2. Giovanni

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Sentado na sala dos professores, eu finalizava os registro da primeira aula ministrada. Em cada começo de semestre, eu me enchia de expectativas referentes aos novos alunos. Perguntava-me se seriam jovens interessados no que eu tinha para lhes ensinar ou se estariam apenas à procura de um diploma?

A primeira aula do semestre foi em uma turma de calouros, e esses, como de costume, apresentaram uma curiosidade aguçada sobre os conteúdos. Minhas palavras os influenciariam a amarem ou odiarem a biologia, e eu me esforçaria para que fosse o primeiro. Queria que meus alunos se apaixonassem pela Biologia assim como eu.

— Como foi a primeira aula? — Pedro, um novo amigo e colega de profissão, se manifestou sorridente ao entrar na sala dos professores. — A minha foi um tédio. Turma de orientação de estágio, só tem alunos metidos a sabe tudo.

Pedro sentou-se a minha frente e colocou os pés sobre a cadeira estofada ao lado. Dois professores mais antigos que ocupavam a mesma mesa quadrada de dez lugares lhe lançaram olhares desaprovadores. Mas Pedro era o tipo de cara que não se afetava com as opiniões alheias.

— Respondi a trilhões de perguntas sobre como é a faculdade e o nosso curso. — disse ao fechar o caderno de registros e guardá-lo em minha mochila preta de tecido.

— Ainda bem que me livrei do primeiro semestre, os alunos são muito verdes. — ele bufou, então sorriu travesso. — O que tem sua vantagem, principalmente se há calouras gostosas. A sua turma foi premiada?

— Com o quê? — me fiz de desentendido, sem vontade de responder.

Eu não era o tipo de homem que se deixava influenciar por jovens alunas e sentia-me honrado por nunca ter cedido à tentação de conviver diariamente com jovens entre dezoito e vinte e poucos anos, que desfilavam por minha sala de aula com seus corpos saborosos. Até passei por alguns apertos durante os cinco anos que lecionava: por ser um professor novo e de certa forma próximo aos alunos, tiveram alunas que se insinuaram e uma até chegou a tentar beijar-me.

— E aí, cara, tem alguém que torna a aula mais interessante? — Pedro insistiu com curiosidade.

— Tem uma ruiva em minha sala que... — comecei a contar, mas interrompi o pensamento. Não importava se meu instinto aflorou-se ao ser apresentado a linda sobrinha de Sérgio. E nem que seus longos e ondulados cabelos acobreados e os olhos caramelos com pequenos filetes esverdeados penetrantes como de um gato me impressionaram, meus princípios eram outros.

— Uma ruiva? Cara de sorte! — meu colega sorriu ao jogar em minha direção uma bolinha de papel que vinha fazendo com um bilhete esquecidos sobre a mesa. Desvie sem tanto bom humor. — Devia convidar essa ruiva para a nossa festa hoje.

Pedro colecionava uma enorme lista de alunas e ex-alunas. Seu corpo malhado e sua maneira sedutora eram uma armadilha infalível para pescar as jovens. Eu não seria o responsável por levar ninguém para sua rede, muito menos a sobrinha de um velho amigo.

— Não me envolvo com alunas. — reforcei para ver se ele desistia.

— Esse é o homem casado falando. Esse não é mais você. — Pedro tentou me convencer.

Eu apenas o ignorei, não havia jeito ele nunca mudaria de assunto. Peguei um café na máquina do outro lado da sala me afastando. Não importava qual era o meu atual status de relacionamento eu não achava certo seduzir ou deixar-me seduzir por uma jovem, que é levada pelo imaginário de possuir um símbolo de autoridade como seu professor.

Rebeca, agora minha ex-esposa, nunca acreditou em minha fidelidade. Quando ela ainda me amava a ponto de ter ciúmes, enlouquecia-me com questionamentos sobre a aparência de minhas alunas. Se por algum deslize eu comentasse que alguma era bonita, tinha se formado um temporal dentro de nosso lar. Tomei um gole do café, como se isso pudesse afastar o amargo sentido pela recordação dos trâmites do divórcio recente.

Divorciar-me, apesar das constantes brigas e cobranças por parte de minha mulher, ocorreu de modo inesperado e desagradável.

Fechei os olhos, como se ainda pudesse ouvir os gritos dela ecoando por nosso apartamento no primeiro dia das férias. Eu não compreendia de onde surgira aquela raiva, era como se ela houvesse esperado nossa filha se ausentar ao ir visitar os avós para jogar em minha cara o quanto nosso casamento era fracassado e ela se sentia infeliz.

Tentei pedir perdão por coisas que eu não sabia quais eram. Listei nossas boas recordações, as quais nos últimos meses estavam bem escassas. E por fim apelei para nossos sentimentos, mas esses só continuavam dentro do meu peito.

— Espero que tire suas coisas do apartamento até eu voltar da casa de minha mãe no domingo. — Rebeca se pronunciou ao levantar-se impassível, pegar sua bolsa e dirigir-se à porta. O vento passou calmo pelas janelas do apartamento, indiferente à tempestade formada no interior da sala. Um arrepio sombrio me atingiu ao temer que não fosse apenas ela que eu perderia.

— E nossa filha? Como ficará Nina? — gritei em desespero antes que ela fechasse a porta.

— Dividiremos a guarda. Já falei com meu advogado. — ela respondeu demonstrando que nossa separação não fora algo de momento. Eu era o tolo, o último a ser avisado. A porta fechou-se num estrondo deixando-me sozinho, não havia nada mais a discutir, apenas a lamentar.

Eu me vi perdido, sem saber para onde ir. Pensei em pedir abrigo para minha irmã, contudo eu ainda tinha esperança de Rebeca repensar melhor. De modo inesperado, foi Pedro quem me ofereceu abrigo em seu apartamento por quase um mês até ser possível alugar algo só meu. Ele trabalhava comigo em diversos projetos de pesquisas, entretanto ainda não o havia considerado como a um amigo, até aquele momento.

Enquanto eu tentava reorganizar minha vida e meus sentimentos, Pedro me deu apoio. Diferente de minha concepção, para ele isso significava encher o apartamento de belas mulheres e festas.

Só comecei a me deixar levar por seu conselho quando recebi os papéis do divórcio e meu coração se apertou de verdade, pois agora não teria mais retorno. E para um homem que casara com a primeira namorada, que normalmente era zoado por meus colegas por ser um adepto do casamento e da fidelidade, eu estava me saindo um razoável galanteador.

Os encontros casuais não preencheram o vazio em meu peito, mas ao menos serviram como uma espécie de desintoxicação de minha antiga vida. Como uma amostra de que existem melhores opções do que estar em um casamento recheado de brigas e que eram possíveis novos caminhos.

Por enquanto meus planos estavam em reestabelecer um lar. As constantes festas no apartamento de Pedro eram muito para mim, por isso aluguei um lugar só meu. E até o final do ano o apartamento que financiei provavelmente já estaria pronto e eu poderia pensar em recomeçar uma vida, desta vez de modo solitário.

Lembrei-me de Sérgio, o coordenador do curso de Filosofia, e sorri em alegria por ele ter aceitado meu convite hoje. Almoçar com ele seria imensamente mais interessante do que com Pedro, ao menos nossos assuntos teriam uma variedade maior do que mulheres.

Essa tradição de troca de ideias entre eu e Sérgio surgira ainda no meu primeiro semestre como professor. Nossos cursos de atuação eram distintos, no entanto, por falta de mesas disponíveis em alguma confraternização entre professores tive a honra de sentar-me ao seu lado e ser brindado com sua amizade.

No ano passado, em minha casa havia apenas discussões e escapar para as conversas regadas a filosofia com Sérgio, foram os pontos altos do ano. Começar esse ano já com uma conversa filosófica talvez fosse o indicativo de que este seria melhor do que o anterior.




Jovem AmorWhere stories live. Discover now