Capítulo 11

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  No sábado, Tatiana foi à Biblioteca Pública de Leningrado e pegouemprestado um livro de frases em russo e inglês. Em certo grau, ela jáconhecia o estranho alfabeto, aprendido na escola. Passou a maior parteda tarde tentando dizer em voz alta algumas das frases mais ridículas. Osths, ws e os suaves rs eram muito difíceis. A frase The weather will bethunder and rain tomorrow estava construída de forma a atormentá-la.Ela podia dizer be muito bem.No domingo, quando Alexander veio, ele sozinho colou tiras de papelnas janelas para evitar que os vidros se fragmentassem nas ondasexplosivas que podem vir com o bombardeio, se e quando as bombascaíssem sobre Leningrado.– Todo mundo deve tapar as suas janelas – ele disse. – As patrulhaslogo rodarão pela cidade para conferir se as janelas foram todas tapadas.Não teremos como encontrar novos vidros em lugar algum, se os alemãeschegarem a Leningrado.Os Metanovs o observavam com grande interesse, e Mamãecomentava a cada minuto como ele era alto, seu bom trabalho, suasmãos firmes, como ele ficava solidamente em pé no parapeito. Mamãequeria saber onde ele aprendera fazer aquilo. Impaciente, Dasharespondeu:– Ora, Mamãe, ele está no Exército Vermelho!– Foi no Exército Vermelho que ensinaram você a ficar de pé noparapeito da janela? – Tatiana perguntou.– Cale a boca, Tania – Dasha disse, rindo. Alexander riu também, masnão disse cale a boca, Tania.– Que desenho é esse que você fez nas nossas janelas? – Mamãedisse quando Alexander desceu do parapeito.Tatiana, Dasha, Mamãe e Babushka examinaram a forma do papelcolado na janela. Em vez das linhas brancas cruzadas que tinham visto emoutras janelas em Leningrado, o desenho de Alexander parecia umaárvore. Um grosso tronco, ligeiramente inclinado de um lado, com folhasalongadas saindo de dentro, mais compridas no fundo, mais curtas notopo.– O que é isso, moço? – Babushka perguntou de forma imperiosa.Alexander disse:– Isso, Anna Lvovna, é uma palmeira.– Uma o quê? – disse Dasha, ao lado dele.Por que sempre tão perto?– Uma palmeira.Tatiana, de pé junto à porta, observou-o sem piscar.– Uma palmeira? – Dasha disse intrigada.– É uma árvore tropical. Cresce nas Américas e no Pacífico Sul.– Hmm – disse Mamãe. – É uma escolha estranha para nossas janelas,você não acha?– É melhor que as velhas linhas cruzadas – murmurou Tatiana.Alexander sorriu para ela. E ela retribuiu de leve o sorriso.

 Ríspida, Babushka disse:– Bem, moço, quando cuidar das minhas janelas, não faça coisasextravagantes. Para mim, só uma simples linha cruzada. Eu não preciso depalmeiras.Mais tarde, Alexander e Dasha saíram juntos, deixando Tatiana comsua melancólica e exausta família. Tatiana foi à Biblioteca de Leningrado,onde passou horas pronunciando estranhos sons em inglês. Pareciaextremamente difícil ler nessa língua, nela falar e escrever. Na próxima vezque visse Alexander pediria que ele lhe dissesse algumas coisas em inglês.Só para ouvir o som das palavras. Já pensava sobre a próxima vez queveria Alexander, como se isso fosse uma certeza.Ela jurou dizer a ele que talvez, quem sabe, ele não devia vir mais aKirov. Ela fez a promessa a si mesma naquela noite, quando estava nacama de frente para a parede, prometeu à parede, tocando o seu velhopapel, acariciando-o para cima e para baixo e dizendo: eu prometo, euprometo, eu prometo. Ela então colocou os pés no chão entre a cama ea parede e tocou o livro O Cavaleiro de Bronze, que Alexander lhe dera.Talvez ela dissesse aquilo a ele outro dia. Depois que ouvisse dele umpouco de inglês, e depois que ele falasse a ela sobre a guerra, e depois...Outra sirene de ataque aéreo soou. Dasha voltou para casa bemdepois disso, acordando Tatiana, cujos dedos permaneceram na paredede escuta.   

  Na segunda-feira, na fábrica, Krasenko chamou Tatiana ao seuescritório e disse-lhe que, embora ela estivesse fazendo um bom trabalhonos lança-chamas, ele precisava transferi-la de imediato para a área deprodução de tanques. É que, segundo uma ordem de Moscou, Kirovtinha que fabricar 180 tanques por mês, tivesse ou não condições egente para isso.– E quem vai fabricar os lança-chamas?– Os que lá ficarem cuidam disso – disse Krasenko, acendendo umcigarro. – Você é uma boa menina, Tania, pode ir. Tome uma sopa norefeitório.– O senhor acha que os Voluntários do Povo me aceitariam? – elaperguntou-lhe.– Não!– Ouvi falar que 15 mil pessoas de Kirov já se integraram, para reforçaras trincheiras da linha de Luga. Isso é verdade?– A verdade é que você não pode ir. Agora, saia daqui.– Há algum perigo em Luga? – Pasha estava perto de Luga.– Não – Krasenko respondeu. – Os alemães estão longe, é só umaprecaução, agora vá.Havia muito mais gente na produção de tanques, a linha demontagem era muito mais complexa, mas por causa disso Tatiana tinhamenos o que fazer. Ela colocava os pistões nos cilindros debaixo dascâmaras de combustão dos tanques V-12 de motor a diesel.A instalação era do tamanho de um hangar de avião, cinza e escurapor dentro.No final do dia, o motor a diesel estava no lugar, graças a Tatiana, e otrilho nos pneus, a estrutura fortemente parafusada, mas não havia nadano interior, não havia instrumentos, painéis, armas, caixas de mísseis,lançadores de munição, não havia teto.Basicamente a máquina não faria nada diferente de qualquer outropesado veículo blindado.

O Cavaleiro de Bronze Livro IOnde as histórias ganham vida. Descobre agora