mas eu não tinha pensado muito a respeito do fato da garota ter me beijado até o momento em que Elisa me alcançou enquanto eu saía da lanchonete, segurando uma lata de refrigerante em cada mão e com um sorriso cínico no rosto.

– Você provavelmente não terá outra chance na vida de ficar com uma garota bonita assim, – comentou ela, acenando com a cabeça em direção à garota sentada sobre seu skate no trecho de calçada mais à frente, — Tenta não estragar tudo. — Completou antes de me entregar as latas de refrigerante e retornar para a lanchonete.

— Atropelado por uma garota de skate, francamente... — eu ainda a escutei comentar antes de fechar a porta atrás de si, me deixando completamente desamparado com duas latas de refrigerante e uma garota um tanto estranha mais à frente.

***

— Ei! — A ruiva gritou à minhas costas quando passei direto por ela saindo da lanchonete. — Você ainda está com raiva? — Perguntou ela, me alcançando.

— Eu não estou exatamente feliz por ter sido atropelado por uma louca num skate logo pela manhã, sabe? — Mesmo que essa louca tenha me beijado após o incidente, eu pensei. — Mas não, eu não diria que estou com raiva. — Eu estava, só não queria admitir. — Só um pouco chateado por ter perdido um dia de trabalho porque alguém fez questão de falar com cada pessoa que encontrasse que eu bati com a cabeça no chão. — Pronto, agora não restava mais dúvidas de que eu estava com raiva. Ela parou de caminhar e eu me virei para ela, um pouco à frente. — Olha, me desculpe... — Eu comecei até ser interrompido por ela.

— Quanto te pagam? — Ela perguntou enquanto tirava notas amassadas e moedas dos bolsos de seu jeans surrado.

— O que você está fazendo...? — Eu perguntei, ainda sem entender.
— Toma! — Ela esticou ambas as mãos em minha direção, contendo todas as variedades de notas e moedas. — Tem 56 dólares e 45 centavos aí! — Ela disse, como se isso fosse me convencer a pegar o dinheiro. — Vamos lá, você não ganha mais que isso por dia, não é? — Na verdade, eu ganhava. Pouco mais, mas ganhava. Não quis entrar nesses detalhes, tudo o que eu queria era ir pra casa e me deitar um pouco. Certamente pensando nela.