Capítulo 30

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<Atualizado>

Minha cabeça doía um pouco, e aquele sonho estranho ainda se fazia muito presente em minha mente.

Perdi a noção do tempo naquele quarto, fitando o teto repleto de adesivos coloridos e felizes, enquanto em minha mente, passavam as coisas mais sombrias possíveis.

O pouco que eu havia dormido parecia ter carregado o dia anterior para um passado muito distante. Não pareciam reais tantos acontecimentos em tão pouco tempo.

Sem conseguir suportar permanecer sozinha com minha mente, saí do quarto e fui até a cozinha, de onde vinham risadas daquele pequeno ser tão doce.

- Mamãe, a moça acordou. - Ela gritou ao pé da escada me vendo descer, e então, correu para a cozinha onde Tamara preparava algo.

- Boa tarde. - Tamara disse com um sorriso simpático quando me aproximei. - Estou preparando um jantar para todas nós.

-Eu não quero incomodar, então se quiserem eu já posso ir...-Gesticulei em direção à porta.

- Imagine. Nós temos uma conversa pendente, e Gabrielly já pôs o seu prato à mesa.

Olhei para a mesa de jantar, onde haviam três pratos com conjuntos de talheres, delicadamente organizados. E ao pé da mesa, Gabrielly se apressava em adicionar os copos também.

- É muita gentileza da parte de vocês...-Foi tudo o que eu consegui dizer.

-Gabi, - Tamara chamou a atenção da garota. - Vá para o seu quarto brincar um pouco, eu tenho que conversar um pouco com a July.

-Okay mamãe. - Ela disse indo em direção as escadas.

Me apoiei num balcão próximo a pia, onde ela cortava alguns legumes.

- Eu assisti ao noticiário enquanto você dormia... Tudo ficou ainda mais confuso.

-Olha, eu não sei como explicar a situação da minha vida, mas as pessoas que estão passando as informações sobre mim, estão contando, como posso dizer... do ponto de vista deles, sabe? Estão me descrevendo com palavra horríveis, mas eu não tenho controle do que aconteceu.

Observando a forma como as mãos delas começaram a tremer, percebi que eu não estava me saindo muito bem em minha tentativa de redenção.

-Ontem à noite, - Ela começou. - Eu estava na janela com a Gabrielly observando você e aquele outro homem, e de repente, tudo ficou terrivelmente quente, e criaturas assombrosas surgiram de todos os lados. Arrastaram a gente para o porão, e lá eu fui obrigada a assistir, "coisas" envolvendo a minha filha.

Me lembrei do momento em que vi elas duas sentadas à mesa de chá, paralisadas, e ideias começaram a se conectar em minha mente.

-Como a Gabrielly pode estar tão sorridente depois daquela noite?

-Bem... pra ser sincera, não é a primeira vez que coisas parecidas acontecem, só que envolvendo apenas ela. Às vezes, enquanto nós dormimos eu acordo com ela gritando e dizendo coisas bem estranhas. Eu sempre pensei que fossem apenas pesadelos de crianças, mas depois de tudo isso, eu acho que ela esteve presenciando aquelas cenas desde que viemos pra cá.

Só depois de ouvir aquilo, coisas tão importantes sobre aquele lugar passaram por minha mente, e o pânico foi instantâneo.

- Acho que essa casa não é muito segura, talvez vocês devam sair daqui!

-O que? Eu consegui essa casa à menos de dois meses! É tudo que eu tenho para morar com minha filha! Nós não temos dinheiro ou condições de sair desse lugar...

-Você não está me entendo; eu acho que tem coisas bem ruins ligadas à essa porra dessa casa! - Acabei me exaltando pelo medo de ter razão.

O silêncio cortante voltou a invadir o lugar. Tamara parecia perdida em pensamentos, assim como eu estava.

"É lógico que tem algo de ruim acontecendo nesse lugar, mas o que causou isso? E por que?" As questões dançavam em minha mente, se embaralhando com mais pensamentos e lembranças das coisas terríveis que eu já vivera naquela casa.

-Mamãe, - Gabrielly estava de volta sem que nenhuma de nós tivesse notado. - Eu posso comer um biscoito?

-É claro meu amor! Tome.

-Escuta mocinha... - Comecei tentando parecer o mais gentil possível. - A sua mamãe estava me contando que você tem alguns pesadelos né? - Ela confirmou com a cabeça. - Você poderia me contar alguns?

-Eu não gosto que minha filha fale ou pense muito sobre isso July. Ela é apenas uma criança!

-Eu PRECISO saber o que ela anda vendo e ouvindo! Estou procurando um jeito de ajudar vocês!

-E o que você pode fazer? De acordo com os jornais, tudo o que você sabe é matar pessoas!- Acho que ela só percebeu o que disse depois, pois pareceu muito assustada coma as próprias palavras. - Eu não quis...

-Tá tudo bem mamãe, não grita assim. Ela deveria saber que já sonhei com ela não acha?

Eu e Tamara nos calamos e voltamos a atenção toda para a Gabi.

-Eu já tive vários sonhos com você. - Gabrielly com certeza não tinha noção do quanto aquilo era assustador, pois contava tudo com simplicidade e sorrisos. - Já sonhei que você tinha a minha idade, e já sonhei com você desse tamanhão aí.

E foi então que ela ficou séria.

-Mas os sonhos são ruins.Eu não gosto deles.

Tentei procurar formas de fazê-la falar mais, mas pela expressão de Tamara, eu sabia que se abrisse a boca, ela faria a menina se calar. Felizmente, ela continuou por si só.

- Em todos os meus sonhos, sinto que estou acordando de verdade. Daí eu me levanto e tudo fica muito quente. Eu sempre tento ir pro quarto da mamãe, mas eu nunca consigo entrar porque eu vejo vários monstros feios lá dentro. E eu não sei por que, mas eu sempre vou pro porão. E lá eu te vejo. - Ela deu um pequeno sorriso novamente. - Mas você também não parece feliz. Está sempre chorando por causa das coisas feias que o monstro Kate diz."

Ao soar daquele nome senti um calafrio percorrer minha espinha.

- Desculpe querida, qual o nome do monstro que você disse? - Indaguei.

-Kate. - Outro calafrio. - Ela é um monstro muito feio e faz coisas ruins com você. Mas quando ela vai no meu quarto está sempre chorando e pedindo perdão. E vive me dizendo pra ir pro lago.

- Que lago?

- Aquele perto de onde você "deixou"aquele homem... -Tamara se encostou largando os legumes de vez, e continuou falando tristonha e amedrontada. - Antes de dormir tenho que trancar a casa toda, ou então acordo com os gritos da Gabrielly lá fora... largada no chão e se debatendo. - Tamara mantinha os olhos fixos na filha, mas pela sua expressão, seus pensamentos iam muito além dela.

-É quando ela tenta me assustar pra me fazer ir lá. Ela diz que vai fazer coisas ruins se eu não for, e que na água existem vários prêmios. Mas a mamãe me proibiu  de chegar perto.

Senti estar me desligando do mundo, e entrando de vez em minha mente, voltando toda a atenção às outras pergunta e supostas respostas vindas daquela conversa.

"Será que a alma da Kate vive aqui atormentando essas pessoas? Ou será coisa do Abalam? Como ele chegou até mim? Por que eu? O que são esses monstros de que ela tanto fala afinal?"

Lembrei de meu sonho no lago e das tentativas de afogamentos de Gabrielly, então, uma ideia me ocorreu.

-Eu preciso ir até a floresta. Por favor, não olhem pela janela, e não me esperem voltar.


Continua...



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