Epilogo

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Hoje vamos todos comemorar a aprovação do Rafa no concurso, reunindo a família, lá no bar do Moises. Estou muito feliz por ele, e fui a primeira pessoa para quem ele ligou ao saber do resultado. O que foi bem legal, mas também não foi nenhuma surpresa, pois estamos namorando. É, há dois meses, embora quase ninguém da família saiba disso.

Eu admito que tenho tentado mudar, tentado fazer as coisas mais por mim do que pelos outros. Desperdicei muitos anos do meu talento, pelo menos tenho ouvido que sou talentosa e estou começando a acreditar, quando parei de cantar por causa do Guta. Hoje, tento não ligar muito para os que os outros irão pensar. Mas não consigo ser assim quando esses outros são a minha família. Não sei como eles lidariam com o fato de eu estar namorando o meu quase primo e temo que isso não seja bem aceito.

Eu sei que não deveria ligar, mas eu ligo.

Já o Rafa não é assim, ele quer contar. Ele quis desde o começo, mesmo antes de conseguir esse cargo, onde ele vai ser bem remunerado e conseguir sua total independência financeira. O que facilita um poucos as coisas, mas não muda muito. Eu já tenho a minha independência financeira há algum tempo e ainda sinto medo.

É, o segredo se manteve porque eu quis assim. Mas, sinceramente, eu não aguento mais. Cansei de ter que esconder o nosso namoro. Cansei de ter que mentir.

Em ocasiões como a de hoje, onde os nossos pais, a Nati e o namorado dela (os integrantes do casal mais novo são os únicos que sabem da gente, pois são os nossos parceiros de saídas), tudo se torna especialmente mais difícil. Todos os casais estão sentados juntos à mesa, todos, com exceção da gente. E é um saco ter que ficar longe do Rafa. Ele num canto, e eu em outro. Porque quando chegamos os lugares já estavam ocupados e ninguém pensou em deixar um junto para a gente. Como eles poderiam fazer isso, se desconhecem a nossa situação?

Só que a comemoração é para ele, ele é meu namorado, e eu queria (muito mesmo!) estar ao seu lado agora. E isso me deixa triste. E a tristeza me leva a outra coisa: a coragem.

Não aguento mais, e sei que preciso fazer alguma coisa a respeito. Não posso mais ficar sentada esperando que as coisas mudem. Já aprendi que é difícil algo simplesmente cair do céu no nosso colo, em geral precisamos ir à luta.

É sexta-feira, dia do show do Max e não do meu. Mas sei que, se eu quiser, como eu já fiz outras vezes, posso subir naquele palco e cantar. E é o que eu decido fazer quando afinal me levanto.

Estou com o meu vestido azul de lantejoulas de novo. Roupa que o Rafa sempre elogia, e hoje eu queria agradá-lo. É uma roupa que combina totalmente com palco, holofotes e um microfone. E é agora ou nunca. Eu me levanto decidida, e o Rafa ergue as sobrancelhas, me olhando do outro lado da mesa com curiosidade. Seus cabelos castanhos estão arrumadinhos com gel, e ele está muito gato. Seus olhos castanhos não saem de mim, e eu não sei como ninguém percebe isso. Só por esse olhar eu sei que ele me quer por perto, tanto quanto eu o quero.

Estou totalmente apaixonada, gostaria de beijá-lo e de abraçá-lo nesse momento, e quero que todo mundo saiba disso. Tenho vontade de gritar o meu amor por ele, mas como não gosto de gritar, tem algo que eu adoro fazer e que teria o mesmo efeito. Ou um efeito ainda maior.

É agora ou nunca. Cansei do nunca. Então eu me decido pelo agora.

– Vou ver se o Max me deixa cantar uma música – anuncio para todos os presentes na mesa, e todos eles parecem achar a minha sugestão legal.

Legal... Sim, é bom que eles pensem isso. E eu espero que eles continuem pensando o mesmo depois. Quando eu fizer o que pretendo.

Chego ao palco e me sinto nervosa, como na primeira vez em que eu voltei a cantar depois de anos. O Max logo me permite assumir a música seguinte, o que eu não tinha dúvidas de que ele faria. A gente se dá bem, sempre que eu posso desço até o bar nas sextas-feiras, e ele curte os minutos de descanso que eu lhe proporciono ao ocupar o seu lugar. Logo aviso aos músicos da banda a minha escolha. É uma música nacional, bastante conhecida, e muito bonitinha. E ela diz exatamente o que eu sinto.

Nunca pensei (completa)Where stories live. Discover now