Capítulo 14

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  Na segunda-feira depois de Peterhof, quando Alexander, sorridente,encontrou Tatiana em Kirov, ela, muito séria, disse-lhe antes mesmo deum oi:– Alexander, você não pode vir mais aqui.Ele, não mais sorrindo, ficou em silêncio diante dela, por fimcutucando-a com a mão.– Vamos andar.Caminharam o longo quarteirão até Govorova.– Qual é o problema? – Ele olhava para o chão.– Alexander, eu não posso mais fazer isso. Simplesmente não posso.Ele permaneceu calado.– Não posso mais – disse Tatiana, apoiada no pavimento de concretosob os seus pés.Ela achava ótimo andar e não ter que olhar o rosto dele.– É muito duro para mim.– Por quê?– Por quê? – Desconcertada pela pergunta, ela ficou em silêncio.Não podia dizer em voz alta nenhuma de suas respostas.– Somos apenas amigos, Tania, certo? – Alexander disse baixinho. –Bons amigos, eu venho porque sei que você está cansada. Teve umlongo dia, tem um longo caminho para casa e uma longa noite pelafrente. Eu venho porque, às vezes, você sorri quando está comigo, e euacho que você está feliz. Estou errado? É por isso que eu venho. Assimde simples.– Alexander! – ela exclamou. – Sim, nós fingimos não estarmos a fimde muita coisa. Mas, por favor. – Ela respirou fundo. – Por que você nãodiz a Dasha então que me traz de Kirov até em casa? Por que todos osdias descemos três quarteirões antes do meu edifício?Devagar, ele disse:– Dasha não entenderia, isso a magoaria.– Claro que a magoaria!– Mas, Tania, isto nada tem a ver com Dasha.Os esforços de Tatiana para ficar calma empalideciam seus dedos.– Alexander, isto tem tudo a ver com Dasha. Não posso, noite apósnoite, dormir ao lado dela com medo, por favor – ela disse.Eles chegaram no ponto do bonde. Alexander estava diante dela.– Tania, olhe para mim.Ela virou a cabeça para o outro lado.– Não.– Olhe para mim – ele disse, pegando as duas mãos de Tatiana.Ela levantou os olhos para Alexander. Suas mãos grandes areconfortaram.– Tatia, olhe para mim e diga: Alexander, não quero que você venhamais.– Alexander – ela disse num sussurro –, não quero que você venhamais.Ele não soltou as mãos dela nem se afastou. Nem ela se afastou.– Depois de ontem, você não quer que eu venha mais? – eleperguntou com a voz bem fraca.Tatiana não podia olhar para ele enquanto falava.– Principalmente depois de ontem.– Tania! – ele exclamou de repente. – Vamos contar a ela!– O quê? – Ela pensou que ouvira mal.– Sim! Vamos contar a ela.– Contar a ela o quê? – Tatiana disse. A língua subitamente cheia demedo congelado. Ela tremeu toda em sua blusa sem mangas. – Não hánada a contar para ela.– Tatiana, por favor! – Os olhos de Alexander brilharam. – Vamoscontar a verdade e viver com as consequências. Vamos fazer a coisahonesta. Ela merece isso. Vou esclarecer isso com ela e...– Não! – Ela tentou livrar as mãos. – Por favor, não. Por favor. Ela vaificar arrasada.Ela fez uma pausa.– Temos que pensar nos outros.– E nós? – Ele apertou as mãos dela. – Tania... – ele murmurou. – Ecomo ficamos eu e você?– Alexander! – Ela era só nervos. – Por favor...– Por favor, digo eu! – ele falou alto. – Estou farto disso! Tudoporque você não quer fazer a coisa certa.– E quando é certo magoar outras pessoas?– Dasha supera isso.– E o Dimitri?Quando Alexander não respondeu, Tatiana repetiu:– E o Dimitri?– Deixe que eu me preocupo com o Dimitri, tudo bem?– E você se engana. A Dasha nunca vai superar isso. Ela pensa quevocê é o amor da vida dela.– Ela pensa errado. Nem mesmo me conhece.Tatiana não podia ouvir mais nada. Puxou as suas mãos.– Não, não! Pare de falar!Alexander estava adiante dela na rua.– Eu sou um soldado do Exército Vermelho. Não sou um médico naAmérica. Não sou um cientista na Grã-Bretanha. Eu sou um soldado naUnião Soviética.

 Eu posso morrer a qualquer minuto, de mil maneirasdiferentes, de hoje até domingo. Este pode ser o último minuto em queestamos juntos. Você não quer passar esse minuto comigo?Hipnotizada por ele, Tatiana resmungou:– Neste momento, eu só quero me enfiar na cama...– Sim – ele exclamou com fervor –, enfie-se na cama comigo!Enfraquecida, Tatiana balançou a cabeça.– Não temos lugar algum para ir... – ela sussurrou.Alexander aproximou-se e pegou o rosto de Tatiana, enquanto dizianuma voz trêmula, cheia de coragem:– Vamos resolver isso, Tatiasha, eu prometo, de alguma forma nós...– Não! – ela gritou. Ele abaixou as mãos. – Você... entendeu mal –gaguejou. – Eu quis dizer que não há nada que fazer por nós.Os olhos dele abaixaram. Os dela também.– Ela é minha irmã – Tatiana disse. – Por que você não entende isso?Não partirei o coração de minha irmã.Alexander deu um passo atrás e disse friamente:– Oh, tudo bem, você já me disse. Haverá outros rapazes. Mas nãooutra irmã.Sem mais uma palavra, ele se virou e começou a ir embora.Tatiana correu atrás dele.– Alexander, espere!Ele continuou andando.Tatiana não podia alcançá-lo.– Por favor, espere!Ela o chamou já na Ulitsa Govorova. Apoiou-se na parede de umedifício de estuque amarelo, sussurrando:– Volte, por favor.Alexander voltou.– Vamos embora – ele disse de forma neutra. – Tenho que voltar àsbarracas.Tatiana insistiu.– Ouça. 

O Cavaleiro de Bronze Livro IOnde as histórias ganham vida. Descobre agora