Capítulo 22

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Estávamos reunidos à mesa, Marcela pediu para sentar-se ao meu lado. Em minha frente, estão Marília e Murilo. Ambos sorrindo um para o outro, como um casal indestrutível e invejável. E o nó que está formado em minha garganta, deduz que não consigo lidar com essa cena que estou prestigiando. 

Marcela me distrai, sorrindo genuinamente enquanto come um saboroso pedaço de carne. Suas mãozinhas estão ensopadas pela comida. 

Agora, estou me perguntando se fiz o certo em vir até a casa de quem tanto me instiga. Tenho vontade de levantar, deixá-los para trás e sair, sem olhar para trás. Mas também tenho vontade de arrancá-la dessa mesa, beijar seus lábios e pedir, em meio a súplica, que desfaça tudo e permaneça comigo. 

Meu coração está desregulado, a respiração um pouco densa. E talvez ninguém perceba, a não ser a causadora dessas sensações. 

Murilo está contando as travessuras de Maiara. A filha, por instinto, somente ri. Ela sequer entende, e por alguns segundos desejo ser a pequena Marcela. Desejo minha ingenuidade de volta, à minha infância. Desejo não sentir o que sinto. Desejo ser uma criança em sua fase irracional. 

Sou surpreendida ao ouvir a voz, rouca e grave, de Marília. A mulher se posiciona sobre a mesa, apoiando levemente seu cotovelo, enquanto sua mão desliza sobre sua bochecha corada. Murilo não percebe, mas eu percebo sua inquietação. 

— Gostou da comida, Maiara? - ela pergunta, buscando meus olhos — Eu quem preparei. 

Murilo ri, de orgulho. E logo responde a pergunta que não foi direcionada a ele: — Está deliciosa, meu bem! - E, inesperadamente, seus lábios encontram os de Marília. 

Eles se beijam. Meu estômago embrulha. Minhas mãos esfriam tão brutalmente, que meus olhos se fecham em resposta. 

— Está uma delícia, realmente. - afirmo, forçando um riso silencioso. Olho para o meu pulso, verificando o horário em meu Smart. — Agradeço o convite, foi um prazer jantar com vocês, mas preciso - Marília me interrompe. 

— Fique para a sobremesa, Maiara. 

— Eu agradeço, mas eu realmente - 

dessa vez Murilo insiste. 

— Fique. A sobremesa eu que preparei. Irei buscá-la - diz, levantando-se e sumindo de nossas visões. 

Não quero olhá-la. Não quero senti-la. Quero senti-la, quero olhá-la. Quero xingá-la, quero amaldiçoá-la.  

Reviver a cena dos dois, a todo instante, causa-me burburinho. É como vivenciar o seu amor nos braços do seu verdadeiro amor, e você não passar de um telespectador ansiando pelo dia em que poderá tocá-la também, mas sabes que é um sonho impossível, afinal, ela já possui seu amor. 

— Não fale nada - sussurro.

— Maiara.. - seu nome ecoa da sua boca e eu quase acredito na sua vulnerabilidade.

— Não. Fale. Nada. - imploro, dessa vez. 

Não estou prestes a chorar, não é isso, apenas não consigo lidar com o fato de que fui convidada para um jantar com a mulher que desejo, ao lado do seu esposo que não desejo. 

Eu aceitei vir. 

— Maiara, olhe para mim - ela pede, e eu recuso mentalmente. — Olhe para mim, Carla. 

E, finalmente, nossos olhos se encontram, mas dessa vez carregados por ressentimento e um desejo absurdo que só cresce. 

— Você sente prazer, não é? 

Na ponta do Salto - MAILILAWhere stories live. Discover now