Na ponta do Salto - MAILILA

Capítulo 04

César me deu uma lista de algumas orientações para exercer durante toda a minha apresentação.

Nos conhecemos ainda na faculdade, nunca fui antipática com ele mas não forçava intimidade porque sempre fui muito reservada. Ele se aproximou de mim aos poucos e nos tornamos bons e adoráveis amigos. Seu jeito sempre foi mais reservado também, mas ele mantém em sua vida as pessoas que agregam de alguma maneira positiva e eu estou aqui, no salão da sua empresa, estudando mais uma apresentação que trará ênfase para ambos os lados.

Ele sempre elogiou a minha desenvoltura na dança, e quando me disse que sua filha, Maiara Carla, gostava de dançar e tinha dotes excelentes na área, fiquei extremamente saltitante com a notícia. O que me pegou foi a sua insolúvel decisão em não colocar ela como a minha aluna. Fiquei chateada com ele, mas as suas explicações me convenceram. Não queria manter ela comigo por questões de afinidade. "Você pegaria leve com ela", afirmou. Não pego leve com ninguém. Se a Marcela um dia quiser entrar para o ramo da dança, mostrarei para elas os desafios.

Concentrada, não notei as batidas frequentes na porta do escritório que me fora reservado. Ajustei o óculo em meu rosto, apoiando minhas costas na cadeira. Expirei, ficando de pé e abrindo a porta para que pudesse entrar. A mais nova, aparentemente, adentrou ao ambiente e apenas me olhou de cima a baixo descaradamente.

– Boa tarde, tudo bem? - que sorriso mais forçado que ela deu. – Prazer, sou Maiara Carla.

A filha do César. Agora entendi.

– Boa tarde, querida! Tudo nos conformes. Como posso ajudá-la?

Não diria o meu nome por conveniência, estava escrito no meu crachá que utilizara em momentos como esses.

Maiara olhou para o meu colo e leu o meu nome. Chocada, ela recuou somente um passo mas manteve sua respiração controlada. Gosto assim.

– O César me encaminhou para ajudá-la a enviar os formulários necessários para a sua apresentação.

– Não preciso de ajuda, querida.

Por incrível que pareça não quis ser intolerante.

– Tudo bem então! - Ela segurou a maçaneta, mas antes de abrir se virou novamente. – A senhorita é a professora Marília Dias?

Fiz que sim com a cabeça e sorri sem muitas expressões. Mantenho o meu profissionalismo dentro e fora do meu ambiente de trabalho, principalmente com alunas.

Ela nada comentou, apenas saiu educadamente e voltei aos meus afazeres diários. Em menos de uma semana terei uma apresentação para entregar.

Maiara.

Não sabia que o meu pai tinha afinidade com a minha professora de dança. Expirei, talvez um pouco constrangida com a audácia dele. Não entende como ele consegue alinhar tudo a favor do seu bem estar, e não do meu em específico.

Esperei ansiosamente para que ele abrisse a porta e questionasse o porquê da minha presença, mas ele não fez, apenas assentiu e me permitiu entrar. Com as mãos infiltradas em meu cabelo, olhei em seus olhos e deduzi tudo que ele diria com a minha pergunta.

– Você contratou a Marília?

– Sua professora de dança é minha colega de trabalho.

– Papai… Você tem ideia do que você fez?

– Ela trabalhou comigo bem antes, filha.

– Só pode ser brincadeira. Ela é professora de dança, a minha atual professora de dança, trabalha na mesma empresa que o meu pai coordenar. - Enfatizei.

– Sim, não vejo problema. Marília é uma ótima e renomada profissional. Quero o melhor pra você.

– Eu não irei mais às aulas.

– Como? - Ele uniu as sobrancelhas.

– Isso mesmo. Irei focar na minha faculdade e largar de mão as aulas de dança. Já tenho 24 anos e posso muito bem decidir o que faço ou o que não faço da minha vida.

– Que rebeldia é essa, Carla?

Meu pai nunca foi arrogante comigo, tentava sempre conversar da maneira mais calma e prudente.

– Não estou sendo rebelde, estou sendo assertiva. Não irei ter contato com uma professora que, além de não ser a que escolhi, é a funcionária do meu pai.

César inspirou e congelou, mas sua expressão era decifrável. Olhei para trás e Marília nos olhava com uma interrogação, nitidamente, estampada em sua testa.