Capítulo 34

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Kara usava apenas um blusão com uma cueca, ela estava deitada na cama acariciando a barriga de Lena que estava deitada no centro da cama, vestindo apenas uma blusa e uma calcinha boxer. Seus olhos estavam na barriga de Lena, que deitada naquela posição permitia que ela visualizasse o pequeno volume dali.

A mais nova avaliava seus pensamentos sobre o fato que Lena não sabia quase nada da sua vida antiga e percebia que ela ainda não estava pronta para falar sobre isso. Já faziam quase dois anos, Kara achava que já era a hora dela se abrir com Lena e deixar que ela soubesse que suas inseguranças não eram algo bobo, e sim, traumas de acontecimentos ruins.

Tomando coragem para se mexer na cama para atrair a atenção de Lena, ela aperta os lábios sentindo seu coração se apertar, não gostava de lembrar de Manuela ou dos seus pais, mas sabia que já era a hora dela se libertar daquilo.

– Lena, podemos conversar? - Ela fala com um tom baixo, mas firme atraindo os olhos esverdeados para seu rosto.

– Claro. - Responde percebendo que Kara queria lhe dizer algo. Sentando na cama, Lena vira seu rosto em direção a Kara esperando que ela comece a falar.

– Eu acho que você deveria saber mais sobre a minha vida, minha infância e adolescência até a vida adulta.

– Sou toda ouvidos, meu amor. - Kara a olha buscando coragem para desenterrar tudo que guardava no fundo do seu ser, querendo largar tudo aquilo por Lena e seus bebês.

– Vou começar pelos meus pais, você já deve saber que eu tenho uma ordem de restrição contra eles... - Lena afirma com a cabeça indicando que sabia por causa de James. - Bom, meus pais iam se divorciar até descobrirem que minha mãe estava grávida e eles decidiram ficar juntos por minha causa, quando eu nasci fui diagnosticada intersexual e meus pais fariam a cirurgia, mas não tínhamos dinheiro naquele momento. Nós éramos uma família tradicional, íamos à igreja aos domingos, minha mãe ficava em casa enquanto meu pai trabalhava, assim foi por toda a minha infância até meu pai perder o emprego e termos que nos mudar para a casa de fundo da minha avó Ângela. Eu estava entrando na adolescência quando eles magicamente apareceram com o dinheiro da cirurgia para eu "me tornar uma menina de verdade", disseram eles, quando eu disse que não faria a cirurgia eles começaram a mudar comigo, ficaram mais rígidos e qualquer motivo era uma palavra de ódio deles contra mim. Com isso eu comecei a passar mais tempo com a minha avó. - Pausa esboçando um sorriso se lembrando da senhora de cabelos grisalhos e curtos. - Me lembro uma vez de estar chorando por meu pai dizer que eu tinha que "ser uma menina de verdade" e minha avó chegou, me abraçou dizendo que não era para eu ligar para as palavras do meu pai pois eu era uma menina completa, era a sua menininha. - Algumas lágrimas de saudade daquela mulher aparecem por seu rosto.

Ao ver as lágrimas escorrerem por seu rosto, Lena segura sua mão lhe dando forças para continuar a contar por sentir que Kara precisava contar aquilo.

– Passei a maior parte da minha adolescência na casa da minha avó, ela me instigava a estudar e me ajudava com tudo o que ela conseguia, mesmo que não soubesse muita coisa por não ser alfabetizada. Quando eu falei para ela que passei na federal, nossa ela ficou tão feliz. - Seu olhar fica nublado se lembrando do que tinha acontecido em seguida. - Mas isso não durou muito, meses depois ela começou a adoecer com rapidez e os médicos não sabiam o que ela tinha. Minha avó faleceu um mês antes de eu ir para São Paulo.

Kara enxuga as lágrimas que escorriam por sua bochecha segurando um soluço, mesmo depois de anos a morte de sua avó ainda doía. Talvez doeria para sempre, ela só teria que aprender a lidar com isso.

– Foi aí que o inferno começou, quando meus pais e meus tios descobriram que minha avó deixou todo o dinheiro no banco e a casa para mim, todos exigiam que eu dividisse com eles. Eu tinha apenas dezessete anos, estava abalada pela morte da minha avó e não conseguia acreditar que a única pessoa que me aceitava como eu era tinha ido. Então em uma noite, eu peguei as minhas coisas e o dinheiro que minha avó tinha deixado, fugi daquele inferno e vim para São Paulo. Na faculdade, eu me mantive com o dinheiro da herança e quando consegui um emprego, guardei cada centavo que minha avó me deixou.

Singular (Supercorp's Version)Where stories live. Discover now